A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de negar o registro à Rede de Marina Silva provocou um alívio momentâneo no Palácio do Planalto e no PT, legenda que se empenhou fervorosamente, tanto no Congresso quanto na Justiça, para impedir a criação da sigla. Sem Marina — que decidirá hoje se vai se filiar a alguma legenda para disputar as eleições de 2014, possivelmente o PEN ou o PPS —, aumentam as chances de a eleição ser decidida ainda em primeiro turno. “Não foi o PT que derrotou a Rede. Foi Marina que demorou demais para criar o partido dela”, disse o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE). No entanto, a expectativa é de que a ex-senadora dificilmente ficará de fora da briga.
Para o senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB e pré-candidato do partido ao Planalto, a atuação do PT influenciou o resultado de ontem no TSE. “Acompanhamos, desde o início, o esforço de Marina Silva para a formação da Rede e fomos solidários a ela, inclusive quando a truculência do PT se fez mais presente na tentativa de impedi-la de alcançar seu objetivo no Congresso. Lamentamos a decisão do TSE, mas temos que aceitar e respeitar a Justiça”, declarou Aécio, em nota. O tucano afirma que a presença de Marina na disputa presidencial, mesmo sem a Rede, engrandecerá o debate político do país.
A opinião é compartilhada por Eduardo Campos, governador de Pernambuco, presidente do PSB e provável nome do partido para a sucessão de Dilma. “Continuamos solidários aos companheiros da Rede no esforço de construir um espaço na cena política. A sociedade deseja renovação, novas práticas. Seria bom para o Brasil ter um ambiente como o da Rede”, afirmou Campos.
Enquanto não decide o próprio destino, Marina deixa no ar um capital político de 19,6 milhões de votos recebidos nas eleições de 2010. O tamanho atual desse patrimônio, contudo, é uma incógnita. Em 2010, ela teve quase 19,6 milhões de votos. Hoje, não se sabe se o prestígio continua o mesmo. “Os aliados de Marina acham que ela tem os mesmos 20% dos votos (do primeiro turno das eleições de 2010), mas não sabemos se esse percentual é real”, afirmou o vice-presidente do PSB, Roberto Amaral. “Por isso, não há como mensurar quanto do eleitorado será distribuído e de que maneira esses votos vão se colocar”, acrescentou.
Na última quarta-feira à noite (2), Marina reuniu os principais parlamentares que decidiram acompanhá-la na tarefa de criação da Rede. Emitiu sinais contraditórios sobre os próximos passos, o que deixa os seguidores ainda mais angustiados. “Ela elogiou a disposição do PEN em ceder a direção partidária para o nosso grupo, mas também ponderou que o PPS foi um dos primeiros partidos a buscá-la quando ela deixou o PV, em 2011”, disse um dos interlocutores que participaram do encontro.
Polarização
Caso Marina saia da disputa, as chances de a eleição presidencial repetir a polarização PT x PSDB das últimas cinco disputas aumentam. Aécio tem um partido bem estruturado e mais tempo de televisão do que a ex-senadora. Mas era ela, e não o tucano, quem aparece em segundo lugar nas recentes pesquisas de intenção de voto, atrás de Dilma Rousseff.
Já para o socialista Eduardo Campos, cujo partido batalhou pela aprovação da Rede, o cenário não seria tão ruim se Marina ficasse ausente do pleito eleitoral, pois ele poderia se consolidar como terceira via à dicotomia entre petistas e tucanos. Sem ela, o governador socialista pode ganhar espaço na briga PT x PSDB.
O cenário sem a Rede
Veja o que a rejeição da Rede significa para alguns personagens da disputa eleitoral do próximo ano
Marina Silva: Mesmo sem a Rede, conta com uma base eleitoral ampla e, embalada pelas pesquisas, tem grandes chances de ser a adversária de Dilma Rousseff no segundo turno das eleições. Para isso, precisa se filiar a algum partido, o que deve ocorrer hoje. PEN e PPS são os favoritos.
Dilma Rousseff: Com Marina no páreo, diminuem, matematicamente, as chances de a presidente vencer a disputa eleitoral em primeiro turno devido à pulverização de votos. Se a ex-senadora decidir se manter fora da corrida presidencial, a fatura pode ser liquidada em primeiro turno a favor da petista.
Aécio Neves: A estratégia para 2014 ainda depende do fator Marina. Se ela entrar na briga, o tucano terá dois adversários de peso, pois tanto a ex-senadora quanto a presidente Dilma Rousseff aparecem à frente de Aécio nas pesquisas de intenção de votos.
Eduardo Campos: Se Marina decidir se filiar a algum partido hoje, o socialista perde o carimbo de terceira via à polarização PT x PSDB. Entretanto, com a possibilidade de segundo turno, terá um trunfo nas mãos, pois será disputado pelos dois finalistas.
Apoiadores de Marina: Sem a Rede, Walter Feldman (PSDB-SP), Domingos Dutra (PT-MA), Alfredo Sirkis (PV-RJ), Miro Teixeira (PDT-RJ) e Reguffe (PDT-DF) terão caminhos distintos. Feldmann é suplente e já sinalizou que poderá abandonar as disputas eleitorais. Dutra, Sirkis e Teixeira terão dificuldades em permanecer nas atuais legendas, seja por incompatibilidade com os comandos partidários ou por disputas locais. Reguffe pode ficar no PDT, mas tenderia a concorrer à reeleição, não a um cargo majoritário, como o Senado ou o GDF.
Evangélicos: Parte dos evangélicos brasileiros está com a presidente Dilma Rousseff, sobretudo os fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus, ligada ao ministro da Pesca, Marcelo Crivella (PRB). No entanto, Marina Silva tem trânsito grande nesse segmento da população — em 2010, eram 42,3 milhões de pessoas em todo o país, número suficiente para fazer barulho nas urnas, independentemente do destino de Marina.
Jovens: Marina se transformou na grande alternativa para os jovens que se desvincularam dos atuais padrões políticos e dos candidatos tradicionais. Tanto que as pesquisas de opinião feitas após as manifestações de rua de junho mostraram Marina como a candidata favorita desse segmento da população. Não se sabe, no entanto, como será a reação desse segmento caso ela se filie a outra sigla hoje.
PT: Sem a Rede no páreo, obtém uma vitória parcial, que pode ser diluída caso Marina decida concorrer por outra sigla
PEN: Sem a Rede, abre as portas para a filiação de Marina e pode se tornar a legenda de uma candidata a presidente, o que confere status político. Seu presidente, Adilson Barroso, concorda em passar para o grupo de Marina o controle da sigla.
PPS: A exemplo do PEN, também tentará abrigar Marina. Mas há uma grande diferença: o PPS é muito centrado na figura do presidente do partido, o deputado Roberto Freire (SP).
Reações nas redes sociais
A derrota da Rede no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) repercutiu nas redes sociais ontem, mídia utilizada pela própria Marina Silva nos últimos dias para tentar convencer os ministros da Corte a aprovarem a legenda. “Muito duro pensar que teremos cinco anos pela frente sem nenhum projeto de país para apostar. De volta ao mundo dos cínicos”, lamentou o cineasta Fernando Meirelles. Ligado ao PT e ao ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, o ator José de Abreu ironizou a derrota de Marina. “E o partido que não se chama partido, que se pretende apartidário, conseguiu o que propõe”, afirmou. O sociólogo Emir Sader provocou os sonháticos quanto à possibilidade de a ex-senadora ficar ausente da disputa de 2014. “Vai sair pesquisa no fim de semana do quadro eleitoral sem Marina?”, questionou.