Jornal Estado de Minas

Dilma discursa na ONU e espionagem será o tema da presidente

Presidente abre nesta terça-feira, nos Estados Unidos, a Assembleia Geral das Nações Unidas e coloca o tema espionagem em discussão

Renata Tranches
Dilma recebe flores na chegada a Nova York: invasão americana de privacidade será a base do discurso - Foto: Roberto Stuckert Filho/PR
Chefes de Estado do mundo todo vão se reunir, a partir desta terça-feirae, em Nova York, para mais uma Assembleia Geral das Nações Unidas, pautada este ano por crises e ineditismos. No discurso de abertura, missão tradicionalmente atribuída ao Brasil, a presidente Dilma Rousseff colocará a espionagem em discussão. As denúncias de que os Estados Unidos estariam bisbilhotando governos estrangeiros provocaram diversos atritos diplomáticos entre Washington e países aliados. As divisões em torno da crise síria deverão ficar evidentes e poderão dar o tom em uma possível resolução do Conselho de Segurança, pela qual o governo americano tem pressionado seus membros. A grande surpresa, entretanto, deverá ficar por conta do aguardado discurso do novo presidente iraniano, Hassan Rowhani. Ao longo da última semana, o líder moderado do regime teocrático islâmico acenou com mensagens de reaproximação com o Ocidente. Antes de embarcar para os EUA, ele declarou que vai apresentar “a face verdadeira do Irã” e buscar cooperação com o Ocidente.


No Brasil, as atenções estarão voltadas para o pronunciamento de Dilma Rousseff. A presidente chegou a Nova York no início da manhã de ontem e adiantou que pretende tratar da “nova governança contra a invasão de privacidade” em seu discurso, além da crise na Síria. Um dos alvos dos serviços secretos americanos, segundo denúncias do ex-funcionário da Agência de Segurança Nacional (NSA) Edward Snowden, o Brasil tem defendido que o monitoramento das comunicações seja discutido no âmbito dos organismos multilaterais.
Outro aspecto considerado grave e que deve ser destacado por Dilma é o fato de a NSA ter bisbilhotado informações da Petrobras, o que poderia trazer danos aos negócios da estatal no mercado num momento delicado, em que o governo está colocando em prática um amplo programa de concessões.

A presidente deve se reunir hoje com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. Existe a expectativa de um encontro entre Dilma e o colega americano, Barack Obama. Há exatamente uma semana, a presidente decidiu adiar a visita de Estado que faria a Washington em outubro, após o governo brasileiro considerar insuficientes as explicações da Casa Branca. Em Nova York, os dois discursarão no mesmo dia e, assim como ocorreu na reunião do G20 em São Petersburgo (Rússia), podem conversar sobre o tema.

Três perguntas para...

Matthew Taylor, Cientista político e professor da American University, em Washington, especialista em temas do Brasil

Na sua opinião, como deverá ser o tom do discurso da presidente Dilma Rousseff ao falar sobre espionagem?
Me parece que a presidente Dilma tem todas as condições para oferecer um discurso importante, que ajude a colocar o assunto da espionagem na pauta internacional. A dúvida é saber para qual plateia ela quer discursar. Se resolver se voltar para a brasileira, acho que a tendência será apelar à soberania e ao patriotismo. Mas, se discursar pensando em realmente mudar os hábitos dos grandes poderes, ela terá de ser menos veemente e mais comedida, oferecendo soluções efetivas de médio e longo prazo.

E como ela poderá fazer isso?
Isso não será fácil, até porque os poderes maiores acreditam que a espionagem é contínua e, de certa forma, esperada. Portanto, há uma grande chance de as soluções oferecidas por poderes emergentes, como o Brasil, serem vistas como ingênuas ou irrealistas. Equilibrar o discurso para conseguir convencer as duas plateias será difícil, especialmente com a aproximação do ano eleitoral no Brasil e o fato de o foco das atenções na ONU estar na Síria e no Irã. Não me surpreenderia, portanto, se o discurso acabasse sendo muito mais focado em atender às necessidades políticas imediatas da presidente no Brasil.

Como seria um eventual encontro dela com o presidente Barack Obama?
Certamente, a presidente deverá buscar explicações, e tenho a sensação de que ela agirá com pulso firme, pensando ativamente na repercussão que a cobertura do encontro terá na política interna do Brasil. Mas também acho que os dois lados sabem que não há ganhos sensíveis em extrapolar na discordância: Obama não conseguirá dar todas as explicações que o governo brasileiro gostaria de receber. Este, por sua vez, sabe que existem limites àquilo que o governo americano pode divulgar. (RT)