Empresário ligado ao PT, Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, conhecido como Bené, contratou a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra para defendê-lo em processos no Tribunal de Contas da União nos quais é suspeito de superfaturamento em serviços prestados ao governo federal. Bené ganhou notoriedade em 2010 ao ajudar a pagar o aluguel de uma casa em Brasília onde funcionou um núcleo da pré-campanha de Dilma Rousseff. Ele é dono de empresas que já receberam R$ 272 milhões das gestões petistas no Palácio do Planalto.
Em um dos processos o tribunal pede que a empresa devolva aos cofres públicos R$ 1,8 milhão, ou 32% dos gastos em 2009 na 3.ª Conferência de Agricultura e Pesca, do Ministério da Pesca. O processo só aguarda um parecer do Ministério Público e análise da relatora, Ana Arraes, para ser levado a plenário. Nele, a área técnica do tribunal rejeita os argumentos da Due e dos demais responsáveis pelo evento.
Sem fazer
Segundo o relatório do TCU, ao menos R$ 809 mil em serviços que não foram prestados acabaram pagos à Due de Bené. Além disso, foi apurado superfaturamento de até 750% em itens do contrato. O aluguel de uma toalha de mesa, por exemplo, custou R$ 63 por dia ante os R$ 7,40 cobrados, em média, no mercado.
O ex-ministro da Pesca Altemir Gregolin é um dos cobrados a devolver recursos por suspeita de autorizar de forma ilegal três prorrogações de contrato com a empresa - a última delas aumentou em 100% o valor.
Em outro caso com atuação da banca de Erenice, o tribunal atribui à Due responsabilidade pelo superfaturamento de contrato com o Ministério das Cidades para vários eventos entre 2007 e 2009. Numa decisão de 2012, determina a abertura de uma tomada de contas especial (TCE) e impõe à empresa e a outros envolvidos a devolução de R$ 2,7 milhões. Ainda cabe recurso. Também nesse caso, o TCU requer o ressarcimento dos recursos.
Em outros quatro casos em curso, o tribunal investiga o mesmo padrão de irregularidades em órgãos como a Secretaria de Promoção de Igualdade Racial, o Ministério do Turismo, o Instituto Chico Mendes e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Parte dos problemas foi identificada pelos próprios ministérios e pela Controladoria-Geral da União (CGU) na época em que Erenice era uma dos principais autoridades no Planalto. A CGU registra que, nas Cidades, a empresa recebeu até pelo aluguel de cadeiras para evento realizado em auditório com poltronas fixas. Bené nega haver desvios.
A ex-ministra fez do TCU um de seus principais campos de atuação depois de afastada da Casa Civil sob suspeita de tráfico de influência envolvendo um de seus filhos. Conforme o Estado revelou em outubro do ano passado, ela visita ministros da corte em agendas não registradas.
Questionada, se recusa a falar sobre os trabalhos. Só nas duas últimas semanas, foram dois encontros no gabinete de José Múcio, relator de um processo de interesse da Gráfica Brasil - empresa da família de Bené, dono da Due, que recebeu R$ 204 milhões da União de 2004 a 2013.
Nos bastidores, a discreta atividade da ex-ministra rende comparação com um medalhão da advocacia na capital federal. “Ela é o Kakay do TCU. Se você quer resolver algo por lá, contrate-a” diz uma fonte ligada a Bené, referindo-se a Antônio Carlos de Almeida Castro, requisitado advogado de políticos.
A Due é a antiga Dialog, que mudou de razão social após se envolver em irregularidades. A exemplo da Gráfica Brasil, ascendeu rapidamente no governo Lula. Além de Bené, é sócio da empresa o filho dele, Paulo Eduardo Pitrez, de 19 anos, nomeado no fim de 2012 assessor do deputado Gabriel Guimarães (PT-MG) - o salário, de R$ 12.940, é o maior do gabinete. O congressista é filho do ex-deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), que introduziu Bené nos círculos petistas.