Jornal Estado de Minas

Lula põe fervura nas eleições de 2014

Oposição vê participação de ex-presidente no palanque como antídoto à baixa popularidade de Dilma, enquanto petistas apontam a presença como um reforço de luxo para a campanha

Jorge Macedo - especial para o EM
Amanda Almeida, Karla Correia, Bertha Maakaroun

Aos Diários Associados, Lula disse que pretende ir aonde Dilma não puder na busca do PT por mais quatro anos no Planalto - Foto: Luludi/Esp.CB. Brasil
Brasília, Belo Horizonte e Recife – A disposição exibida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em atuar como cabo eleitoral da presidente Dilma Rousseff nas eleições de 2014 foi vista, entre os partidos que se colocarão no lado oposto da presidente na disputa pelo Palácio do Planalto, como uma demonstração de que Dilma não se reelegerá sem recorrer à popularidade do ex-presidente.

“A Dilma, como candidata, não tem os atributos que o Lula tem”, avaliou o líder do PSB no Senado, Rodrigo Rollemberg (DF) – um dos principais defensores do lançamento da candidatura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), ao Palácio do Planalto. Aos Diários Associados, Lula afirmou que queria ser a “metamorfose ambulante” de Dilma. “Estou disposto. Se ela não puder ir para o comício num determinado dia, vou no lugar dela. Se ela for para o Sul, vou para o Norte. Se ela for para o Nordeste, vou para o Sudeste”, disse o ex-presidente.

“Nem a economia está boa, como estava em 2010, nem a candidata Dilma tem a desenvoltura do ex-presidente Lula. Isso indica que teremos uma eleição difícil, que só será decidida no segundo turno”, avaliou Rollemberg. Líder do governo na Câmara, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) defendeu a atuação de Lula como cabo eleitoral de Dilma. “Quando ele se dispõe a participar da campanha, ele está reiterando a confiança que tem nela e no governo”, argumentou Chinaglia.

Principal expressão da ala do PT que tentou manter até o último minuto a aliança com o PSB de Eduardo Campos, Lula disse ter considerado “um erro” o rompimento do governo com a legenda de Campos. “Foi um prejuízo para a gente ter o PSB, e sobretudo o Eduardo Campos, do outro lado”, admitiu Lula, que defendeu a adoção de “regras de comportamento” durante a campanha para evitar o aprofundamento das fissuras entre PT e PSB. “Se a eleição não terminar no primeiro turno, poderemos ter aliança no segundo turno”, argumentou o ex-presidente.

Mas, para o vice-presidente do PSB, Roberto Amaral, grande parte da responsabilidade pelo afastamento deve ser atribuída ao próprio partido da presidente Dilma. “O PT não teve a iniciativa, como partido da presidente, de procurar o entendimento. E acho que o presidente Lula podia também ter tomado mais iniciativa”, disse Amaral, ministro de Ciência e Tecnologia do primeiro mandato de Lula.

Amaral, contudo, aponta para um caminho de reaproximação entre as duas siglas, em um possível segundo turno da corrida presidencial, e converge com a opinião do ex-presidente ao lembrar a identificação ideológica das duas legendas. “É fundamental lembrar que as eleições ocorrem em dois turnos e nos preparar para isso. Os partidos apresentam suas individualidades, sua identidade, e, no segundo turno, uma legenda deve fazer coligação com os mais próximos ideologicamente. É preciso deixar caminho aberto para o segundo turno”, raciocina o vice-presidente do PSB.

Ambiguidade

Ao comentar o cenário da disputa que se desenha hoje, Lula avaliou que o PSDB terá “mais dificuldades” com o lançamento da candidatura do senador Aécio Neves (MG) ao Planalto do que teria se optasse por lançar o nome de José Serra. “O Aécio vai ter que se tornar conhecido. O Serra já é conhecido, tem o recall de outras disputas”, ponderou Lula. O senador Aécio Neves não quis comentar a afirmação do ex-presidente.

