Nas primeiras 24 horas de prisão dos sete condenados do esquema do mensalão que se apresentaram à Superintendência da Polícia Federal em Belo Horizonte, os réus foram alvo de vaias e xingamentos por populares. Alguns chegaram a atirar pedras contra a van que os transportou após o exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML). Ao longo do trajeto entre o IML e o aeroporto da Pampulha – onde embarcaram para Brasília – motoristas buzinaram comemorando a prisão. Na chegada da van ao terminal, dezenas de pessoas receberam os condenados aos gritos de “ladrão, ladrão” e “devolve meu dinheiro”.
Estava previsto que a transferência dos mensaleiros da sede da PF para o IML se iniciasse às 11h de ontem, mas, devido ao atraso da saída do avião da PF da capital federal rumo a São Paulo e depois Belo Horizonte, somente às 13h03 os condenados deixaram a sede da PF numa van. Escoltada por duas caminhonetes com cinco policiais em cada, o veículo demorou 12 minutos até o Bairro Gameleira.
Já no IML, os presos passaram pelo exame de corpo de delito. Na chegada, Marcos Valério se indignou com os agentes da PF, acusando-os de expô-los à imprensa e à população. “Incompetência total”, reclamou. Incomodado por estar sendo filmado, o empresário ainda deu um tapa na mão do produtor de uma rede de TV que registrava o trajeto no segundo andar do IML.
Os exames de corpo de delito dos sete foram concluídos em 30 minutos. Mas, com os moradores do bairro inflamados, a van teve dificuldade para sair do local. Aos berros, um grupo de cerca de 100 pessoas, formado principalmente por adolescentes, impediu a saída do veículo. Quando finalmente o comboio conseguiu deixar o local, os populares avançaram contra a van atirando objetos, esmurrando as janelas e xingando os sete condenados.
Outros 12 minutos foram suficientes para a van se deslocar até o aeroporto. Pelo caminho, motoristas aplaudiam e buzinavam, enquanto uns gritaram “acorda Brasil!”. O auxiliar de transportes Alan Jeferson Rolando, de 31 anos, acompanhou todo o trajeto do cortejo. Enquanto dirigia ele erguia o punho cerrado para repetir o gesto do movimento dos Panteras Negras, ironizando o gesto usado pelos petistas José Dirceu e José Genoino ao se entregar em São Paulo. “Sinto um alívio. Mesmo que só 1% dos que merecem vão para a cadeia é um sinal de que a justiça está sendo feita”, entende.
No aeroporto Os sete presos foram levados para um setor isolado do aeroporto da Pampulha de responsabilidade da Infraero. Até o embarque, no entanto, tiveram que esperar quase uma hora. A aeronave que vinha de São Paulo com José Genoino e José Dirceu demorou para decolar. No trajeto de São Paulo a BH, Genoino se sentiu mal e foi atendido no aeroporto. Foi a primeira vez que ele viajou de avião desde que passou por uma cirurgia no coração. Uma ambulância estacionou ao lado da aeronave, mas o ex-presidente do PT não desembarcou. O procedimento atrasou o embarque.
O avião pousou às 15h20, mas ficou parado mais de uma hora na pista devido ao atendimento médico. Durante esse intervalo no aeroporto, mais manifestação. O principal alvo foi Marcos Valério, que usava uma camisa vermelha. Sempre que avistado era ofendido com palavrões. Durante a espera no aeroporto os condenados puderam ser vistos várias vezes, principalmente quando iam ao banheiro. Eles entraram um a um, escoltados por agentes da PF. Quando a aeronave finalmente decolou, a plateia vibrou.
Duas celas para sete
O primeiro ato dos condenados no processo do mensalão ao chegar à sede da Polícia Federal, no Bairro Gutierrez, na noite do feriado de sexta-feira, foi receber o auto de prisão. Em uma sala perto das celas onde ficariam até a autorização da transferência para Brasília, um delegado notificava cada condenado. Assinada, uma cópia lhes era entregue e o preso encaminhado para a cela. Com a autorização da PF, parentes puderam também levar alimentos. À noite, eles comeram frutas e biscoitos e beberam sucos, segundo relatos de agentes federais.
