A pedido do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), o Ministério Público Federal no Mato Grosso investiga uma fraude que pode chegar a R$ 700 milhões e envolve uma empresa do prefeito de Cuiabá, Mauro Mendes (PSB). Ele e um sócio são investigados, em processo sob sigilo, por terem se beneficiado do que o juiz do Trabalho Paulo Roberto Brescovici chamou de “fraude processual” na compra de uma mineradora.
Luis Aparecido Ferreira Torres, o juiz afastado, permitiu em 2011 a transferência das cotas da mineradora, que então se chamava Minérios Salomão, para uma empresa cuja dona era Jéssica Cristina de Souza, filha de Valdinei Mauro de Souza, sócio do prefeito de Cuiabá. Seis meses após se tornar dona da empresa, Jéssica transferiu 98% das cotas para a Maney Mineradora Casa de Pedra, que pertence a seu pai e a Mendes.
O processo foi marcado por uma série de irregularidades e possíveis “ilícitos penais”, de acordo com Brescovici, o juiz que investigou o caso no âmbito do TRT. Um dos problemas apontados foi a transferência das cotas da mineradora a Jéssica pelo valor de R$ 1,8 milhão.
Segundo Brescovici, o juiz Ferreira Torres “desconsiderou o potencial econômico das reservas auríferas e recursos naturais da área de propriedade da empresa que, de acordo com o laudo técnico de f. 610/620, foi fixado em R$ 723,7 milhões”.
O capital social da mineradora seria posteriormente elevado para R$ 703,5 milhões.
Corretor. Brescovici também descobriu uma autorização dada por Ferreira Torres para que a Caixa Econômica Federal liberasse R$ 185 mil a título de corretagem para um corretor de imóveis de nome José Faria de Oliveira, sem que ele tenha atuado em nenhum momento no processo de venda da mineradora ou de seus ativos.
Ferreira Torres apresentaria posteriormente um despacho de nomeação do corretor, mas ele não continha a numeração das folhas dos autos, o que mostrava que o suposto documento nunca pertenceu ao processo.
Oliveira havia intermediado a compra de dois flats, vendidos por uma construtora ao juiz. Em depoimento na investigação do TRT, o corretor disse que foi chamado ao gabinete de Ferreira Torres e que ele propôs transferir para seu nome os dois imóveis, sem explicar o motivo. Oliveira recusou a proposta.
Segundo o corretor, o juiz lhe perguntou se ele havia sido procurado por alguém do TRT e orientou Oliveira a dizer que havia recebido os R$ 185 mil sob suspeita a título de corretagem. Mais uma vez, ele se recusou a atender o pedido de Ferreira Torres e decidiu procurar a corregedoria do tribunal, que a partir daí passou a investigar o caso.
'Totalmente legal'
A Prefeitura de Cuiabá afirmou, em nota assinada pelo secretário de comunicação, Kléber Lima, que “Mauro Mendes não é parte no processo trabalhista e jamais foi chamado aos autos”. Também disse que o prefeito não é investigado pelo Ministério Público Federal - o MPF, porém, confirma que há uma apuração sigilosa sobre o caso.
Lima afirmou que a transferência das cotas para o prefeito em janeiro de 2012 foi “uma transação totalmente legal”. O secretário reiterou que, quando se tornou sócio da empresa, Mendes não era prefeito de Cuiabá.
Lima ainda questionou a rapidez com que o juiz Paulo Roberto Brescovici proferiu sua decisão. “O juiz citado recebeu uma ação anulatória às 14h34 do dia 30 de agosto de 2012 e expediu sua decisão de 30 laudas às 15h07 do mesmo dia. Ou seja, em exatos 33 minutos ele exarou uma decisão.”
Também em nota, a advogada do juiz Luis Aparecido Ferreira Torres, Fabiana Curi, afirmou que os R$ 185 mil que teriam sido desviados pelo juiz eram valores devidos “em razão de haver sido deferida, inicialmente, a expropriação, na modalidade de alienação”. “O corretor de imóveis José Faria de Oliveira estava credenciado no TRT e fora chamado para intermediar a venda, razão pela qual fora expedido o valor a título de corretagem.”
A advogada também disse que o depoimento de Faria “é totalmente desprovido de verdade, não trazendo consigo nenhum elemento mínimo probatório e isso será comprovado”. Fabiana sustentou que a hipótese de subavaliação em função do laudo que atribuía um valor de mais de R$ 700 milhões à empresa “não é verídica, pois este laudo foi expedido em 1999 e o potencial econômico era para os próximos três anos, ou seja, até 2002”.