O racha na principal Corte do país ficou ainda mais evidente nessa terça-feira quando o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e relator do processo do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, revogou três decisões de seu vice e revisor da mesma ação, ministro Ricardo Lewandowski, que ocupou sua cadeira durante as férias de janeiro. O foco da discórdia foi o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu – condenado a 10 anos e 10 meses de prisão como mentor do esquema de pagamento de propina a parlamentares no primeiro governo Lula –, beneficiado pelo ministro Lewandowski, que determinou que a Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal analisasse o pedido de trabalho externo apresentado pelo petista.
A determinação do revisor do processo do mensalão, de 29 de janeiro, apenas dois dias antes de ele deixar a presidência, contrariou decisão da Justiça do Distrito Federal, que paralisou a análise do pedido até que fosse apurada a suspeita de que Dirceu teria falado ao celular de dentro do Complexo Penitenciário da Papuda, o que é proibido. O presidiário teria conversado com um secretário de Estado da Bahia.
Ao desautorizar o ministro revisor do mensalão, que o substituiu de 22 a 31 de janeiro, Barbosa alegou que houve “atropelamento do devido processo legal”, porque Lewandowski não ouviu a Procuradoria Geral da República (PGR), antes de conceder o pedido da defesa do petista. “A decisão que determinou o exame imediato do pedido de trabalho externo do reeducando José Dirceu de Oliveira e Silva importou um atropelamento do devido processo legal, pois deixou de ouvir, previamente, o MPF e o juízo das execuções penais, cuja decisão foi sumariamente revogada. Considerada a inexistência de risco de perecimento do direito, não se justifica, processualmente, a concessão do pleito inaudita altera pars (sem ouvir a outra parte)", despachou Barbosa.
Ele determinou que seja dada vista ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, “para que indique as providências que entender cabíveis para o esclarecimento do ocorrido, bem como para que se manifeste sobre o pedido de trabalho externo formulado pelo apenado”. Ao recorrer ao Supremo contra a decisão da Justiça do Distrito Federal, a defesa de Dirceu argumentou que, embora a Vara de Execuções Penais seja responsável pela análise dos pedidos de trabalho, cabe à Corte referendar ou revogar as decisões tomadas.
Joaquim Barbosa ainda revogou duas liminares do colega, que liberavam o reajuste do Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU) em Caçador (SC) e em São José do Rio Preto (SP). Nesses casos, porém, o ministro foi provocado por recursos apresentados por associações das duas cidades. As prefeituras fizeram pedidos semelhantes contra decisões dos tribunais estaduais que barraram o reajuste. Lewandowski acolheu a alegação dos administradores municipais de que havia risco para finanças municipais e que a situação deveria ser decidida o quanto antes, em razão da data prevista para o início dos pagamentos.
Barbosa troca farpas com Lewandowski desde 2012, quando teve início o julgamento da Ação Penal 470. De maneira geral, ele adotou posições mais duras contra os réus e Lewandowski foi mais brando. O pior momento da disputa entre eles foi no ano passado, na reabertura do processo para julgamento dos embargos declaratórios (leia texto abaixo).
Dois pesos
Mesmo antes de retornar das férias, Barbosa causou mal-estar na Corte por criticar sua então substituta, ministra Cármen Lúcia, por não ter assinado o mandado de prisão contra o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP), que já estava com a sentença de mais de nove anos de prisão transitada em julgado. A ministra, que assumiu a Presidência da Corte durante parte das férias de Barbosa, alegou que alguns atos do processo são de competência exclusiva do relator.
O vice-presidente do STF optou ontem pelo silêncio sobre as decisões de Barbosa, enquanto o ministro Gilmar Mendes punha panos quentes, alegando ser natural que o presidente da Corte faça revisão em decisões tomadas durante o recesso.
TROCA DE FARPAS
Em agosto de 2013, o presidente do STF e relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, e seu vice e revisor da ação, Ricardo Lewandowski, protagonizaram um dos mais acirrados momentos da disputa entre os dois. A discussão ocorreu na abertura do julgamento dos embargos declaratórios dos 25 acusados no processo e levou ao encerramento da sessão. O revisro reivindicava mais prazo para analisar argumento de três réus e Barbosa reagiu irritado. Confira o diálogo abaixo:
Lewandowski
"Presidente, nós estamos com pressa de quê? Nós queremos fazer justiça.”
Barbosa
"Nós queremos fazer nosso trabalho. Fazer nosso trabalho e não chicana.”
Lewandowski
"Vossa Excelência está dizendo que eu estou fazendo chicana? Peço que Vossa Excelência se retrate imediatamente."
Barbosa
"Eu não vou me retratar, ministro."