Os cinco homens presos dividiram as duas celas disponíveis na unidade e as duas mulheres ocuparam uma sala improvisada. Cristiano Paz compartilhou um espaço de cerca de três metros de largura por dois metros de comprimento, com apenas um beliche, com o advogado Ramon Hollerbach, seu antigo sócio. Na outra ficaram Marcos Valério, o ex-deputado Romeu Queiroz e José Roberto Salgado, ex-diretor do Banco Rural. Um dos três dormiu no chão, em um colchonete. Simone Vasconcelos e Kátia Rabello ocuparam outro setor do prédio. Por todo o tempo, um agente foi designado para a vigia das celas para monitorar os presos. Para ir ao banheiro, localizado fora da cela, era preciso solicitar aos agentes.
Devido ao horário de chegada do último dos condenados, às 22h45, e à movimentação, somada ao estresse gerado pela prisão, nenhum dos presos teve tranquilidade para dormir. A chegada de agentes responsáveis pela apreensão de 200 quilos de pasta base de cocaína faltando pouco para meia-noite aumentou o tumulto na sede da PF. Somente às 2h a unidade silenciou.
Ao amanhecer, a partir de 8h, a todo momento chegavam amigos e familiares com objetos pessoais e sacolas contendo garrafas de suco, barrinhas de cereal e outros alimentos. Enquanto isso, alguns dos advogados criminalistas mais renomados do estado iam acompanhar a situação de seus clientes à espera de informações sobre a transferência para Brasília. “Dentro do possível ele está tranquilo. Se eu não consegui dormir, imagino que eles tenham tido dificuldade”, disse, pela manhã, o advogado de Hollerbach, Hermes Vilchez Guerreiro.
O advogado deve impetrar o pedido de habeas corpus em favor de seu cliente. Ele critica a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, de ter incluído Ramon na lista dos reús que foram presos imediatamente depois do julgamento da primeira fase de recursos. O advogado disse ter faltado critério para o ministro na seleção de quem deveria cumprir a pena. “Poderia ter prendido quem estaria no regime fechado. Mas não. Tem preso que está no semiaberto, enquanto teve gente na mesma situação que não foi presa”, diz. Os demais advogados aguardam ter acesso à decisão do ministro para avaliar a possibilidade de pedir a soltura e também para solicitar a transferência dos presos para as cadeias próximos de suas residências.
A lista dos presos
Veja a situação* de cada um dos condenados que se encontram sob custódia da Polícia Federal e do único réu que está foragido
REGIME INICIAL FECHADO
Marcos Valério
Empresário
Pena total: 40 anos, 4 meses e 6 dias
Crimes: corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha
Multa: R$ 3,06 milhões
Cristiano Paz
Publicitário
Pena total: 25 anos, 11 meses e 20 dias
Crimes: corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha
Multa: R$ 2,53 milhões
Kátia Rabello
Ex-presidente do Banco Rural
Pena total: 16 anos e 8 meses
Crimes: lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas e formação de quadrilha
Multa: R$ 1,5 milhão
José Roberto Salgado
Ex-executivo do Banco Rural
Pena total: 16 anos e 8 meses
Crimes: lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas e formação de quadrilha
Multa: R$ 1 milhão
Ramon Hollerbach
Publicitário
Pena total: 29 anos, 7 meses e 20 dias
Crimes: corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha
Multa: R$ 2,79 milhões
Henrique Pizzolato (FORAGIDO)
Ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil
Pena total: 12 anos e 7 meses
Crimes: corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato
Multa: R$ 1,316 milhão
REGIME INICIAL SEMIABERTO
José Dirceu
Ex-ministro da Casa Civil
Pena total: 10 anos e 10 meses
Crimes: corrupção ativa e formação de quadrilha
Multa: R$ 676 mil
José Genoino
Deputado federal (PT-SP)
Pena total: 6 anos e 11 meses
Crimes: corrupção ativa e formação de quadrilha
Multa: R$ 468 mil
Delúbio Soares
Ex-tesoureiro do PT
Pena total: 8 anos e 11 meses
Crimes: corrupção ativa e formação de quadrilha
Multa: R$ 325 mil
Simone Vasconcelos
Ex-diretora financeira da SMP&B
Pena total: 12 anos, 7 meses e 20 dias
Crimes: corrupção ativa, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.
Multa: R$ 263,9 mil
Romeu Queiroz
Ex-deputado do PTB-MG
Pena total: 6 anos e 6 meses
Crimes: corrupção passiva e lavagem de
dinheiro
Multa: R$ 828 mil
Jacinto Lamas
Ex-assessor parlamentar do extinto PL
Pena total: 5 anos
Crimes: lavagem
de dinheiro
Multa: R$ 260 mil