Paulo de Tarso Lyra e Sandra Kiefer
Brasília – O governo corre contra o tempo para colocar médicos no interior do país até outubro e dar a primeira resposta concreta às manifestações de rua que sacudiram o Brasil em junho. O Ministério da Saúde garante que, até o fim de setembro, profissionais brasileiros e estrangeiros estarão em condições de atender a população mais carente. O Palácio do Planalto espera ter o programa Mais Médicos completamente consolidado em junho de 2014. “No mês em que a Copa do Mundo estiver começando, as pessoas estarão nas ruas novamente. Precisamos ter algo a apresentar para que a pressão não seja igual à que sofremos neste ano e entrar na disputa eleitoral em condições de competir”, segundo um interlocutor governista.
O Programa Mais Médicos passou a ser a prioridade zero do governo. No início de 2013, a presidente Dilma Rousseff prometeu dedicar-se às concessões de rodovias, ferrovias, portos e estradas e à retomada do crescimento econômico. O Produto Interno Bruto (PIB) já deu sinais inequívocos de que continuará crescendo abaixo dos 2,5% nos próximos dois anos. Com isso, Dilma precisa encontrar uma marca política para apresentar na campanha.
A expectativa é que o êxito do Mais Médicos possa minimizar os ataques que ele vem sofrendo desde que foi anunciado, sobretudo das associações de médicos. “Não se pode admitir qualquer tentativa de postergar a presença de médicos para a população que mais precisa”, defende o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, ele próprio pré-candidato do PT ao governo de São Paulo. No governo, existe a certeza de que, se no início do ano que vem, 80% das 700 cidades que não têm sequer um médico tiverem um profissional para atender a população, as queixas das associações médicas serão interpretadas como uma mera reação corporativa.
RISCO Aliados acham um risco a adoção de um discurso tão otimista em um programa ainda embrionário. Para eles, o governo pode estar caindo na tentação de apresentar uma peça de marketing que terá efeito contrário lá na frente. “Se as pessoas chegarem no interior e descobrirem que os médicos não chegaram, o efeito será pior do que se nada tivesse sido feito”, afirma, cauteloso, um aliado do PMDB.
Até mesmo no PT há quem ache que o Palácio está supervalorizando o programa. “O Mais Médicos será a resposta mais efetiva do governo às reivindicações das ruas. Mas o que vai definir a reeleição da presidente Dilma será a economia”, afirmou um ministro com livre trânsito no gabinete presidencial. Ciente de que o PIB não deve retomar o patamar dos sonhos, ele afirma que toda a atenção deve ser dada à manutenção do emprego. “Temos que gerar postos de trabalho, ainda que lentamente, e dar garantias a quem está empregado de que não existem riscos de demissão”.
Bancada quer minirreforma
São Paulo – O deputado Henrique Fontana (PT-RS) vai propor que a bancada do PT na Câmara se posicione contra a chamada minirreforma eleitoral, que propõe alterações na legislação eleitoral diminuindo punições a partidos e candidatos, derrubando restrições às doações e colocando amarras no Judiciário e no Ministério Público. A bancada do PT se reúne hoje. Segundo Fontana, o texto traz medidas “cosméticas” ou pioram o cenário político. Ele criticou especialmente a autorização de propaganda paga na internet e a liberação de doações aos partidos pelas concessionárias de serviços públicos. Fontana diz que essas medidas apenas encarecem as campanhas e incentivam a ampliação das doações empresariais.
O texto da reforma é coordenado pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), ex-líder do governo na Câmara e coordenador da comissão que discute a reforma política. Ele se tornou desafeto de Fontana na disputa pelo controle do grupo que discute a reforma política. Fontana queria controlar os trabalhos, mas Vaccarezza foi convidado pelo presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), para o posto. Os dois chegaram a travar uma briga interna pela cadeira. O texto da minirreforma altera quase todo o sistema eleitoral e deve ser votado neste mês pela Câmara.
Primeiro teste para revalidar diploma
Casada há cinco anos com um empresário brasileiro, a médica peruana mora em Rio Branco (AC), mas exerce a profissão apenas informalmente, atuando como voluntária em hospitais da região amazônica. “No meu país, existe um sistema que ajuda pessoas carentes, mas que não é universal como aqui”, elogia a epidemiologista. Assim como Monica, os candidatos a usarem o jaleco branco em território brasileiro demonstram profundo respeito pela medicina exercida no Brasil e até certa reverência ao país. “O que busco é ter estabilidade no trabalho, o que não consigo no meu país. Muitas vezes, trabalhamos sem salários”, confessa o boliviano Luís Fernando Justiniano, de 29. Ele conta que, quando recebe, ganha por mês 4 mil bolivarianos, o equivalente a US$ 600.
“Quero seguir minha vocação de servir a alguém, não importa onde. Não preciso ficar só no Rio ou em São Paulo”, disse a jovem médica peruana Steffany Ibañez, de 27, que há um mês mudou-se para Tocantins. Até então, ela só conhecia o Rio de Janeiro, em viagem de turismo. No futuro, pretende se especializar, aproveitando o know-how das faculdades brasileiras. “Quero fazer dermatologia no Brasil, porque a tecnologia aqui é muito mais avançada do que em meu país”, completa. Segundo ela, a ‘paga’ de um clínico geral peruano gira em torno de US$ 1,6 mil e não é muito diferente para um especialista, atingindo US$ 2 mil.
Apesar de a revalidação do diploma não ser uma exigência do programa Mais Médicos, a demanda pelas provas aumentou depois que a presidente Dilma Rousseff anunciou a intenção de contratar profissionais da saúde vindos de outros países. O salário inicial será de R$ 10 mil. A busca pelo reconhecimento do diploma estrangeiro via UFMG, seja de médicos nascidos no estrangeiro ou de brasileiros que se formaram fora, explodiu quase sete vezes em dois anos. Este ano, foram 1.036 médicos inscritos nos testes, ante 154 em 2011. “Ao revalidar o diploma no Brasil, o médico comprova que está qualificado para atuar no mercado de trabalho nacional”, defende André Cabral, presidente da Comissão de Revalidação de Diploma Médico Estrangeiro da UFMG. Segundo ele, os candidatos a atuar como médicos no país enfrentam preconceito dos colegas, que os acusam de exercer a medicina de forma ilegal ou de ser menos competentes em relação aos brasileiros.
BAIXO DESEMPENHO Nas duas últimas edições da prova da UFMG, a média de aprovação foi de apenas um quinto dos candidatos (20,7%). Apesar de baixo, o percentual é quase o dobro dos 9,5% registrados nos dois testes do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior Estrangeiras (Revalida), principal forma de reconhecimento do título. “Nossa prova é a primeira no calendário e consegue atrair os melhores alunos”, garante Cabral.
Nesse domingo, os médicos enfrentaram mais de cinco horas de prova no câmpus Pampulha. Segundo alguns depoimentos, as provas apresentaram nível “médio, menos difícil do que o normal”. Com 140 questões ao todo, sendo cinco discursivas, o exame contemplou as áreas de clínica médica, pediatria, cirurgia, ginecologia e saúde pública. Nos dois dias de prova, houve 180 desistências. Os resultados da primeira etapa saem até dia 26. A segunda etapa, só com questões práticas, ocorrerá em outubro, ainda sem dia marcado.