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Estado de Minas

Sindicatos apelam a lobistas para obter benefícios no Congresso

Parlamentares convivem diariamente com o assédio de "assessores" que buscam ampliar benefícios e mordomias dos servidores


postado em 22/07/2013 10:56 / atualizado em 22/07/2013 11:11

Plenários da Câmara e do Senado, além das comissões temáticas são os palcos de atuação dos representantes de classe (foto: Carlos Moura/CB/D. A Press)
Plenários da Câmara e do Senado, além das comissões temáticas são os palcos de atuação dos representantes de classe (foto: Carlos Moura/CB/D. A Press)

O corporativismo nasceu como doutrina político-econômica na Idade Média, quando artesãos e comerciantes regulavam as atividades que desempenhavam para balizar os lucros, baratear custos e evitar concorrência. No século 19, o marxismo aperfeiçoou a teoria, com base na luta de classes entre o trabalhador e a burguesia, para mais tarde ser desvirtuada pelo fascismo italiano, que deu origem ao conceito de organização sindical. No Brasil das centrais sindicais de emergentes lideranças políticas, o significado se transmutou e ganhou força entre as entidades representativas, entre as quais as de servidores públicos.

Muito bem engravatados, com sapatos lustrados, bótons similares aos que senadores e deputados usam para identificar a quem eles representam, os lobistas a serviço dos sindicatos, associações e dos “sangues-azuis”, como são chamados a elite do funcionalismo, percorrem os corredores do Congresso com desenvoltura. Com a justificativa de “defender pleitos da categoria”, esses “assessores parlamentares”, como costumam se apresentar, articulam a derrubada de itens das pautas das comissões, marcam encontros entre as lideranças sindicais e parlamentares e passam pente-fino nos projetos que chegam ao Senado e à Câmara para identificar ameaças e oportunidades de engordar mordomias e benefícios.

Na última semana, o Correio acompanhou no Congresso a atuação desses lobistas. Durante a sessão da terça-feira da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara, era possível identificar “assessores” da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).

Com um bóton que o identifica como “assessor” da ANPT, Carlos Farikoski conversava com técnicos da CCJC e procurava informações sobre a pauta do dia. Ao Correio, ele disse que ocupa o cargo há um ano e seis meses. Entre suas atribuições, está verificar a tramitação de projetos. “A gente fica vasculhando. Faz uma verificação antecipada do que chega à Casa. Semana passada, trabalhamos para tirar da pauta a aposentadoria compulsória dos magistrados que está na Câmara”, disse.

Quem também circula pelas comissões e conhece a maioria dos deputados é Francisco Costa, o famoso Chicão. “Assessor parlamentar” da Ajufe há quatro anos, ele atua com frequência nas comissões de Constituição e Justiça do Senado e da Câmara, na de Finanças e Tributação (CFT), além da Comissão de Direitos Humanos. “Faço o link entre os parlamentares e os dirigentes da associação. Levo as notas técnicas para os gabinetes, faço um trabalho braçal”, detalhou ele.

Mas a atuação dos assessores não se restringe aos corredores. A prestação de contas aos associados é feita também pela internet. No site institucional da Anamatra, uma notícia publicada em 16 de julho retrata exatamente a ação dos lobistas. Com o título “Diretor legislativo, membros da CLEG e presidentes de Amatras unem esforços para evitar aprovação da PEC 505”, o texto mostra que notas técnicas foram produzidas para justificar a rejeição, na CCJC da Câmara, da proposta de emenda constitucional, cujo texto exclui a aposentadoria por interesse público do rol de sanções aplicáveis a magistrados e membros do Ministério Público.

Além de lutar contra propostas que ameaçam a estabilidade das categorias, o intenso lobby rende frutos aos servidores. Votada em segundo turno, a PEC 207/2012, que confere autonomia administrativa e financeira à Defensoria Pública da União (DPU), foi aprovada recentemente pela Câmara. Principal interessado no encaminhamento desse projeto, o presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), Gabriel Faria Oliveira, percorreu gabinetes, conversou com parlamentares no Salão Verde e acompanhou no fundo do plenário o painel que mostrava o resultado da votação.

Conforme ele, o trabalho é exaustivo, mas se confunde com corporativismo. A atuação, nesse caso, é para dar mais independência ao trabalho da categoria. “Não pedimos a criação de cargos nem aumento salarial. As defensorias estaduais já têm essa autonomia”, justifica ele, que é defensor em Florianópolis, mas está afastado para presidir a associação e passa três semanas do mês em Brasília.

