Jornal Estado de Minas

A FARRA DA VERBA INDENIZATÓRIA

Saiba como vereadores de BH torram recursos extras de R$ 15 mil/mês por gabinete

Levantamento feito pelo EM mostra a falta de critério dos vereadores da capital no uso da verba indenizatória. Vale de tudo, até mesmo fazer compra em empresas que não existem

Alessandra Mello Alice Maciel
Casa no Bairro Jardim Vitória, em BH; nota em nome de construtora para fornecer salgadinhos para gabinete - Foto: Beto Magalhães/EM/DA Press


O gasto com a verba indenizatória na Câmara Municipal de Belo Horizonte é um verdadeiro vale-tudo. Com os R$ 15 mil mensais a que os parlamentares têm direito para bancar as despesas do mandato, vale gastar mais de R$ 8.700 no Restaurante Churrasco da Naná, onde o almoço custa R$ 8,50, ou quase R$ 2 mil com lanche para 18 funcionários em um bufê cujo cento de salgado custa R$ 28. Vale também gastar R$ 610 em uma casa de material de limpeza e debitar na conta de lanche. Vale até mesmo fazer compras em empresas que não existem ou nem sequer têm placa na fachada e apresentar notas seriadas de um mesmo estabelecimento. Para serem reembolsados dos gastos, os vereadores têm de apresentar apenas uma nota fiscal e não precisam comprovar se a despesa foi mesmo usada para financiar o mandato parlamentar. Existe vereador, por exemplo, que chega a apresentar nota fiscal de uma grande rede de supermercados. Os parlamentares podem usar a verba indenizatória com 32 itens, que vão de serviço postal a eventos e decoração.


Para se ter uma ideia do tamanho da farra com a verba, o montante dos gastos entre janeiro de 2013 e janeiro de 2014 somou R$ 6.010.971,28. Só no mês passado, período de recesso parlamentar, 25 dos 41 vereadores gastaram R$ 180,5 mil dessa verba, cuja extinção está em discussão pela Câmara.

Seu fim ia ser anunciado pela direção da Casa no dia 3, no entanto, não houve consenso entre os parlamentares. O Estado de Minas foi atrás das empresas que prestam os serviços reembolsáveis para saber onde os vereadores gastam e por que eles insistem em manter o benefício. Muitas das empresas funcionam em residências, não têm placas de identificação ou simplesmente não existem.

Caso da ARS Construções, cujo endereço no Bairro Jardim Vitória, Região Nordeste, é uma residência. A reportagem visitou o local por volta das 14h de quinta-feira. Ninguém atendeu a campainha. Os vizinhos disseram desconhecer a existência de qualquer empresa no local. Ela forneceu salgadinhos para o gabinete do vereador Gilson Reis (PCdoB) e apresentou uma nota com o CNPJ da construtora, aberta em janeiro de 2013, mas com nome de Amanda Carolina Diniz Porto. O parlamentar garantiu que pagou R$ 2.115 para a empresa fornecer salgados para duas festas: a comemoração dos 90 anos do PCdoB e outra em homenagem às Meninas de Sinhá. A Câmara veda o uso dos recursos da verba indenizatória em eventos político-partidários. A assessoria de Gilson Reis informou que Amanda é uma salgadeira que trabalha em casa, mas não soube explicar o motivo de o CNPJ da nota fornecida por ela ser referente a uma construtora. “Deve ter ocorrido um erro de impressão na nota”, informou.

- Foto: Arte EMCOPO DESCARTÁVEL Desde 2010, o vereador Henrique Braga, pastor na Igreja do Evangelho Quadrangular, apresenta notas fiscais da Max Clean, no Barreiro, que revende produtos de limpeza e miudezas em geral. De acordo com um dos funcionários da empresa, o vereador é freguês da loja e sempre compra pacotes de copos descartáveis, pois a Max Clean fica bem perto da igreja onde ele prega.
Desde 2010, ele já comprou dessa empresa produtos que somam R$ 8,4 mil. A última nota de dezembro é de R$ 534,60, valor suficiente para comprar cerca de 20 mil copos de plástico descartáveis, segundo o preço médio do produto no mercado.

Braga também já foi indenizado por gastos no Supermercado BH. Em dezembro e no mês passado ele apresentou três notas sequenciais (números 618, 619 e 620) do supermercado com valores que somam ao todo R$ 2,1 mil. Todas essas despesas foram declaradas pelo vereador como gastos com a compra de lanches e foram reembolsadas pela Câmara Municipal. O regimento interno da Câmara autoriza a compra de lanches e utensílios para servir aos vereadores e aos funcionários do gabinete. O valor máximo mensal para esse gasto é de R$ 1.950. Em janeiro, mês do recesso parlamentar, o vereador apresentou gastos no valor total de R$ 1,8 mil com essas despesas. Procurado pela reportagem, o vereador não retornou o pedido de entrevista deixado em seu gabinete. (Colaborou Isabella Souto)

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