O procurador afirma que o grande “gargalo” do sistema eleitoral é a prestação de contas. “Se há um voto em determinado candidato, o eleitor precisa saber quem financia a campanha dele. E qualquer medida que torne isso mais difícil é um retrocesso”, diz Morato. O procurador citou um exemplo, que pode não ser tão difícil encontrar, para burlar a legislação, e que poderia ser detectado pela Justiça Eleitoral na conferência mais analítica, como é feita hoje. “Um candidato de uma pequena cidade do interior afirma ter usado R$ 50 mil em combustível. O valor pode embutir recursos que ele estaria usando na verdade para comprar votos”, argumenta.
O procurador afirma ter ocorrido no Brasil avanço com a aprovação da Lei Ficha Limpa, que impede a candidatura de quem tem condenação em instâncias colegiadas. “O que é preciso agora é ir mais adiante no que se refere ao financiamento de campanha”, avalia. “Informação é fundamental para o eleitor. Se um candidato durante a campanha afirma que vai ampliar o sistema de metrô, por exemplo, e na suas contas de campanha fica claro que há recursos de concessionárias de ônibus, fica claro que o candidato passou rasteira em quem o elegeu”, analisa Morato. “A democracia pressupõe informação. A máxima clareza é de fundamental importância”, acrescenta.
Para o cientista político Rubens Figueiredo, a minirreforma aprovada pela Câmara vai na contramão do que a sociedade quer. “A população quer transparência. Sem fiscalização existe a possibilidade de aumento de impunidade”, afirma. Figueiredo diz ser necessário apertar o cerco em relação aos políticos. “Se quem recebeu voto ousa (como em relação ao estabelecimento da análise superficial dos gastos de campanha), é porque tem uma perspectiva alta de haver impunidade. Isso não é uma reforma. É uma deforma.” O cientista político não demonstrou qualquer esperança de que o texto possa ser modificado no Senado. “Quando entram para um negócio corporativo, o projeto passa que é uma beleza.”
Jovita José Rosa, diretora do MCCE, afirma existir um descompasso entre os congressistas e a sociedade. “A reforma não nos representa, para usar um termo da moda. Há hoje uma falta muito grande de sensibilidade dos parlamentares”, diz. “E tudo muito próximo das manifestações de junho. Os políticos só fizeram alguma coisa no auge da ida da população para as ruas”, lembra Jovita. “O que queremos é transparência e seriedade com a coisa pública. Se a pessoa não é transparente na hora da candidatura, não o será caso chegue ao cargo ao qual se lançou”.
OUTRO LADO Ao longo da semana, parlamentares apontaram o que consideram vantagens da minirreforma. O deputado Fabio Trad (PMDB-MS) disse à Agência Câmara que a proposta é um avanço. “Ela vai impedir que os candidatos, pelo marketing, virem produtos de supermercado”, declarou. Seu colega Marçal Filho (PMDB-MS) contestou o argumento do PT, contrário ao texto, de que a minirreforma não faz mudanças políticas substanciais. “Se não aceitam fazer a pequena reforma, vão deixar fazer a grande reforma?”, questionou.
Ao mesmo tempo em que torna menos rigorosa a prestação de contas das campanha, o texto aprovado pela Câmara fixa teto para gastos com alimentação e aluguel de veículos. Também libera atos de pré-campanha e permite manifestações em redes sociais.
Os destaques
Confira alguns pontos da minirreforma aprovada pelos parlamentares
Limita o poder de auditoria da Justiça Eleitoral.
Recursos obtidos pelos partidos por meio do Fundo Partidário não estão sujeitos às regras da Lei de Licitações para contratação de bens e serviços.
Permissão para o parcelamento de multas eleitorais em até 60 meses, com parcelas limitadas a 10% da renda da pessoa ou do partido político condenado.
Doações de bens móveis de até R$ 4 mil e as doações realizadas entre candidatos, partidos ou comitês decorrentes de uso comum de sede e de material não precisarão mais ser comprovadas na prestação de contas das campanhas eleitorais.
Limita gastos com alimentação em campanha a 10% da receita obtida. E os gastos com aluguel de carros a 20% do mesmo valor. As despesas com passagens aéreas feitas pelas legendas com recursos do Fundo Partidário serão comprovadas apenas com o documento emitido pela agência de viagem, sem a necessidade de informação do beneficiário do bilhete.
Dá maior liberdade a pré-candidatos em período anterior à campanha eleitoral. O texto diz que não será considerada propaganda antecipada a participação de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros e debates no rádio, na televisão e na internet, “inclusive com a exposição de plataformas e projetos político”.