Lewandowski
"Estou trazendo um argumento (...) apoiado em fatos. Apoiado em fatos, em doutrina. Eu não estou brincando, presidente. Vossa excelência está dizendo que estou brincando? Eu não admito isso (...). Vossa Excelência preside uma casa de tradição multicentenária."
Barbosa
"E que Vossa Excelência não respeita”
A determinação do revisor do processo do mensalão, de 29 de janeiro, apenas dois dias antes de ele deixar a presidência, contrariou decisão da Justiça do Distrito Federal, que paralisou a análise do pedido até que fosse apurada a suspeita de que Dirceu teria falado ao celular de dentro do Complexo Penitenciário da Papuda, o que é proibido. O presidiário teria conversado com um secretário de Estado da Bahia.
Ao desautorizar o ministro revisor do mensalão, que o substituiu de 22 a 31 de janeiro, Barbosa alegou que houve “atropelamento do devido processo legal”, porque Lewandowski não ouviu a Procuradoria Geral da República (PGR), antes de conceder o pedido da defesa do petista. “A decisão que determinou o exame imediato do pedido de trabalho externo do reeducando José Dirceu de Oliveira e Silva importou um atropelamento do devido processo legal, pois deixou de ouvir, previamente, o MPF e o juízo das execuções penais, cuja decisão foi sumariamente revogada. Considerada a inexistência de risco de perecimento do direito, não se justifica, processualmente, a concessão do pleito inaudita altera pars (sem ouvir a outra parte)", despachou Barbosa.
Ele determinou que seja dada vista ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, “para que indique as providências que entender cabíveis para o esclarecimento do ocorrido, bem como para que se manifeste sobre o pedido de trabalho externo formulado pelo apenado”. Ao recorrer ao Supremo contra a decisão da Justiça do Distrito Federal, a defesa de Dirceu argumentou que, embora a Vara de Execuções Penais seja responsável pela análise dos pedidos de trabalho, cabe à Corte referendar ou revogar as decisões tomadas.
Joaquim Barbosa ainda revogou duas liminares do colega, que liberavam o reajuste do Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU) em Caçador (SC) e em São José do Rio Preto (SP). Nesses casos, porém, o ministro foi provocado por recursos apresentados por associações das duas cidades. As prefeituras fizeram pedidos semelhantes contra decisões dos tribunais estaduais que barraram o reajuste. Lewandowski acolheu a alegação dos administradores municipais de que havia risco para finanças municipais e que a situação deveria ser decidida o quanto antes, em razão da data prevista para o início dos pagamentos.
Barbosa troca farpas com Lewandowski desde 2012, quando teve início o julgamento da Ação Penal 470. De maneira geral, ele adotou posições mais duras contra os réus e Lewandowski foi mais brando. O pior momento da disputa entre eles foi no ano passado, na reabertura do processo para julgamento dos embargos declaratórios (leia texto abaixo).
Dois pesos
Mesmo antes de retornar das férias, Barbosa causou mal-estar na Corte por criticar sua então substituta, ministra Cármen Lúcia, por não ter assinado o mandado de prisão contra o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP), que já estava com a sentença de mais de nove anos de prisão transitada em julgado. A ministra, que assumiu a Presidência da Corte durante parte das férias de Barbosa, alegou que alguns atos do processo são de competência exclusiva do relator.
O vice-presidente do STF optou ontem pelo silêncio sobre as decisões de Barbosa, enquanto o ministro Gilmar Mendes punha panos quentes, alegando ser natural que o presidente da Corte faça revisão em decisões tomadas durante o recesso.
TROCA DE FARPAS
Em agosto de 2013, o presidente do STF e relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, e seu vice e revisor da ação, Ricardo Lewandowski, protagonizaram um dos mais acirrados momentos da disputa entre os dois. A discussão ocorreu na abertura do julgamento dos embargos declaratórios dos 25 acusados no processo e levou ao encerramento da sessão. O revisro reivindicava mais prazo para analisar argumento de três réus e Barbosa reagiu irritado. Confira o diálogo abaixo:
Lewandowski
"Presidente, nós estamos com pressa de quê? Nós queremos fazer justiça.”
Barbosa
"Nós queremos fazer nosso trabalho. Fazer nosso trabalho e não chicana.”
Lewandowski
"Vossa Excelência está dizendo que eu estou fazendo chicana? Peço que Vossa Excelência se retrate imediatamente."
Barbosa
"Eu não vou me retratar, ministro."
Lewandowski
"Estou trazendo um argumento (...) apoiado em fatos. Apoiado em fatos, em doutrina. Eu não estou brincando, presidente. Vossa excelência está dizendo que estou brincando? Eu não admito isso (...). Vossa Excelência preside uma casa de tradição multicentenária."
Barbosa
"E que Vossa Excelência não respeita”