As fortes reações nas ruas, na internet, no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF) à manutenção do mandato do deputado Natan Donadon (sem partido-RO) – condenado a 13 anos de prisão por peculato e formação de quadrilha – trouxeram à ordem do dia o debate sobre o fim do voto secreto na Câmara e no Senado. Preso desde 28 de junho por crimes de peculato e formação de quadrilha, Donadon teve seu mandato poupado com o apoio de 131 deputados, em votação fechada. Para que ele fosse cassado, eram necessários 257 votos, no entanto só foram atingidos 233. Houve 41 abstenções, 104 ausências e quatro obstruções. Apesar dos discursos dos parlamentares favoráveis ao fim do sigilo, a falta de transparência corre o risco de voltar com ainda mais evidência na decisão sobre a perda de mandato dos mensaleiros. E, caso não haja vontade política para que a proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto aberto para cassação seja aprovada com rapidez, ainda há o risco de os condenados pelo escândalo serem beneficiados pelo velho modelo.
Depois da manutenção do mandato do deputado que já estava condenado e preso, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), declarou que não colocaria em votação nenhum caso de perda de mandato enquanto a PEC do voto aberto não fosse aprovada. “Isso é acordado por todos os líderes”, garantiu. Mas, na prática, alguns partidos resistem ao fim do voto secreto. A PEC foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) há dois meses, mas a comissão especial só foi instalada na semana passada, quando todas as legendas indicaram seus integrantes – PT e PMDB deixaram para o prazo final.
Diversos parlamentares subiram ontem à tribuna para criticar o voto secreto. “O Congresso está de cócoras perante o mundo”, condenou o presidente do DEM, senador Agripino Maia (RN). “Fico impressionado como o parlamento brasileiro está dissociado da agenda da população brasileira”, disse o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF).
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), prometeu dar celeridade à votação da chamada PEC dos Mensaleiros, que prevê a perda imediata de mandato em casos de condenação em última instância por improbidade administrativa. “Essa situação da prisão com o exercício do mandato não dá mais”, justificou.
Ironia
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello afirmou que a decisão da Câmara é “discrepante” com a Constituição Federal, que estabelece no artigo 15 que uma condenação leva à perda de direitos políticos, e ironizou: “Devem estar lisonjeados os reeducandos da Papuda (presídio onde está Donadon) por terem um colega deputado federal. Certamente, estão vibrando, com a moral lá em cima”. Já o ministro Gilmar Mendes afirmou que o “constrangimento” causado pela Câmara não o surpreendeu, pois, segundo ele, é a “crônica de uma morte anunciada”. Ele alertou para a “incongruência” da medida. “Temos agora um deputado preso, condenado, que continua com o mandato. Mas eu acredito que nós vamos encontrar uma solução para esse impasse, que nos enche de constrangimento”, destacou Mendes, que preferiu não relacionar a manutenção do mandato de Donadon com a situação dos quatro deputados condenados no processo do mensalão.