Isabella Souto
Como se não bastassem o número insuficiente de magistrados e servidores, estrutura deficiente e legislação ineficaz, um outro fator está atrasando ainda mais a tramitação de processos judiciais em Minas Gerais: a falta de peritos. De acordo com os profissionais, há atualmente cerca de 100 mil ações com assistência jurídica gratuita paradas nos gabinetes de juízes à espera de profissionais qualificados para apresentar um parecer. E não é porque a quantidade de peritos seja pequena – estima-se que são 3 mil no estado –, mas em razão de eles não serem remunerados. Tudo porque não há lei no estado prevendo o pagamento de peritos requisitados em processos cujas partes são isentas das custas processuais.
Nas ações em que as partes não têm a assistência gratuita, os peritos recebem o mínimo de R$226,50 por hora de trabalho, incluídas no montante as despesas com material. O valor geralmente é pago pela parte que requisita a perícia. O laudo pericial é necessário sempre que o processo envolve um assunto que extrapola o conhecimento do juiz, como por exemplo a avaliação de um imóvel, juros de financiamento, cobranças indevidas, doenças, análise de cirurgias ou fraude de assinaturas em documentos.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais não soube informar quantos processos estão parados pela falta de peritos, alegando que o sistema adotado no órgão não permite esse tipo de pesquisa, mas em nota encaminhada ao Estado de Minas reconheceu que “existe um grande número de processos paralisados” à espera de realização de perícias. Cálculos do TJMG apontam que o pagamento de honorários aos peritos, tradutores e intérpretes para as ações com justiça gratuita teria um custo anual estimado em pelo menos R$ 6 milhões.
Ainda de acordo com a nota, o tribunal vem adotando uma série de medidas para solucionar o problema: criação de um banco de peritos independentemente de ser para ações com assistência judiciária, o que incentivaria os profissionais a se inscreverem; criação de uma central de perícias médicas do estado – hoje se restringe à capital – e a possibilidade de celebração de convênios com a Escola de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Justiça Federal e instituições, entidades e conselhos de classe para se certificar da idoneidade dos filiados.
Mobilização
A assistência judiciária gratuita está prevista na Constituição Federal e é garantida a quem não tem condições de arcar com os custos de um processo. Mas em estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul já há leis determinando que o Estado arque com o custo da perícia nesses processos. Em Minas Gerais, a adoção da regra ainda depende da aprovação do Projeto de Lei 1.135/11. Apresentado há pouco mais de dois anos na Assembleia Legislativa, a matéria já foi aprovada nas comissões de Constituição e Justiça e Administração Pública.
Atualmente, está parada na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária porque foram pedidas informações à Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag) e ao TJMG. De acordo com Lilian Caldeira, a expectativa é que desta vez a matéria seja aprovada – projeto semelhante tramitou em 2008, mas foi arquivado porque acabou a legislatura sem que tenha passado pelo plenário. A associação promete acompanhar de perto as votações e tentar mobilizar os parlamentares pela discussão do texto.
Para ela, a aprovação da lei vai resolver outro problema da Justiça, que é a concessão indiscriminada de isenção das custas processuais. “A partir da hora em que o estado estiver pagando os peritos, vai filtrar mais quem realmente precisa da Justiça gratuita”, aposta. Aliás, o valor da remuneração será a segunda etapa da discussão. “Que ele (valor) sirva para pagar pelo menos parte do custo do nosso trabalho”, completa. Hoje, as justiças Federal e do Trabalho já pagam peritos que atuam em processos assistidos pelo estado. m
Saiba mais
Prova pericial
Consiste em exame, vistoria ou avaliação realizado por profissionais especialistas, sobre pessoas ou coisas, para verificação de fatos ou circunstâncias que interessam ao processo. A perícia depende de dois atributos fundamentados: o alto grau de conhecimento técnico da matéria a ser examinada e a honestidade do perito.