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Estado de Minas

Lei das Licitações é principal motivo para atrasos e cancelamentos de obras

No Congresso, já há consenso sobre necessidade de modificá-la


postado em 15/07/2013 06:00 / atualizado em 15/07/2013 09:15

A duplicação do trecho da BR-381 entre BH e Governador Valadares, prevista para começar em 2011, só agora está sendo licitada(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
A duplicação do trecho da BR-381 entre BH e Governador Valadares, prevista para começar em 2011, só agora está sendo licitada (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)

Os alunos do ensino fundamental das escolas municipais de Atibaia, no interior paulista, começaram o ano letivo sem o material escolar que deveria ter sido entregue pela prefeitura no fim de janeiro. Os motoristas que passam pela BR-381, conhecida como Rodovia da Morte no trecho de 303 quilômetros entre Belo Horizonte e Governador Valadares, enfrentam dezenas de curvas em pista simples e com alto risco de colisão frontal, apesar de as obras de duplicação terem sido planejadas para começar em 2011. Esses são só dois exemplos de um problema que está por trás da maioria dos atrasos e falhas do poder público no Brasil: entraves no processo de licitação. Seja em obras grandiosas ou em ações que passam despercebidas pelos órgãos de fiscalização, a escolha das empresas responsáveis pelo serviço está entre as principais causas de cancelamentos ou adiamentos de projetos.

Ao completar 20 anos de existência, a Lei 8.666/1993, conhecida como Lei de Licitações e Contratos, é apontada – quase por unanimidade – como um dos principais obstáculos para tornar o setor público mais eficiente e evitar as irregularidades que prejudicam as finanças do país. Entre parlamentares, tanto da base aliada quanto da oposição, já existe consenso sobre a necessidade de mudar as normas que definem os processos  licitatórios.

Excesso de burocracia nas fases de habilitação e recursos; possibilidade de aumento do orçamento em até 25%, por meio de aditivos; e o uso do preço como principal critério para seleção da empresa são alguns dos questionamentos ao texto da lei. O diretor-executivo da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), Bruno Batista, afirma que o formato atual faz com que os processos de licitação, muitas vezes, demorem mais de um ano, o que resulta em lentidão na execução de melhorias em setores estratégicos. “O cenário de infraestrutura demanda agilidade. Qualquer lei que tenha impacto tão grande quanto essa de licitações pressupõe que ela precisa ser atualizada”, afirma.

Insegurança O ministro dos Transportes, César Borges, afirma que a Lei 8.666 nivela os desiguais. “Quando você vai contratar uma obra grande tem que dar a mesma oportunidade àquele que tem expertise e ao que não tem competência técnica. No fundo, fica difícil administrar e cobrar o prazo da obra”, ressalva ele. O especialista em direito administrativo da Jacoby Fernandes & Reolon Advogados Associados, Jaques Reolon, explica que aliada às deficiências do texto existe certa insegurança em sua aplicabilidade. Um dos pontos é o excesso de prazos. Na fase de habilitação, por exemplo, são dados cinco dias para a empresa recorrer e cinco para que seus concorrentes contestem os argumentos.

Relator dos projetos que modificam a Lei de Licitações na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o deputado Fábio Trad (PMDB-MS) alerta que existem muitos pontos falhos nas atuais regras. Entre as propostas que foram incorporadas ao texto que poderá alterar a lei está a ampliação das modalidades de pregão eletrônico, com objetivo de tornar os processos licitatórios envolvendo a administração pública mais transparente. Também foi incluído o aumento de penas para crimes licitatórios, e ampliadas as punições para empresas que tiverem questões pendentes em outros processos. Empresas que fizerem doações a partidos políticos e candidatos vencedores de eleições ficariam impedidos de participar dos certames.

Trad apresentou três relatórios sobre mais de 200 propostas que envolvem o tema. Não há previsão para que o substitutivo seja apreciado na CCJ. “O ideal é que tais mudanças sejam definidas ainda este ano, para dar ao país uma solução mais sintonizada com as aspirações daqueles que sofrem com a precariedade da nossa lei, que há tempos se tornou inadequada”, avaliou. Uma nova comissão foi criada no Senado para discutir todas as propostas que tramitam no Congresso e apresentará sua posição final em 60 dias.

Críticas à flexibilização

Há dois anos, a presidente Dilma Rousseff (PT) sancionou uma lei com alterações nas regras de licitação, com o intuito de agilizar, principalmente, as obras de mobilidade e infraestrutura para a Copa do Mundo de 2014. O Regime Diferenciado de Contratações (RDC) definiu três pontos principais: a inversão de fases (só é feita análise dos documentos da empresa vencedora), o sigilo do orçamento e a possibilidade da contratação integrada, quando a mesma empresa fica responsável pelo projeto de engenharia e pela execução das obras. A flexibilização, contudo, gerou críticas. A Procuradoria Geral da República acionou o Supremo Tribunal Federal acusando o modelo de dificultar a fiscalização do uso de recursos públicos.

Os dois órgãos mais beneficiados pelo RDC foram o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero). Os efeitos no prazo de contratação foram visíveis. O tempo médio de licitação caiu de 239 dias quando adotada a Lei 8.666 para somente 101 com o RDC, no caso do Dnit; e de 280 para 79, para a Infraero.

O presidente da Infraero, Gustavo do Vale, defende o RDC, citando a obra do aeroporto de Florianópolis. Na época, 27 empresas apresentaram propostas. Pela Lei de Licitações, a primeira etapa seria a verificação dos documentos de todas elas, mas, pelas regras do RDC, foi aplicada a inversão de fases e primeiro foram abertos os envelopes de preços. Com isso, somente foi analisada a documentação da empresa que apresentou a menor oferta. “Se aquela documentação estiver correta, acaba o processo. Isso nos dá no mínimo dois meses de agilidade”, afirma Vale.

O regime tem recebido duras críticas também de parlamentares que consideram suas regras limitadas e sem resultados expressivos, o que faz muitas empresas desistirem de aderir ao modelo por considerar muito alto o risco de prejuízos. “Não acho que transformar o RDC em lei geral para qualquer tipo de obra seja o caminho ideal. Ele foi elaborado para situações excepcionais, já que inverte algumas fases do processo, mas não impede possíveis desvios de finalidade nas licitações. Foi uma experiência sugerida pelo Planalto, mas que precisa ser aprimorada”, alerta o deputado Fábio Trad.

Sem aditivos

Um dos entraves se deve ao fato de a contratação ser feita sem que se tenha em mãos o projeto executivo. A proposta é feita com base nos parâmetros estipulados pelo órgão contratante. Em evento do Grupo de Líderes Empresariais (Lide) para discussão da mobilidade no Brasil, o presidente do grupo Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo, foi contundente ao classificar a Lei de Licitações, de “anacrônica, antiga e ultrapassada”, mas, ao mesmo tempo, afirmou que “sem um projeto executivo bem definido não se pode garantir preço em lugar nenhum do mundo”. No caso do RDC, o risco é repassado para a empresa, dificultando aditivos, uma vez que com a contratação integrada a contratada elabora o projeto de engenharia e assume seus riscos. (MF e PRF)


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