O secretário de Finanças da gestão Gilberto Kassab (PSD), Mauro Ricardo Machado Costa, que chefiou os fiscais acusados de causar prejuízo de até R$ 500 milhões à Prefeitura, mandou arquivar, em 28 de dezembro do ano passado, uma denúncia sobre o mesmo esquema revelado na quarta-feira pela operação que prendeu os quatro funcionários públicos. O objeto da denúncia também era a cobrança de propina para a emissão de certificado de quitação do Imposto sobre Serviços (ISS).
A denúncia anônima, datada de 29 de outubro, foi recebida em 22 de novembro. A autoria é atribuída a "construtores que respeitam as leis". O gabinete de transição do prefeito Fernando Haddad (PT) recebeu cópia.
Ricardo foi secretário de Finanças na gestão José Serra (PSDB) e secretário de Estado da Fazenda, também de Serra. Após chefiar as finanças de Kassab, ele é atualmente secretário da Fazenda de Salvador.
O texto recebido por ele diz que "a emissão do certificado de quitação do ISS é controlada por um funcionário, o carioca Luis Alexandre, o qual - segundo ele mesmo -, por ordem de seus superiores Carlos di Lallo, Barcellos e Ronilson, somente pode ser emitido mediante o pagamento de propina".
Ronilson Bezerra Rodrigues, Eduardo Horle Barcellos, Carlos di Lallo Leite do Amaral e Luis Alexandre Cardoso Magalhães, os fiscais investigados, estão na carceragem do 77.º Distrito Policial, em Santa Cecília.
"Quem não paga a propina está condenado a ver seu negócio naufragar. Sem propina, não há previsão para a emissão da guia de quitação", diz outro trecho da denúncia.
Ontem, o Estado revelou com exclusividade que ao menos cinco empresas pagavam propina aos fiscais. Os pagamentos eram feitos em dinheiro, muitas vezes dentro da própria Prefeitura, e que os cofres públicos ficavam com apenas 10% do valor devido de impostos. Na internet, também adiantou que a incorporadora Brookfield confirmou ao Ministério Público o pagamento de R$ 4,1 milhões aos fiscais presos.
A denúncia anônima arquivada por Mauro Ricardo também foi encaminhada a Kassab e à Ouvidoria Municipal. O processo, ao qual o Estado teve acesso, mostra que Ricardo enviou cópia da acusação ao próprio Ronilson, apontado pela atual investigação como chefe do esquema, para que ele prestasse esclarecimentos.
Em fevereiro deste ano, o atual controlador-geral do Município, um dos agentes responsáveis por tornar as irregularidades públicas, teve acesso ao procedimento feito por Ricardo. Escreveu que acolhia a manifestação do ex-secretário, "até que novos elementos sejam apresentados". Oito meses depois, todos foram presos.
Surpresa. Mauro Ricardo disse ontem ter ficado "surpreso" com a prisão do quarteto, em especial a de Ronilson. "Era uma pessoa em quem eu confiava, sempre muito prestativo. Foi uma decepção. Se ele fez isso, me sinto traído", afirmou.
"Assim que as denúncias chegaram à secretaria solicitei a abertura de processo administrativo, nos quais os acusados foram chamados a se justificar", afirma. "Eles apresentaram as justificativas e elas foram levadas à assessoria jurídica, que analisou as respostas e concluiu não haver indício de envolvimento dos servidores." Kassab não se manifestou.