Brasília – As divergências entre o Palácio do Planalto e a base aliada no Congresso não significam apenas um terremoto político com o qual a presidente Dilma Rousseff precisa lidar. Se a relação não for repactuada – como adoram falar os parlamentares que integram a coalizão governista –, um tsunami econômico estimado entre R$ 200 bilhões e R$ 220 bilhões abalará a já combalida economia brasileira ao longo dos próximos anos. Esta é a estimativa de gastos feita ao Estado de Minas por assessores e congressistas caso sejam aprovados alguns projetos com aumento de despesa que tramitam na Casa, derrubados os vetos presidenciais e estabelecida a obrigatoriedade do orçamento impositivo. Esse valor representa aproximadamente 20% do Produto Interno Bruto (PIB), todo o conjunto de riquezas produzidas pelo país em um ano.
Como o país vive um momento econômico delicado – o crescimento deve ficar abaixo dos 3% nos próximos dois anos – taxa de juros em alta e inflação só agora dando sinais de convergência para o centro da meta, a sinalização de um aumento de despesas, mesmo que diluído ao longo dos próximos anos, dependendo do previsto nos projetos em análise, é um péssimo recado do setor público aos investidores internacionais.
O cenário poderia ser pior. Há dois meses, quando o debate sobre a derrubada dos vetos começou a ganhar corpo no Congresso, a Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou um estudo elaborado pela área econômica do governo mostrando que o prejuízo aos cofres públicos chegaria aos R$ 417 bilhões – quase metade do PIB brasileiro. Até o Congresso percebeu o tamanho do problema que isso causaria e resolveu estabelecer uma data a partir da qual esses vetos seriam analisados – 1º de julho, em ordem cronológica.
O problema é que isso fez com que a presidente Dilma ficasse refém do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). A proposta de limitar os vetos a serem apreciados foi dele. Uma análise cuidadosa da consultoria do Senado definiu que 1,5 mil deles não precisariam mais ser analisados, porque a matéria da qual tratavam “caducou”. No jargão político, a expressão significa que o assunto perdeu a validade com o passar do tempo.
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Despesas à vista
Não são apenas os vetos que trazem dor de cabeça para o governo. Um conjunto de projetos prontos para serem analisados pelo Congresso também aumentam as despesas do Executivo. Um deles, o PLC 89, propõe a fixação de 10% das receitas correntes brutas da União para serem aplicadas em ações e serviços públicos de saúde pelo governo federal. Na ponta do lápis, isso significa R$ 43 bilhões. Um projeto de iniciativa popular apensado aos demais que tramitam na Câmara exige que este gasto seja imediato. Os projetos dos parlamentares falam em um prazo entre seis e 13 anos para a implementação total da proposta.
Para a educação, a despesa é ainda maior. Os congressistas querem 10% do PIB para o setor – o que deve chegar a R$ 100 bilhões de impacto. Tal montante explica a pressão da presidente Dilma para a aprovação do projeto que prevê a destinação de 100% dos royalties do pré-sal para a área. No auge das manifestações de junho, que sacudiram o país, ainda foi proposto por Renan um projeto que institui o Passe Livre Nacional, com impacto aproximado de R$ 4 bilhões.
O governo ainda negocia com a base a derrubada da proposta do orçamento impositivo, que obriga o Executivo a pagar todas as emendas parlamentares, sem poder contingenciar nenhum valor, mesmo em tempos de crise financeira. Pelos cálculos do Planalto, isso representa um impacto de R$ 9 bilhões. "Os vetos são mais graves do que o orçamento impositivo. As emendas dependem de uma série de fatores, como a adimplência do município e a apresentação de projetos consistentes", afirmou o presidente do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antonio Queiroz. "Os vetos recentes envolvem projetos cujos impactos não se diluíram ao longo do tempo. É algo mais perigoso para as contas públicas", completou.