Inferno


O presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), avalia que a atividade dos “assessores parlamentares” é legítima. “Faz parte do processo democrático e cabe a cada líder analisar o pleito e verificar se há disponibilidade fiscal no Orçamento da União para ele ser executado”, comenta. Alvo do apetite insaciável de categorias que querem abocanhar mais benefícios e mordomias, o relator do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o deputado federal Danilo Forte (PMDB-CE), conta que é procurado frequentemente por representantes do Judiciário e do Banco Central.

Conforme Forte, a principal reivindicação é para mudar o trecho do projeto que engessa aumento de benefícios de alimentação, transporte e saúde. Se houver afrouxamento, será possível atuar politicamente durante a tramitação do projeto da Lei Orçamentária Anual (LOA). “Ainda não avaliei o impacto disso nos cofres públicos. Mas acho que o governo gasta demais com o custeio da máquina”, completa.

Para um deputado petista com trânsito no Palácio do Planalto, que pediu anonimato para evitar desgastes, a atuação desses lobistas é um “inferno”. As entidades mais organizadas, principalmente as ligadas ao Judiciário, ao Ministério Público e às carreiras de gestor do Executivo, são as que mais conseguem ter os pleitos acolhidos. “Quando não são atendidos, constrangem os parlamentares e insinuam que não aprovar um projeto de lei que eleva salários ou mantém mordomias é o mesmo que cometer um ato de corrupção”, sintetiza.

As categorias alegam que também defendem os interesses da sociedade e a fiscalização do serviço público, independente de aumento de salários. O presidente do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon Sindical), Rudinei Marques, cita os esforços para a aprovação do Projeto de Lei (PL 5586/2005), que altera o Código Penal, para tornar crime o enriquecimento ilícito, quando o funcionário público possuir bens ou valores incompatíveis com a renda. E, também, a chamada Lei Anticorrupção (PLC 39/2013), que responsabiliza, nas esferas administrativa e civil, empresas que praticarem atos contra a administração pública nacional ou estrangeira.

Nem sempre é assim. As pressões são intensas, constantes e de categorias variadas. Às vezes, todas simultaneamente. “Temos um grupo de auditores permanentemente no Congresso para tentar sensibilizar os parlamentares sobre nossos pleitos”, afirma Pedro Delarue, presidente do Sindicato Nacional do Auditores-Fiscais da Receita Federal. A menina dos olhos dos lobistas de plantão é a PEC 555/06, que acaba com a contribuição previdenciária de 11%, para aposentados e pensionistas, diz Daro Piffer, presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central.

A PEC 555/06, conta Rosangela Rassy, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait), questiona a cobrança dos 11% porque há suspeitas de que os parlamentares tenham recebido incentivos financeiros para aprová-la. Além dos pleitos comuns, há os específicos. As PECs 443/09 e 147/12 interessam a Auditores-Fiscais da Receita e do Trabalho, a procuradores e ao pessoal de nível superior do Banco Central. O objetivo é estabelecer o teto salarial de todos eles em 90,25% da remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal, atualmente fixado em R$ 28,059.

Outra PEC, a de número 300, unifica o piso salarial das Polícias Militar, Civil e Corpo de Bombeiros, e prevê um piso provisório entre R$ 3,5 mil e R$ 7 mil. É a causa com maior poder de pressão sobre os parlamentares. O rombo no Orçamento da União pode chegar a R$ 46 bilhões. Militares de todo o país prometem grande mobilização em Brasília, em 20 de agosto, quando a matéria deve ser tratada em segundo turno. Alegam que, no Distrito Federal, um soldado ganha R$ 4.500, enquanto no Pará, por exemplo, o salário base é de R$ 1,8 mil. O presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves, declarou que seria uma “irresponsabilidade” aprovar tal projeto, pelo impacto financeiro que causará ao país.

» Rombo de
R$ 46 bilhões


Os custos com a unificação do piso salarial das polícias Militar, Civil e Corpo de bombeiros seria pago com os recursos dos royalties do petróleo reunidos em um fundo nacional de segurança pública, para que os estados possam suportar o baque do aumento. O rombo que a medida pode causar é motivo de constantes polêmicas. A Frente Parlamentar em Defesas de Policiais e Bombeiros garantiu que o impacto orçamentário anual ficaria em torno de R$ 10 bilhões. Outras instituições de policiais apontaram 12 bilhões. Em 2010, quando era ministro do Planejamento, Paulo Bernardo falou inicialmente em R$ 20 bilhões. Em seguida, em outra ocasião, subiu a estimativa para 46 bilhões.


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