Jornal Estado de Minas

Dinheiro fica retido por falta de projetos dos estados e municípios

Pelo menos R$ 4 bi retornaram aos cofres da União desde 2008 porque estados e municípios não conseguiram apresentar projetos para garantir recursos

Paulo de Tarso Lyra
- Foto: Brasília – A nove meses das eleições em que serão escolhidos o presidente da República e os governadores, o país depara-se novamente com um problema que tem se tornado crônico: a falta de capacidade dos governos estaduais e municipais para elaborar projetos que promovam o desenvolvimento ou que resolvam problemas simples, como as enchentes que se sucedem ano após ano. Uma consulta feita pelo Estado de Minas em três pastas (Turismo, Cidades e Justiça) mostrou que, entre 2008 e 2012, quase R$ 4 bilhões disponibilizados pelo governo federal a governadores e prefeitos voltaram aos cofres do Tesouro Nacional porque os demais entes federados tiveram problemas técnicos e não apresentaram propostas para aplicar esses recursos.


Esse montante representa 20% do orçamento anual do Bolsa-Família, o programa de transferência de renda do governo federal e um dos principais sustentáculos do êxito petista nas urnas na última década. E os problemas que levam ao bloqueio dessas verbas são múltiplos. À eterna burocracia, que exige um amontoado de papéis e rubricas oficiais para justificar a liberação das verbas, somam-se a falta de pessoal preparado em municípios mais carentes — justamente aqueles mais dependentes de obras e de recursos públicos —, a ausência de diálogo entre a União e os demais entes federados, a falta de licenciamentos ambientais ou problemas para elaboração das licitações.
Essas questões geram desgastes para os governantes e transtornos para os cidadãos e eleitores: cidades que sofrem com sucessivas enchentes; falta de segurança pública e presídios superlotados; ausência de pontos turísticos adequados e áreas para a prática de esporte e lazer; estrangulamento na mobilidade e ausência de moradias para atender o crescimento da população. E fazem com que, muitas vezes, prefeitos e governadores fiquem reféns de empresas, nem sempre confiáveis, que se apresentam para fazer os projetos e cobrar preços exorbitantes aproveitando-se da emergência da situação.

Convidado a dar uma palestra em um seminário sobre governança patrocinado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o vice-presidente do Senado, o ex-governador do Acre Jorge Viana (PT), afirmou que o Brasil está muito atrás de outros locais do mundo, nos quais os projetos andam mesmo quando os governantes são ruins. “Aqui nós ainda ficamos muito dependentes de um ou outro nome de destaque para trazer um novo fôlego para a administração. Mas a grande maioria das cidades enfrenta problemas”, reconheceu.

Para o ex-presidente do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) Antonio Augusto de Queiroz, o governo federal deveria dar um auxílio mais direto aos prefeitos. “Da mesma maneira que existe hoje uma força-tarefa para detectar irregularidades, a mesma coisa deveria ser feita para auxiliar na elaboração dos projetos”, defendeu. Isoladamente, isso já é feito em pastas como a Justiça e o Turismo. Nessa última, um esforço feito em janeiro de 2013 conseguiu reduzir a perda de R$ 400 milhões para R$ 68 milhões. Outros ainda estão pendentes e precisam ser regularizados até junho. Caso contrário, R$ 675 milhões deixarão de ser aplicados em um país que se prepara para receber a Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016.

DEMORA O presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, afirma que é muito simples para o governo federal jogar nas costas de governadores e prefeitos as dificuldades para a implantação de projetos. “Eles falam que não liberam os recursos porque não existem projetos. E por que não liberam as verbas para as obras que têm?” Ele diz que a União alardeia recursos para as obras da seca e prevenção, mas contingencia verbas. “Nos últimos 10 anos, só 20% dos recursos do Ministério da Integração para conter as enchentes dos rios foram liberados”, afirmou. Técnicos do TCU corroboram as queixas e lembram que o próprio Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), totalmente controlado pelo governo federal e que não sofre contingenciamento, ainda tem nível de execução bem aquém do esperado. Ziulkoski diz que R$ 25 bilhões distribuídos por 62 mil empenhos para prefeituras ficam retidos pela União, mesmo com projetos enviados.