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Estado de Minas

PT quer desvincular o governo da repercussão negativa do projeto de lei antiterrorismo

Se aprovada, especialistas acreditam que manifestantes podem ser enquadrados como terroristas


postado em 13/02/2014 06:00 / atualizado em 13/02/2014 07:48

Mascarados participam de depredação de ônibus em Niterói, em junho de 2013: projeto abre brecha para punir manifestantes como terroristas(foto: Cristophen Simon/AFP)
Mascarados participam de depredação de ônibus em Niterói, em junho de 2013: projeto abre brecha para punir manifestantes como terroristas (foto: Cristophen Simon/AFP)

Brasília – Preocupado com a repercussão negativa do projeto de lei antiterrorismo, que tramita no Congresso, o PT se armou nessa quarta-feira para blindar o Palácio do Planalto de vinculações com a defesa do texto. Em nota, o partido disse que “não pode aceitar qualquer texto legal que não tipifique – com clareza, objetividade e precisão – crimes eventualmente ocorridos no contexto dessas manifestações”. Para especialistas, caso a matéria seja aprovada com a atual redação, há brecha para se enquadrar manifestantes como terroristas.

A ligação entre o governo e o projeto do senador e aliado Romero Jucá (PMDB-RR), que preocupa o Planalto, foi criada pelo próprio PT. Na segunda-feira, quando foi anunciada a morte do cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, atingido por rojão no Rio de Janeiro, senadores do partido se apressaram em cobrar a aprovação da proposta do peemedebista. Jorge Viana (PT-AC) subiu à tribuna para dizer que, caso terrorismo já estivesse no Código Penal brasileiro, “esses bandidos que mataram o jornalista poderiam ser enquadrados”.

A mudança de discurso começou na terça-feira depois de conversa entre a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e líderes da base. No mesmo dia, à tarde, senadores repetiram várias vezes que o projeto sobre terrorismo nada tinha a ver com as manifestações. Ontem, o PT resolver oficializar sua crítica, por meio de nota assinada pelo presidente nacional da legenda, Rui Falcão. “Uma lei vaga nessa caracterização penal atenta contra os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição e poderia servir à criminalização de movimentos sociais, o que seria um inaceitável retrocesso democrático”, registra o documento.

A despeito das críticas à atual redação, o governo federal tem pressa na aprovação de um projeto sobre o tema. O Planalto quer garantir a da tipificação do terrorismo até a Copa do Mundo, “por precaução”, embora o país não registre atos do tipo. O PT admite a pressa na nota: “Com a proximidade da Copa, a sociedade brasileira exige segurança para exercer seus direitos de liberdade de expressão, de pensamento e de reunião. O poder público necessita de um marco legal atualizado para lidar com novas situações que ocorram nesses eventos”.

BRECHAS
Especialistas consideram que manifestantes realmente podem ser considerados terroristas pelo texto de Jucá. “Essa lei permitirá interpretações equivocadas sobre o conceito de terrorismo. Vai permitir que pessoas que jamais praticaram terrorismo sejam punidas como penas altíssimas. Parece-me mais uma lei para atender a Fifa do que a uma demanda interna”, avaliou Cléber Lopes de Oliveira, advogado criminalista e professor de direito processual penal do UniCeub.

O texto do peemedebista diz que terrorismo é “provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa”. Depois das críticas externas, senadores começaram a apresentar emendas à matéria. Pedro Taques (PDT-MT), relator da reforma do Código Penal, que ainda tramita no Congresso, apresentou quatro. Uma delas acrescenta ao projeto que “não constitui crime de terrorismo a conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios”.

Para Jucá, a definição de Taques está errada. “Tem gente que diz ‘não é terrorismo ação de movimento social’. Mas se o movimento social explodir avião é terrorismo”, argumentou. Na carona da polêmica sobre o projeto, a Comissão de Direitos Humanos do Senado enviou requerimento ao presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), pedindo que o texto também passe pelo crivo do colegiado.

(foto: Ed Alves/CB/D.A Press)
(foto: Ed Alves/CB/D.A Press)
Três perguntas para...


Romero Jucá (PMDB-RR) senador e autor do PL 499/2013, que tipifica o terrorismo como crime 

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), comparou, indiretamente, o texto do senhor ao AI-5, editado na ditadura militar. A intenção é enquadrar os movimentos sociais?

Não quero fazer AI-5. Pelo contrário, discutia-se no governo ter um regime especial de segurança para a Copa do Mundo, que eu acho que não é o caso. O modelo de segurança que temos que ter para combater vandalismo tem que funcionar para a Copa e para depois do Mundial de futebol. Vamos votar projeto de lei duro, que vai punir, coibir e proteger a sociedade.

Juristas dizem que o texto do senhor é vago ao definir terrorismo. Aceita mudanças no texto?

Estamos abertos a sugestões de todos, inclusive juristas. Não há nenhuma intenção de criminalizar manifestações populares. O Código Penal (que também trata de terrorismo), do senador Pedro Taques (PDT-MT), está muito mais vago do que o meu projeto. O texto dele enquadra greve e uma série de coisas (como terrorismo) que o meu projeto não enquadra. Agora, não é fácil definir o que é terrorismo. Tem gente que diz “não é terrorismo ação de movimento social”. Mas se o movimento social explodir avião é terrorismo. Não é terrorismo lutar por causa legítima? O IRA (grupo terrorista da Irlanda do Norte), para eles, lutava por causa legítima, explodia e matava.

 Por que o PT mudou de ideia em relação ao seu projeto (apoiava, mas agora é contra)?

Por medo. Ao surgir a versão de que ele criminalizaria movimento social, ficou com medo de parecer que o governo está incentivando. Esse projeto foi aprovado por unanimidade na comissão e agora vai ao plenário. Agora é que o debate ocorre. Esse projeto não é pronto. É texto-base. Agora, é preciso votar com rapidez. Temos hoje uma lacuna na legislação brasileira. Amanhã, se tiver ataque terrorista, o terrorista, com um quinto da pena, terá progressão para liberdade. O Brasil vai virar o paraíso do terrorismo. Então, estamos fazendo texto duro para afastar daqui qualquer intenção de movimento terrorista a nível nacional.


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