Em agosto, quando assumiu o Ministério das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo encontrou a pasta em meio a uma de suas piores crises na última década e uma presidente da República cuja má vontade com a diplomacia era notória. De lá para cá, o embaixador conseguiu resolver parte dos impasses e um feito: hoje é um dos poucos ministros ouvidos com atenção por Dilma Rousseff. Se os rumos da diplomacia brasileira não tiveram mudanças perceptíveis, a relação entre os Palácios do Planalto e do Itamaraty foi radicalmente alterada.
Figueiredo foi chamado da embaixada nas Nações Unidas para tocar um Itamaraty dividido após a atuação do diplomata Eduardo Saboia que decidira por conta própria tirar da embaixada em La Paz o senador boliviano Roger Pinto Molina. Desde o convite para assumir a pasta, o ministro se deu como prazo no cargo o fim de 2014. Nesse período, suas principais missões seriam encerrar algumas questões pendentes da diplomacia brasileira e fazer mudanças internas no Itamaraty.
Na conta positiva, o chanceler coloca pelo menos três questões: a volta do Paraguai ao Mercosul, que deve ser formalizada neste mês, com o país assumindo a presidência, em reunião de cúpula em Caracas (Venezuela), pondo fim à maior crise política do bloco. A segunda, a solução, em parceria com o Uruguai, das eleições parlamentares haitianas, até então sem prazo para ocorrer e com um Congresso à beira da paralisia.
A última, ainda em aberto, é o início das negociações para o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. Os países do bloco sul-americano conseguiram fechar a proposta que vai abrir as conversas com os europeus. Será a primeira vez, desde o enterro da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), em 2005, que o Brasil volta a tratar seriamente, com um parceiro de peso, de um acordo comercial.
Impasses
Figueiredo, porém, não conseguiu solucionar as duas maiores crises diplomáticas de 2013. A primeira é interna. A atuação de Saboia no caso Pinto Molina dividiu o ministério entre os que o criticavam pela quebra de hierarquia, tão cara aos diplomatas - e que levou à demissão de Antonio Patriota - e os que o tratavam como herói.
Saboia voltou ao Brasil, trabalha normalmente em um dos departamentos do Itamaraty, mas enfrenta um processo administrativo interno. A embaixada brasileira na Bolívia continua vaga, já que a Comissão de Relações Exteriores do Senado, que precisa aprovar a indicação de Raymundo Magno, recusa-se a fazê-lo enquanto não souber o destino de Saboia e de Pinto Molina.
O ministro tampouco obteve sucesso no encerramento da crise com os Estados Unidos, após a revelação das espionagens feitas pela Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês). Apesar do anúncio de que procedimentos do órgão serão revistos, o Brasil espera as explicações detalhadas prometidas a Dilma por Barack Obama.
Prazo
A boa relação com Dilma possivelmente estenderá o prazo de Figueiredo à frente do Itamaraty, em caso de reeleição. Assim, o ministro teria mais tempo para levar adiante as mudanças internas que começou. Entre elas, a decisão de eliminar da diplomacia brasileira os últimos resquícios de um discurso mais ideológico, à esquerda, do que estratégico - crítica constante desde a passagem de Celso Amorim, no governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Em uma de suas primeiras ações, Figueiredo abriu conversas com a Alemanha sobre tecnologias de segurança na internet para combater possíveis novas espionagens. Encontrou narizes torcidos para o contato com um membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), vista como inimiga pelos governos mais à esquerda na América Latina. A ordem, no entanto, é prosseguir.
Também fez uma análise de gestão e não gostou do que viu: áreas sobrepostas, departamentos mais prestigiados com excesso de gente e outros, teoricamente menos interessantes, esvaziados. Na área de Direitos Humanos, já pediu que sejam preenchidas vagas vazias há bastante tempo.
Uma das mudanças determinadas por Patriota foi eliminada. A criação de uma secretaria de relação com a sociedade civil foi trocada por um trabalho integrado de todas as áreas. O Itamaraty prepara um “livro branco da diplomacia”, com itens como modelos de cooperação, plano de carreira e estrutura, com debates sobre o assunto previstos para meados deste ano.