Brasília - Autora do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 3/2013, que trata do protocolo de atendimento a vítimas de violência sexual nos hospitais da rede pública, a deputada Iara Bernardi (PT-SP) defende que a presidenta Dilma Rousseff sancione integralmente o texto, aprovado no início do mês de julho no Congresso Nacional. A presidenta Dilma tem até esta quinta-feira para decidir se irá vetar trechos do projeto ou sancioná-lo integralmente. O texto diz que o atendimento deverá incluir o diagnóstico e tratamento de lesões, exames para doenças sexualmente transmissíveis e gravidez e preservação de materiais que possam ser coletados no exame médico legal.
O projeto não é consenso. Representantes de grupos religiosos, como o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP), e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entregaram documento ao governo pedindo o veto de dois dispositivos do texto, que tratam da profilaxia da gravidez e que as mulheres devem ser informadas sobre seus direitos legais.
Conforme o projeto, a vítima, ao ser atendida no hospital público, deve passar por procedimento de profilaxia da gravidez (que prevê a distribuição da pílula do dia seguinte). Outro trecho estabelece que as mulheres devem receber orientação, ainda no hospital, sobre os direitos legais em relação à violência.
Os grupos religiosos consideram positiva a ideia do projeto de proteger às vítimas de violência, mas temem que os trechos abram brecha para estimular o aborto, com o uso da contracepção de emergência. Entendem ainda que as orientações devem ser feitas em delegacias e órgãos especializados.
Pelo Código Penal, o aborto é permitido quando a gravidez é resultante de estupro e em casos de risco para a saúde da gestante. Além dessas situações, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou grávidas de fetos com anencefalia a interromper a gestação, mas a decisão não configurou mudança no código.
Iara Bernardi argumenta que o projeto não trata de aborto. “Estamos falando de um atendimento que será feito em até 72 horas após a violência. Em 72 horas, não estamos falando em gravidez ainda. Estamos falando em prevenção, que no caso das mulheres adultas se faz com a pílula do dia seguinte. Que a Igreja Católica é contra o uso de pílula do dia seguinte, nós já sabemos. Mas nós estamos falando de saúde pública”, diz. De acordo com o Ministério da Saúde, a profilaxia da gravidez se refere à utilização de contraceptivo de emergência – a chamada pílula do dia seguinte – que evita a fecundação, e não interrompe uma eventual gestação.
As relatoras da matéria no Senado, Ana Rita (PT-ES) e Ângela Portela (PT-RR), também são contrárias aos vetos parciais. Elas alegam que o projeto protege todas as vítimas de violência sexual, incluindo crianças, homens, transexuais, travestis e idosos.
Como a projeto determina a preservação de provas para identificação do agressor e o envio dos casos às autoridades policiais, as senadoras avaliam que não haverá incentivo à prática do aborto. “Uma vez que as vítimas estão conscientes de que terão atendimento condigno, deixarão de ter receio de se expor [denunciar]”, diz Ângela Portela.
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) se posicionou a favor do PLC 3. Procuradora da mulher no Senado, a parlamentar informou, por meio de sua assessoria, que o projeto passou por “discussões acaloradas” no Congresso entre as bancadas feminina e religiosa sobre as mulheres terem conhecimento de seus direitos e poderem fazer uso de métodos contraceptivos, como a pílula do dia seguinte. Na opinião da senadora, o texto, encaminhado para sanção presidencial, é resultado de “discussões amplas e democráticas” e, portanto, deve ser “concretizado”.
Entidades feministas defendem a sanção integral do texto, que torna lei os procedimentos que já são adotados no Sistema Único de Saúde (SUS) e que são regulados por uma norma técnica e um decreto presidencial.