A queda de braço entre as polícias e os ministérios públicos Federal e Estadual em torno do poder de investigação criminal parece não ter fim. A recém-aprovada Lei 12.830 – que nem sequer completou seis meses de sanção presidencial e garante que o inquérito é ato de responsabilidade do delegado de polícia – já é alvo de duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adin), uma delas proposta pela Procuradoria Geral da República. Um dos pontos questionados é logo o primeiro artigo da legislação, que induz, segundo o Ministério Público Federal, à interpretação de que a condução de qualquer procedimento investigatório de natureza criminal é atribuição exclusiva do delegado de polícia. Uma questão que parecia ter sido resolvida com a rejeição pelo Congresso Nacional da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37, que cassava dos membros do MP o direito de investigação criminal.
Criminosos O tom do debate, no entanto, sobe mesmo quando o foco recai sobre o poder de investigação das duas instituições. O presidente da Associação dos Procuradores da República (ANPR), Alexandre Camacho, fala sem meias palavras que a tese de que o inquérito é ato dos delegados de polícia só tem um único beneficiário: os criminosos. “A sociedade pede um esforço maior para debelar a corrupção, a lavagem de dinheiro e outros crimes. Cassar o direito de investigação criminal de outras entidades favorece a criminalidade e fragiliza a punição”, diz Camacho. Ele explica ainda que jurisprudências do Supremo já reconhecem a legitimidade das investigações criminais pelo Ministério Público. “No caso do deputado federal Bernardo de Vasconcelos (PR-MG), denunciado pelo MP por crime tributário, a ação penal foi aceita por unanimidade pelos ministros, apesar do argumento da ilegitimidade da apuração – uma das teses defendidas pela polícia na briga pela exclusividade da atividade”, afirmou.
O presidente da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Marcos Leôncio Ribeiro, diz que essa Adin é “chover no molhado”. Esclarece que já existem várias outras ações no STF que analisam a mesma questão, entre elas, o direito de investigar do MP questionado pela Advocacia Geral da União, que ainda não teve uma decisão. “O que o Ministério Público quer é que a Corte decida que a investigação criminal não é exclusividade do delegado. É apenas reafirmar o poder de investigação criminal dos promotores e procuradores”, diz Leôncio.
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PEC 37
Projeto de emenda à Constituição que, se aprovado, limitaria o poder de investigação criminal a polícias federais e civis, retirando-o, entre outras instituições, do Ministério Público (MP). Seu autor foi o deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA). Integrantes do MP o entenderam como uma retaliação à sua atuação no combate à corrupção e apelidou a iniciativa de PEC da Impunidade. Em contrapartida, as polícias passaram a chamar a medida de PEC da Legalidade, sob a alegação de que não existem regras para os inquérito conduzidos pelos promotores e procuradores. No rastro das manifestações por melhores condições na saúde, educação, transporte e maior combate à corrupção, que tomaram as ruas do país, em junho, durante a Copa das Confederações, a recusa da PEC 37 foi incorporada como uma reivindicação popular. De ressaca ainda pela rejeição dos manifestantes, o Congresso arquivou o projeto em 25 de junho, com o voto de 430 dos 513 deputados.