Brasília – Pouco mais de dois meses após as manifestações que sacudiram o país em junho e a menos de uma semana de uma nova passeata nacional, agendada para o dia 7, o Congresso insiste em entregar presentes de grego para a população e se fazer de mouco para o clamor dos brasileiros. A manutenção do mandato do deputado presidiário Natan Donadon (sem partido-RO), condenado a 13 anos e quatro meses por peculato e formação de quadrilha, foi a cereja do bolo do período. Os parlamentares prometem, só agora, derrubar o voto secreto nas cassações. Mas não transformaram a corrupção em crime hediondo, enrolam para acabar com o foro privilegiado e nem sequer cogitam analisar o fim da aposentadoria compulsória de magistrados e juízes envolvidos em casos de corrupção.
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Reforma política recebe pressão da CNBB e outras 12 entidadesEros Grau reprova decisão do Congresso sobre DonadonPauta-bomba fica para depois no CongressoAnalistas, no entanto, não enxergam nessa justificativa de Queiroz um pendor mais democrático do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), do que o adotado pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Afirmam que tudo não passa de uma questão de sobrevivência.
O episódio Donadon foi, sem dúvida, algo sintomático. “Nós estávamos tentando impor uma agenda positiva para a Casa e acontece esse desastre”, lamentou o segundo secretário da Mesa Diretora da Câmara, Simão Sessin (PP-RJ).
Na avaliação do deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), a união de forças para livrar Donadon da cassação foi algo assombroso. “Existe uma massa nessa Casa disposta a manter as coisas como estão”, completou Chico.
ELEIÇÕES 2014 Para o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), o que ocorreu na última semana foi inacreditável. “Conseguimos rasgar o resto de credibilidade que tínhamos. Até ensaiávamos alguns avanços, mas estragamos tudo”, reconheceu o líder demista. O ex-líder do governo na Câmara Cândido Vaccarezza (PT-SP) discorda. “O caso Donadon, sem dúvida, foi um erro político. Mas o Congresso tem cumprido o papel que o eleitor espera dele. E isso vai ser comprovado pelo resultado das eleições do ano que vem”, disse Vaccarezza.
Para ele, matérias importantes para o país, como a Lei dos Portos e o Código de Mineração – ainda em tramitação – beneficiam os brasileiros. E alerta para os cuidados da demonização do Legislativo. “Não existem alternativas com o fechamento do Congresso. Ditaduras são o pior do mundos para um país”, completou. Companheiro de plenário de Vaccarezza, o deputado Reguffe (PDT-DF) é bem menos condescendente com seus pares. “O Congresso não esteve tímido nos últimos três meses. Ele foi omisso nos últimos três anos. A reforma política caminha para uma simples reforma eleitoral. O Congresso age com espírito de corpo em vez de defender a sociedade que ele representa”, criticou Reguffe.
Para o mestre em direito e professor da FGV Rio Pedro Abramovay, é clara a falta de compromisso dos parlamentares. “Eles não estão à altura do que aconteceu nas ruas a partir de junho. As pessoas estão mais interessadas em política, mas os políticos insistem em sobreviver em um sistema fechado”, criticou. Para Abramovay, os recentes acontecimentos só servirão de combustível para os protestos de 7 de setembro. “Se as pessoas não forem às ruas, nossos parlamentares entenderão que têm carta branca para fazer o que quiserem com os próprios mandatos”, convocou.
Os pedidos das ruas
Minirreforma eleitoral
Situação atual: O projeto faz exatamente o contrário: enfraquece a legislação em vigor. O relatório do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que pretende afrouxar, entre outras coisas, regras de doação e financiamento para campanha com validade já para 2014, está pronto, mas não pôde ser votado porque a proposta dos royalties tranca a pauta da Câmara.
Corrupção como crime hediondo
Situação atual: O texto foi aprovado no Senado e havia a promessa para que passasse pela Câmara antes do recesso, mas não entrou na pauta de votações.
Marco civil da internet
Situação atual: A proposta que regulamenta o funcionamento e o trânsito de dados na rede foi considerada prioritária pelo governo desde que surgiram denúncias de que o Brasil foi alvo da espionagem americana. Não houve, porém, acordo sobre o texto.
Foro privilegiado
Situação atual: O fim do benefício dado aos parlamentares ficou na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara por duas semanas, mas o colegiado não conseguiu fazer votações.
Aposentadoria dos garçons
Situação atual: Garçons e cozinheiros encheram as galerias da Câmara na esperança de que o projeto que lhes concede aposentadoria especial fosse aprovado, mas, apesar das promessas, o texto foi para o fim da fila.
Aposentadoria compulsória de magistrados e integrantes do MP
Situação atual: Os senadores prometeram acabar com a regra utilizada como pena disciplinar. O lobby da categoria, no entanto, prevaleceu pelo menos por ora. O Senado tentou votar a matéria na última semana antes do recesso, mas, pressionado, adiou a votação.
Fim do voto secreto
Situação atual: Apesar de ser um dos cinco itens sugeridos pela presidente Dilma Rousseff como tema do fracassado plebiscito sobre a reforma política, o tema também não encontrou consenso para avançar à votação final. A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou texto que acaba com o sigilo em todas as circunstâncias previstas pela Constituição. Mas, na hora de ir ao plenário, a proposta encalhou. A oposição defende que seja preservado o voto secreto em caso de vetos presidenciais. Há propostas distintas sobre o assunto nas duas Casas.