Brasília – A geração dos protestos de junho vai às urnas pela primeira vez em outubro. Cerca de 11 milhões de adolescentes entre 16 e 20 anos que tiveram papel decisivo no movimento que tomou as ruas do país no ano passado vão estrear nas eleições. São jovens como os estudantes Aníbal Londe, de 16 anos, e Ian Viana, de 18, que ainda não tinham vivenciado a atuação política e agora, com o título de eleitor em mãos, poderão ajudar a colocar em prática as transformações que reivindicaram. Atrair esse público será um dos grandes desafios dos candidatos, principalmente aos postulantes ao Planalto, que já afinam o discurso para se aproximar do grupo que corresponde a pelo menos 10% do eleitorado e será determinante no resultado.
Segundo números do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a média de novos votantes entre 16 e 18 anos no país tem sido de 2 milhões a cada pleito e neste ano já está garantido quase 1 milhão — o cadastramento só será encerrado em maio. A média dos demais adolescentes ainda no início da vida democraticamente ativa, entre 18 e 20 anos, é de 9 milhões. Se mantiverem a média de 11 milhões, juntos eles poderão contribuir para a vitória ou derrota de um candidato: em 2010, a diferença entre a presidente Dilma Rousseff e o segundo colocado, José Serra, ficou em 12 milhões de votos. E as manifestações podem ter ajudado a engordar esse número.
Ele integra o grupo de 65% dos jovens brasileiros que, de acordo com pesquisa da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), mesmo tendo voto facultativo, tiraram o título de eleitor ou pretendiam fazê-lo a tempo de votar este ano. O levantamento com cerca de 3 mil jovens entre 15 e 29 anos de todo o país foi feito em maio do ano passado, publicado em agosto e atualizado em dezembro. O estudo indicou também que 83% dos jovens brasileiros consideram a política mais ou menos ou muito importante e 91% acreditam poder mudar o mundo.
NAS REDES A pesquisa do órgão da Presidência da República em parceria com a Unesco apontou ainda que os jovens não veem só nas urnas a chance de contribuir com o país. Muitos apostam as fichas em movimentos organizados e em debates na internet. As instituições oficiais, no entanto, levam a pior: 88% deles disseram que não são nem querem ser vinculados a partidos políticos.
Ian Viana se enquadra nesses grupos. Ele criou o grêmio estudantil da escola em que estudava, organizando debates sobre temas como desigualdade social. Porém, ainda se sentia mal ao ver a falta de interesse político dos colegas. “Só fiquei animado quando estourou aquele boom dos protestos ano passado e pessoas que nunca ouviram falar de política começaram a debater sobre isso nas redes sociais”, empolga-se.
Foi dele a ideia de reproduzir em Brasília a primeira manifestação de apoio aos ativistas que apanharam da polícia em São Paulo, no início de junho de 2013. Para o evento, marcado pelo Facebook por ele e uma amiga, eram esperados apenas os colegas mais próximos, mas compareceram cerca de 10 mil pessoas. “Naqueles dias de protestos houve um suspiro de que política é mais que dar voto. Ela é feita nas ruas ou no lugar que a gente estuda.”
Para a secretária nacional de Juventude, Severine Macedo, os episódios de 2013 devem dar as rédeas do comportamento desta geração neste ano. “O levantamento e as manifestações do ano passado desmistificam a ideia de que esta geração é apática, eles se mobilizam sim, mas de outras maneiras, e não se preocupam só com suas próprias pautas”, comenta. Por causa da força de organização que a juventude adquiriu, essa faixa etária deverá ser amplamente visada pelos candidatos, segundo ela. “Espero de fato que o tema apareça melhor, pautando-se por uma perspectiva de autonomia e inclusão social desses jovens, permitindo-lhes trabalhar, estudar, ter lazer, o que garante o desenvolvimento do próprio país”.
Mobilização nos partidos
As chapas presidenciais que devem entrar na disputa deste ano já colocaram em campo estratégias específicas para se aproximar da geração de novos eleitores que chegam às urnas com a bagagem dos protestos do ano passado. Esse movimento tem ficado cada vez mais claro. A contratação, feita pelo comando das três principais campanhas, de equipes específicas para cuidar de mídias digitais e o envolvimento mais efetivo de cada um deles no Facebook e no Twitter revelam essa preocupação.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello, destaca que despertar no jovem a necessidade de participação democrática pode ser a solução para que essa faixa etária faça a diferença no resultado de outubro. Segundo ele, o tribunal fará uma campanha nacional em fevereiro para incentivar adolescentes entre 16 e 18 anos a tirarem o título de eleitor. “Vamos centrar nossas baterias neles para incentivar a crença de que atuarão ativamente na escolha de seus representantes, o que repercutirá também em suas vidas”, afirma o ministro.
Para o presidente do TSE, “os jovens precisam entender que, se estamos insatisfeitos com algo no país, o local correto para o protesto de excelência é a urna, porque a sociedade não é vítima, mas a autora responsável pelos maus políticos que tem”.