Daniel Camargos
Um mês depois de o motorista aposentado Josias Nunes de Oliveira, de 69 anos, prestar depoimento à Comissão da Verdade de São Paulo, será a vez da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais escutá-lo. Ele é peça-chave do acidente que matou o ex-presidente Juscelino Kubitschek ,em 22 de agosto de 1976, pois dirigia o ônibus da Viação Cometa que teria fechado o Chevrolet Opala dirigido pelo motorista de JK, Geraldo Ribeiro. Sem controle, o Opala atravessou a pista – no quilômetro 165 da Rodovia Presidente Dutra, próximo a Resende (RJ) – e foi atingido por uma carreta Scania.
Leia Mais
Exumação de ex-motorista de JK está nas mãos da JustiçaALMG reforça pedido de nova perícia na morte de JK Comissão da Assembleia vai discutir possível assassinato de JK Morte de JK foi causada por acidente, conclui Comissão Nacional da Verdade Justiça determina que parentes de motorista de JK sejam ouvidos antes de exumaçãoMorte de JK: Ex-motorista de ônibus diz que foi vítima de armaçãoProjeto pode reduzir obstrução no plenário da Assembleia de MinasO deputado se refere ao que disse Josias para a Comissão da Verdade de São Paulo. O aposentado contou que recusou uma mala de dinheiro oferecida por dois homens que foram de motocicleta à sua casa para que assumisse o crime. “Queriam que eu me declarasse culpado e disseram que, se eu não pegasse o dinheiro, bateriam em mim”, afirmou. Em junho do ano passado, o Estado de Minas entrevistou Josias, que não falava com a imprensa desde a época do acidente. Na ocasião, o aposentado disse que se considera uma vítima da história e de reportagens da época. “Se eu fosse fraco teria feito bobagem. É duro pagar sem dever”, lamentou.
OPOSIÇÃO AO REGIME Para entender os motivos das dúvidas sobre a morte de JK é essencial compreender o contexto histórico. À época do acidente, a ditadura ensaiava dois caminhos: uma abertura, como aconteceu, com a declaração da anistia, em 1979, ou uma possibilidade de endurecimento. Estava em pleno vigor a Operação Condor, um ação conjunta dos governos militares do chamado Cone Sul para minar a oposição aos regimes militares.
Um dos documentos que despertam suspeitas é uma carta do coronel chileno Manuel Contreras enviada ao general de divisão João Baptista Figueiredo, então chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), em 1975. A carta discorria sobre a possibilidade de vitória do democrata Jimmy Carter nos Estados Unidos, o que influenciaria a “estabilidade no Cone Sul”. O general chileno citava que JK e o ex-ministro do Exterior do governo do chileno Salvador Allende Orlando Letelier poderiam receber apoio. No ano seguinte, os dois morreram.
A morte de Letelier foi atribuída à Dina, o serviço secreto liderado por Contreras, que explodiu o carro do ex-ministro em Washington, capital dos EUA. JK morreu um mês antes, quando buscava restabelecer a democracia no Brasil. Quatro meses depois, em dezembro, morreu o também ex-presidente João Goulart, de ataque cardíaco. Mais cinco meses se passaram e o ex-governador da Guanabara Carlos Lacerda também morreu, de infarto e desidratação aguda por febre. Os três formavam a Frente Ampla, grupo de oposição ao regime militar.
EXUMAÇÃO O governo de Minas acatou o pedido para que nova investigação seja feita em um fragmento metálico encontrado no crânio de Geraldo Ribeiro, motorista que dirigia o carro em que estava JK. Ele foi funcionário do ex-presidente por 36 anos. Uma perícia no corpo chegou a ser feita em 1996, constatando que havia um pequeno orifício na cabeça. O laudo oficial relata que se tratava de um pedaço de prego do caixão que perfurou o crânio de Geraldo, mas a comissão pediu que nova exumação seja feita para apurar a questão.