Prevista para ser votada ainda esta semana, a chamada minirreforma eleitoral que está na pauta da Câmara, se aprovada, afetará diretamente as escolhas dos eleitores a partir de 2014. Mas não da maneira que a população tem reivindicado nas ruas. Em vez de aumentar o rigor para coibir a candidatura de políticos com o currículo questionável, as mudanças afrouxam ainda mais as regras para aqueles que almejam um cargo eletivo. Entre os cerca de 20 pontos incluídos no texto (veja quadro) está um que acaba com a exigência de os candidatos a prefeito, a governador e a presidente da República apresentarem propostas para um possível mandato.
Mesmo obrigatórios hoje, os planos de governo já não eram levados a sério por quem pleiteava um cargo majoritário, como revelou o Estado de Minas em setembro do ano passado. Em vez de disciplinar a apresentação do documento, os parlamentares estão prestes a acabar com o único comprovante eleitoral que serve para indicar à população o que o candidato poderá fazer pela cidade, pelo estado ou pelo país.
Em setembro de 2010, às vésperas das eleições municipais, o EM revelou planos de governo de candidatos a prefeito com textos mal escritos ou com conteúdo genérico. Havia casos de políticos de cidades e partidos diferentes com programas idênticos, e planos eram vendidos pela internet por até R$ 5 mil. Como a Justiça Eleitoral exige o documento mas não estabelece um padrão, os programas são desprezados nas campanhas – e surgem em formatos que beiram o absurdo. No projeto de lei apelidado de minirreforma eleitoral, que pode ser votado hoje ou amanhã na Câmara, o plano será oficialmente descartado das obrigações dos candidatos.
Todas as propostas foram apreciadas por um grupo de trabalho destinado a analisar especificamente o tema na Câmara. O texto permite que os candidatos deixem de prestar contas de despesas consideradas pessoais nas campanhas, como alimentação, hospedagem e transporte, além de doações em dinheiro entre os candidatos, partidos ou comitês financeiros que vierem do uso comum de sedes e de materiais de propaganda eleitoral. Os concorrentes a cargos eletivos terão ainda uma brecha na Lei da Ficha Limpa – se forem impugnados pela primeira instância da Justiça Eleitoral, mas recorrerem, conseguirão levar a candidatura adiante até que a decisão transite em julgado. Hoje, a primeira decisão já tem efeito suspensivo.
'Aperfeiçoamento’
Maiores beneficiados pelas mudanças, os políticos tentam votar o texto sem alarde, abafando seus verdadeiros efeitos. “Não afrouxamos, a ideia é aperfeiçoamento. São coisas simples, que vão facilitar o processo eleitoral, ajudar a fiscalização e tornar mais transparente o procedimento eleitoral”, minimizou o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). “São apenas coisas neutras, que não prejudicam ninguém nem dão vantagem para A ou B. É apenas uma tentativa de clarificar a legislação existente para não dar margem a dúvida nenhuma”, argumentou o vice-líder do PMDB, Marcelo Castro (PI).
O coordenador do grupo que elaborou o projeto de minirreformal eleitoral, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), foi o escolhido por Henrique Alves para comandar também o colegiado que vai elaborar uma proposta de reforma política. A indicação foi questionada ontem na própria bancada petista, que queria ver Henrique Fontana (PT-RS) no posto. O gaúcho foi relator da reforma nos últimos dois anos, mas não tem o apoio dos demais partidos. O impasse provocou atraso no início dos trabalhos do grupo, que terá 90 dias para finalizar um texto a ser votado no Congresso e depois submetido a referendo. Ontem, o presidente da Câmara reforçou o formato que quer para o colegiado: “O PT terá dois lugares, o de representante da bancada que vai interpretar os pensamentos do partido, que espero ser o Fontana, e eu convidei o Vaccarezza por seu bom relacionamento com as outras legendas para coordenar, dirimir conflitos”. (Colaboraram Amanda Almeida e Juliana Braga)
Alívio à vista
Principais pontos discutidos na minirreforma eleitoral, que deve ser votada esta semana na Câmara e estabelece regras mais frouxas na disputa por cargos eletivos
Candidatos a prefeito, governador e presidente da República não precisarão mais apresentar propostas ou plano de governo para registrar a candidatura.
O candidato não precisará comprovar despesas pessoais, como alimentação e hospedagem, na prestação de contas.
O partido que tiver as contas rejeitadas terá de pagar uma multa, mas continuará recebendo verba do Fundo Partidário.
A certidão de quitação eleitoral – que autoriza uma nova candidatura – será dada ao candidato ao apresentar as contas da última campanha, mesmo se tiverem sido rejeitadas.
As doações de campanha poderão ser comprovadas com extratos de movimentação bancária, sem a necessidade de recibo.
Pré-candidatos poderão dar entrevistas e anunciar a candidatura pela internet antes das eleições, mas sem pedir votos explicitamente.