Um movimento articulado em vários estados reviveu, em parte, a comoção popular que foi o movimento Diretas Já, em 1984. Políticos, sindicatos e a sociedade civil se mobilizaram para pressionar a Assembleia Nacional Constituinte (ANC), criada em fevereiro de 1987, a incluir na Constituição de 1988 a previsão para uma eleição presidencial em 15 de novembro daquele ano. O movimento foi chamado de Pró-Diretas e o objetivo era reduzir o mandato do presidente José Sarney (PMDB) em um ano, mas a mobilização não surtiu efeito, pois o maranhense governou o país de 21 de abril de 1985 a 15 de março de 1990.
O secretário do movimento, em Belo Horizonte, foi Betinho Duarte, que depois seria vereador e presidente da Câmara Municipal da capital mineira. Betinho guarda um caderno com as anotações, gastos e contatos políticos daquele movimento. Com base nas anotações do documento, sabe-se que o Comitê Mineiro Pró-Diretas foi lançado em fevereiro de 1987, em um ato na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, na Rua Curitiba, esquina com a Rua Tamoios. A principal aposta era em criar uma dissidência do PMDB, partido do presidente Sarney e do então governador de Minas, Newton Cardoso.
Os livros de história contam com detalhes como foram as Diretas Já. Aliás, em 25 de janeiro o comício realizado em São Paulo, na Praça da Sé, em 1984, completou 30 anos, e foi lembrado como um dos símbolos da campanha. Assim como o Pró-Diretas, de 1987, as Diretas Já, em 1984, não tiveram o objetivo alcançado, pois a Emenda Dante de Oliveira, que previa as eleições, foi derrotada pelo Congresso.
Dessa maneira, o Colégio Eleitoral – e não os eleitores – escolheu, para governar o país, Tancredo de Almeida Neves. Porém, o mineiro de São João del-Rei adoeceu e morreu antes de tomar posse. Após longo e intenso debate, o vice de Tancredo, José Sarney, tomou posse e, mesmo com ideias opostas às de milhões de brasileiros, que pediam as eleições diretas, o maranhense governou o país por cinco anos. O governo de Sarney foi marcado por uma gravíssima crise econômica, com inflação astronômica, em torno de 46% ao mês, e muita insatisfação popular.
Uma das principais queixas foi organizada no Pró-Diretas, que pedia a redução do mandato de Sarney e que a Assembleia Nacional Constituinte (ANC), incluísse na Constituição que seria aprovada em 1988 a convocação de eleição para presidente naquele ano, e não em 1989, como aconteceu. “A transição política no Brasil sempre foi feita pelas elites”, explica a derrota do movimento, que não conseguiu encurtar o mandato de Sarney. Porém, Betinho vê que os movimentos foram fundamentais para a cidadania brasileira. “Foi uma mobilização popular que ajudou na formação. Toda mobilização é importante e nós levantamos bandeiras”, destaca Betinho.
De acordo com o noticiário da época, o comitê enviou telegramas a todos os políticos mineiros do PMDB que iriam participar da convenção do partido com o seguinte trecho: “Esta é a primeira iniciativa política do comitê, que considera importante um pronunciamento do PMDB pelas Diretas 88, já que o partido detém a maioria dos votos na Assembleia Nacional Constituinte”. Um dos dissidentes do PMDB era o então deputado Célio de Castro, que anos depois seria prefeito de Belo Horizonte. Célio afirmou, em julho de 1987: “Quando há um descompasso entre o governo e o povo, a solução é a alternância do poder”. Célio completou que sua posição era “absolutamente coerente com o programa do PMDB e com os propósitos de Tancredo Neves”. Ele disse ao Diário da Tarde, em resposta ao então governador Newton Cardoso, que previa o fracasso da campanha: “Só tem dado sinais de vitalidade. Vai ser o grande debate político daqui em diante, juntamente com a Assembleia Nacional Constituinte”. Na mesma reportagem do DT, Newton previa o fracasso do movimento e se mostrava indignado com a participação dos seus correligionários no movimento e defendia dissolução do diretório regional do PMDB.
O ponto máximo da campanha do movimento mineiro foi o comício de 3 de setembro, na Praça da Rodoviária, que reuniu cerca de 100 mil pessoas, com a participação de lideranças partidárias como o então deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Leonel Brizola (PDT), que havia deixado um pouco antes o governo do Rio de Janeiro. Dias antes do comício, em 26 de agosto de 1987, a coluna “Em dia com a política” do Estado de Minas noticiava que 17 deputados do PMDB assinaram o documento encaminhado ao presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães. Além dos representantes do PMDB, 29 signatários assinaram o documento. Ou seja, mais da metade dos 71 deputados mineiros eram favoráveis às diretas já.
CENTRÃO A comissão executiva do movimento mineiro era formada por nove partidos políticos: PT, PCdoB, PCB, PV, PL, PH, PSB, PDT e PFL, além de sindicatos, centrais sindicais, diretórios estudantis e religiosos. “Estamos comunicando à população que o movimento pelas diretas já começou. Nós todos sabemos que este é o desejo da população, revelado pelas pesquisas de opinião que apontam mais de 80% a favor”, comemorava então o secretário do comitê, Betinho Duarte. Porém, o movimento não conseguiu a vitória graças ao grupo chamado “Centrão”, de parlamentares conservadores, que se organizaram para tirar o poder dos “ulyssistas” do PMDB, acusados de serem demasiados progressistas. O Centrão era apoiado por José Sarney e pelos governadores de Minas, Newton Cardoso, e de São Paulo, Orestes Quércia.
Em maio de 1988, a Assembleia Nacional Constituinte aprovou o presidencialismo e o mandato de cinco anos para presidente. Parte do PMDB descontente com o resultado, entre eles Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas, começou a se afastar do partido. No mês seguinte, a Constituinte decide manter Sarney por cinco anos. FHC e Covas saem do partido e fundam o PSDB. Um dos articuladores do movimento Pró-Diretas em BH era o jornalista Luís Carlos Bernardes, o Peninha, então presidente do Sindicato dos Jornalistas. “O governo Sarney foi um desastre”, lembra. Para o jornalista, entretanto, a derrota do movimento se deve ao temor de muitos políticos e dirigentes partidários que uma diminuição do período de governo Sarney pudesse ser visto como um sinal para os militares retomarem o poder.