Jornal Estado de Minas

Dilma classifica como "absurda" recomendação do TCU de suspender obras do PAC

Daniela Garcia

Após inauguração na Petrobras, Dilma disse que rodovia no RS ficará pronta de qualquer jeito - Foto: Félix Zucco/Agência RBS/Estadão Conteúdo

Brasília – A pouco menos de um ano da corrida pelo Palácio do Planalto e com a crescente preocupação em mostrar realizações aos eleitores, a presidente Dilma Rousseff decidiu repetir o discurso do antecessor Luiz Inácio Lula da Silva ao externar a mesma irritação com o Tribunal de Contas da União (TCU) que o cacique petista demonstrou quando ainda chefiava o país. Dois dias depois de a Corte ter recomendado a paralisação de sete obras financiadas com recursos do governo federal, devido a indícios de irregularidades graves, como sobrepreço e superfaturamento, a presidente disse que é “absurdo” interromper as obras da União. Em 2009, o ex-presidente tinha afirmado que “não é justo mandar parar uma obra, mesmo quando haja algo errado”.

O último relatório do TCU pode atrapalhar os planos do PT de finalizar grandes empreendimentos e colher frutos eleitorais com as realizações. Entre as sete obras apontadas pelo TCU, quatro fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma das principais bandeiras da campanha de Dilma em 2010, quando Lula se referia à candidata como “mãe do PAC”.

A construção da BR-448, no Rio Grande do Sul, é uma das obras com contratos superfaturados, segundo o TCU. Em visita ontem ao estado, a presidente criticou a Corte durante entrevista a rádios locais. “É absurdo paralisar uma obra. É algo extremamente perigoso. Depois, ninguém repara o custo. Para e ninguém ressarce o que foi perdido. Mas vai ficar pronta de qualquer jeito”, prometeu, acrescentando que não perderá por nada a cerimônia de inauguração da BR-448.

As declarações de Dilma foram alvo da oposição, que acusou a petista de agir com motivos eleitoreiros ao atacar o tribunal de contas. “O TCU está cumprindo a sua função constitucional, zelando pelos princípios da administração pública com impessoalidade, que têm sido desprezados por este governo. A lei tem que ser cumprida”, afirmou o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes (SP). De acordo com o líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), Dilma tenta camuflar a falha do governo em finalizar as obras que prometeu. “A presidente só começou a fazer reunião com ministro para cobrar obra com a proximidade da campanha eleitoral.”

Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, o discurso de Dilma tem caráter eleitoral. Segundo ele, o trabalho do TCU é técnico, e ainda é submetido ao Congresso. “O brasileiro tem memória curta. Há 18 anos, a crítica que se fazia ao tribunal era de que não tinha paralisado as obras do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (onde houve desvios de mais de R$ 170 milhões). O trabalho da Corte não tem nada a ver com a lentidão das obras públicas”, ressalta.

Oficialmente, o TCU disse que não se pronunciaria sobre o caso. Nos bastidores, entretanto, a declaração da presidente repercutiu mal entre os ministros. A avaliação é de que Dilma erra já na origem, ao afirmar que o tribunal é o responsável por determinar a paralisação dos empreendimentos. Os ministros lembram que o TCU apenas faz a recomendação ao Congresso, a quem compete suspender a execução das obras. “O TCU somente cumpre a lei”, disse um ministro.

Memória

As críticas do petista

Em outubro de 2009, um ano antes de deixar o Palácio do Planalto, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu o tom das críticas ao Tribunal de Contas da União (TCU). À época, a Corte recomendou a paralisação de 15 obras federais em relatório enviado ao Congresso. Lula não se limitou a criticar a fiscalização do TCU e anunciou a ideia de criar um órgão “tecnicamente inatacável” para decidir sobre questões relativas à paralisação de obras por recomendação do tribunal. Ele disse ainda que seria preparada uma lista de “absurdos” que teriam sido cometidos pelo TCU e prometeu que esse seria um “legado” de sua gestão. A iniciativa não saiu do papel.

Quadro de bloqueio


Pela lei, desde 1997 o Tribunal de Contas da União tem que enviar ao Congresso Nacional antes da votação do Orçamento anual uma lista com obras com indícios de irregularidades graves. Com essa lista, chamada quadro de bloqueio, os parlamentares podem barrar a destinação de recursos do Orçamento para os projetos suspeitos, para evitar desvio de dinheiro público. Ao longo do tempo, o Parlamento vem flexibilizando a lei orçamentária para fazer com que menos obras se mantenham no quadro de bloqueio. Neste ano, o TCU encontrou irregularidades em 84 das 136 obras fiscalizadas, mas recomendou a paralisação de apenas sete delas.