O presidente estadual do PSDB, Marcus Pestana, considerou “ambíguas” as declarações de Lula em relação às eleições do ano que vem. “No campo político, ele não colocou o pijama e foi para casa. Vai cuidar da cria. Ele é avalista. Mas sempre deixa a porta aberta. Nas entrelinhas fica a possibilidade de voltar se as coisas degringolarem”, disse. O presidente estadual do PT em Minas, Reginaldo Lopes, avalia o contrário. “Lula é das maiores lideranças vivas do mundo. Ele tem grande papel no Brasil e fora do país, portanto, está correto quando diz que não será candidato. A experiência dele à frente de um governo que eliminou a miséria pode ser replicada em vários países da América Latina e da África”, opinou Reginaldo Lopes.

Segundo Lopes, Dilma é a candidata do PT à reeleição. “Lula, que respeitou a democracia não aceitando mudanças na Constituição para permitir um terceiro mandato, sabe que Dilma tem dado respostas aos problemas do país”, afirmou. “Lula acabou com a miséria e Dilma agora elimina a desigualdade, criando uma sociedade do conhecimento, qualificando a mão de obra com base tecnológica. Ela vai também resolver os problemas de infraestrutura do país, destravando as obras de portos, rodovias e ferrovias. Este é o desafio que está colocado e ela está indo muito bem”, acrescentou o petista. (Colaborou Tércio Amaral)

 

Disputa no Recife

O senador Humberto Costa (PT-PE) confirmou que o ex-presidente Lula pediu que ele desistisse de ser candidato à Prefeitura do Recife nas eleições de 2012, mas relatou uma versão complementar à do seu aliado. “Em junho, com a mudança das circunstâncias (a briga interna no PT do Recife), ele e a Executiva Nacional do partido me apoiaram”, explicou Costa. O senador, que teve o ex-prefeito e deputado federal João Paulo como vice, saiu derrotado na disputa, amargando a terceira colocação, ficando atrás do deputado estadual Daniel Coelho (PSDB-PE) e de Geraldo Julio (PSB), eleito no primeiro turno.

 

Defesa do julgamento

 

A afirmação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos Diários Associados de que houve condenações sem provas no julgamento do processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) foi rebatida com irritação pela oposição. Na entrevista, publicada no domingo, Lula ainda reclamou de um suposto linchamento público dos réus. “Mais do que um julgamento, o que nós tivemos foi um linchamento, por uma parte da imprensa brasileira”, apontou.

Para a oposição, a fala de Lula desrespeita a Suprema Corte. “Nós tivemos várias fases de comprovação de denúncias. Dois procuradores, Antônio Fernando de Souza e Roberto Gurgel, aprofundaram as ligações, se valeram de vários expedientes de investigação e confirmaram que houve um amplo esquema de corrupção”, rebateu o senador Alvaro Dias (PSDB-PR). O ministro do STF Marco Aurélio Mello contemporizou e disse que a opinião do ex-presidente equivalia à de um “leigo”. “É uma visão leiga dos fatos. Nós, que julgamos, sabemos por que julgamos e como julgamos. Mas temos que relevar. Não critico o ex-presidente. Ele está exercendo um direito democrático e republicano de se expressar livremente”, afirmou o magistrado.

Em referência a outra frase de Lula, de que teria “mais critério” se fosse indicar novamente ministros à Corte, Marco Aurélio disse que é o tipo de arrependimento sem qualquer efeito prático. “Como ele indicou vários ministros, pode ser que o arrependimento seja relativo a apenas um. Só que, se ele indicou alguém que ele acha que não deveria ter indicado, isso não é eficaz, não há como voltar atrás. Estamos em um processo que não permite que se volte ao estágio anterior”, ponderou o ministro.

Dos 11 ministros que compõem o plenário da Suprema Corte, quatro – Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Dias Toffoli – foram indicados pelo ex-presidente. A oposição viu novo desrespeito no comentário sobre os magistrados. “Você pode até discordar dos resultados do julgamento. Mas falar dessa forma é um despautério, é próprio de quem não merece o menor respeito. É sinal de que ele imagina, como critério, escolher quem deveria ir para lá para absolver mensaleiros”, disparou o presidente do PPS, o deputado federal Roberto Freire (SP). (KC e AA)