Depois de deixar claro que é a responsável pela última palavra no debate econômico e iniciar um diálogo mais próximo com a base aliada para abafar a crise com o Congresso, a presidente Dilma Rousseff avocou a autoridade de chefe de Estado para ditar as normas da política externa brasileira. Ao empossar o novo ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo – escolhido pela competência nas negociações durante a Cop15 em Copenhagen, na Dinamarca, em 2009, e na Rio+20, na capital fluminense, no ano passado –, Dilma repetiu que o governo não coloca a vida dos outros em perigo, numa crítica explícita à atitude tomada pelo ex-encarregado de negócios na Bolívia Eduardo Saboia, que trouxe ao Brasil o senador Roger Pinto Molina sem salvo-conduto de seu país, depois de ele permanecer 15 meses asilado na embaixada.
O discurso duro da presidente – o segundo em menos de 24 horas – mostra o grau de insatisfação com a quebra de hierarquia no Itamaraty. Dilma lembrou que o multilateralismo é a única forma eficiente e perene de produzir consensos. “Foi assim que viemos conquistando o respeito do mundo. Foi assim que alcançamos grandes vitórias recentes de nossa diplomacia. Foi assim com a eleição de nosso companheiro José Graziano para a FAO, na eleição do ex-ministro Paulo Vanucchi para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, e agora, mais recentemente, com a eleição do embaixador Roberto Azevêdo, para o cargo de diretor-geral da Organização Mundial de Comércio”, citando todas as vitórias internacionais obtidas durante o seu governo.
Dilma deu uma amenizada ao elogiar a atuação do ex-chanceler Antonio Patriota, que ocupará o cargo de embaixador do Brasil na Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York. “Meu governo não pode e não quer prescindir de sua experiência, de seu conhecimento e do respeito que desfruta como diplomata”, afirmou ela.
Pedido de refúgio
Dilma, no entanto, está pouco disposta a ceder a pressões. Pela legislação brasileira, processos de extradição ficam suspensos até que seja votado o pedido de refúgio, como o protocolado por Roger Pinto no Conselho Nacional de Refugiados (Conare). “O pedido de concessão de refúgio pressupõe uma série de condicionantes, como perseguição política, religiosa e racial. É mais complexo que um pedido de asilo. Para ser concedido, as condicionantes têm de estar presentes no caso”, afirmou o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.
A presidente tem agido de outras maneiras para amenizar as queixas dos bolivianos. Além de ter demitido Patriota, ela foi célere em nomear um novo substituto para o cargo de encarregado de negócios na embaixada da Bolívia. Na noite de terça-feira, escolheu João Luiz Pereira Pinto, diretor do departamento da América do Sul.
Em sua primeira entrevista como ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo afirmou que atendimento ao pedido de Evo Morales é um assunto da presidente Dilma Rousseff. “Quem conduz essa questão é a Dilma e, portanto, será feito o que ela determinar.”
O embaixador da Bolívia no Brasil, Jerjes Justiniano Talavera, afirmou, durante a solenidade de transmissão do cargo, que ainda aguarda uma resposta oficial do governo brasileiro. Mas minimizou os desdobramentos do episódio. “Nossas relações diplomáticas são excelentes e não serão afetadas por esse incidente”, assegurou.