Entre eles, destaque para a mudança do indexador usado na correção da dívida de estados e municípios com a União para reduzir os débitos, os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para as empresas com risco de não quitação de débitos pelo baixo crescimento econômico e a autorização para que cidades inadimplentes recebam recursos para obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o orçamento impositivo. "O risco Brasil aumentou, nossa avaliação internacional vai cair. A bomba já explodiu", afirma o ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento Raul Velloso.
As atuais regras das dívidas haviam sido negociadas durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sempre resistiu em mudar o indexador. A corda estourou no colo de Dilma. "Era necessário fazer essa alteração. Só acho que poderia ter sido cobrada uma contrapartida mais firme de estados e municípios nessa negociação", declarou o secretário-geral do PT, Paulo Teixeira (SP).
Críticos do governo Dilma afirmam que, no afã de garantir a própria reeleição, ela está colocando em risco os pressupostos de estabilidade econômica conquistados nos últimos anos. "O cenário é extremamente perigoso e, o que é pior: você não consegue enxergar sinais de que o governo esteja preocupado em corrigir os rumos", disse Alberto Goldman, vice-presidente do PSDB e ex-governador de São Paulo.
Goldman, que já foi deputado federal, não se espanta com os movimentos do Congresso em apoiar a aprovação de projetos explosivos que podem impactar em até R$ 60 bilhões as contas públicas, como a PEC 300, que equipara salários de policiais e bombeiros aos profissionais do Distrito Federal e a definição do piso nacional salarial dos agentes comunitários de saúde, entre outros. "Normalmente, o Congresso é mais irresponsável que o Executivo. Mas, ao ver que o Planalto e a equipe econômica liberaram as rédeas, os congressistas se viram no direito de fazer o mesmo", afirmou o tucano.
Bumerangue
A própria política de empréstimos do BNDES às empresas, especialmente no período da crise internacional, pode criar um efeito bumerangue, impedindo os resultados positivos da medida. Como a economia não cresce, as empresas não obtêm retorno dos investimentos e ficará cada vez mais difícil que elas paguem os empréstimos contraídos. O caso do empresário Eike Batista é clássico: ele deve R$ 10,4 bilhões ao BNDES, um montante que representa 50% do orçamento destinado ao Bolsa-Família. "O Eike é o exemplo mais bem-acabado do capitalismo do PT", criticou o líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque (RS).
Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, há brechas para que o dinheiro dos cofres federais saia e tenha como destino municípios inadimplentes, por exemplo. Segundo ele, as prefeituras endividadas seguem recebendo recursos da União. "A Lei de Responsabilidade Fiscal deixou de ser uma trava para os prefeitos corruptos. Antigamente, eles eram até mal vistos pelos moradores da cidade, porque o município ficava impedido de receber dinheiro da União. Agora, não. Os prefeitos recebem recursos expressivos, mesmo estando inadimplentes", afirma.
Procurados pela reportagem, o Ministério do Planejamento e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) defenderam a atuação do governo. A assessoria de comunicação da STN afirmou que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) "é rigorosamente seguida" pelo Poder Executivo. Já a pasta chefiada pela ministra Miriam Belchior informou que todos os repasses voluntários obedecem à legislação em vigor, "em especial o artigo 25 da LRF". O artigo trata de critérios para as transferências. O ministério garantiu que o governo não libera verbas de forma voluntária a entes inadimplentes. Em relação aos empreendimentos do PAC que recebem recursos classificados como transferências obrigatórias, a assessoria ressalta que o mecanismo se baseia na Lei 11.578/2007.
Você se lembra?
"O primeiro pacto é pela responsabilidade fiscal, para garantir a estabilidade da economia e o controle da inflação. Este é um pacto perene de todos nós. É uma dimensão especialmente importante no momento atual, quando a prolongada crise econômica mundial ainda castiga todas as nações"
Trecho do discurso da presidente Dilma Rousseff em 24 de junho, convocando governadores e prefeitos para economia de gastos públicos
TCU rebate crítica e aponta gestão falha
Brasília – O Tribunal de Contas da União (TCU) emitiu ontem nota de esclarecimento sobre as críticas feitas pela presidente Dilma Rousseff à recomendação do órgão de que sejam bloqueados os recursos destinados a sete obras pelo país devido a irregularidades graves. O órgão destacou que cabe ao Congresso a decisão sobre o bloqueio de recursos e lembrou ainda que já convidou as três esferas do Executivo para discutir um projeto de governança que melhore a gestão dos projetos públicos, que considera falha.
Dilma disse em entrevista na sexta-feira que considera "um absurdo paralisar obras no Brasil". Na nota, o TCU diz que cumpre seu papel fiscalizador da aplicação dos recursos públicos federais, definido na Constituição Federal e determinado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). "Consciente do impacto que as obras têm no crescimento do país, o TCU oferece parecer técnico com a situação das obras públicas executadas com recursos federais e as irregularidades identificadas, cabendo ao Congresso Nacional decidir sobre a paralisação efetiva", diz o órgão.
O tribunal cita como exemplo as recomendações sobre a obra da BR-448, no Rio Grande do Sul, em que foram encontrados indícios de superfaturamento, na ordem de R$ 90 milhões. "Cabe à Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional deliberar sobre a paralisação ou não da referida obra", diz a nota do TCU, que destaca sua atuação preventiva, "abrindo em todos os casos canais de diálogo com os gestores responsáveis". Segundo o TCU, as recomendações do órgão podem gerar economia de R$ 1,2 bilhão aos cofres públicos no próximo ano, "casos todas as correções sejam realizadas".
Na nota, a Corte lembra ainda que convidou gestores do Executivo das três esferas – União, estados e municípios – para um projeto de governança, com a duração de três anos, para melhorar a gestão da administração pública. "Trata-se de um projeto em parceria com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e outros 12 países, na busca por melhores práticas para a administração", explica o TCU.
"Auditoria realizada em 360 instituições públicas, a ser levada a Plenário ainda em novembro de 2013, evidenciou a falta de governança de pessoal, com graves deficiências na área de planejamento e treinamento. Por essas razões, o TCU entende que melhorar a governança representará um grande avanço para o desenvolvimento do Brasil", diz a nota.