O senhor defende a tese de que a ação movida contra o ex-deputado Eduardo Azeredo seja julgada em primeira instância.
É que a competência criminal originária do Supremo Tribunal Federal, inscrita na Constituição e apelidada de foro privilegiado, dá-se quando o réu tem mandato parlamentar, isto é, seja deputado ou senador. O senhor Eduardo Azeredo é ex-deputado, não detém, portanto, mandato parlamentar. Deve ser julgado pelo juiz natural dos brasileiros, em geral, que é o juiz de 1º grau.
O senhor poderia explicar as diferenças jurídicas entre o caso do mensalão, julgado pelo STF, e do ex-deputado Eduardo Azeredo?
O caso do denominado mensalão envolveu parlamentares e não parlamentares. Basicamente, teria ocorrido um plano mediante pagamento de mensalidades aos parlamentares, com dinheiro público, inclusive, que teria sido desviado, a fim de obter votos em projetos de iniciativa do Executivo. O caso do ex-deputado Eduardo Azeredo diz respeito, basicamente, a verbas de três ou quatro sociedades de economia mista estaduais, que teriam sido desviadas para a campanha política.
Como explicar o julgamento, no STF, de pessoas sem foro privilegiado no caso da Ação Penal nº 470?
O que acontece é que os parlamentares, réus na AP 470, atraíram a competência originária do STF. O Supremo poderia, em tese, ter desmembrado o processo: os réus com mandato parlamentar continuariam no Supremo. Os demais, sem mandato parlamentar, seriam julgados pelo juiz de primeiro grau. Isso, entretanto, não ocorreu. O pedido de desmembramento foi reiterado no início do julgamento da ação penal, por eminente advogado, e foi indeferido. E o argumento que me pareceu preponderante, para o indeferimento, é que o pedido fora indeferido, anteriormente. O Supremo, certamente, teve razões para decidir daquela forma.
O STF tem jurisprudência de remessa para a 1ª instância de casos semelhantes ao do ex-deputado Eduardo Azeredo, que renunciou ao mandato depois de denunciado criminalmente?
O que deve ser dito, por primeiro, é que a competência criminal originária do Supremo Tribunal, no caso ora tratado, somente ocorre quando o réu é titular de mandato parlamentar. É o que está inscrito no artigo 102, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal.
Pode-se fazer um paralelo do caso do ex-deputado Azeredo com o do deputado Ronaldo Cunha Lima, que estava sendo processado no Supremo?
Ao que estou informado, cinco ou seis dias antes do julgamento marcado, isto é, processo em pauta, tudo pronto para o julgamento, o deputado Cunha Lima renunciou ao mandato. O Supremo determinou a remessa dos autos à 1ª instância, por sete votos a quatro. Esse precedente tem sido indicado, equivocadamente, como contrário ao caso do ex-deputado Azeredo. O caso do então deputado federal Natan Donadon, por exemplo, tem características especiais. No dia anterior ao julgamento pelo Supremo, ele renunciou ao mandato. O Supremo considerou isso “fraude processual” e manteve o julgamento por oito votos contra um. Os autos, ao que estou informado, estavam no Supremo.
Seria possível presumir, no caso Azeredo, “fraude processual”?
O que deve ser dito, por primeiro, é que a fraude não se presume, a fraude deve ser provada, esta é a regra. Ela há de estar baseada em prova, ou há de ser evidente, isto é, ter base em evidências. A carta, em termos sofridos, que enviou à Câmara dos Deputados esclarece as razões da renúncia. Deve ser considerado, ademais, que o ex-deputado Eduardo Azeredo é homem de bem, o que é reconhecido no nosso estado. Exerceu ele, sem mácula, cargos públicos e o cargo de governador de Minas. É ele de família honrada, filho de Renato Azeredo, político mineiro que dignificou os mandatos que exerceu, companheiro e defensor de Juscelino, quando isso representava ato de coragem.
Caso o STF decida manter o julgamento de Azeredo na Corte, o que ocorreria?
Não acredito que isso venha a ocorrer. A competência criminal originária do Supremo é excepcional. Somente ocorre, foi dito, nos casos expressamente inscritos na Constituição. Inocorrente o seu pressuposto – no caso, o mandato parlamentar, sem que ocorram evidências de fraude processual –, a decisão certamente será pela remessa dos autos ao primeiro grau. O juiz recebe a causa no estado em que se encontra, com o aproveitamento de tudo que foi feito no Supremo. Resta a ele, portanto, se não entender, por exemplo, que deva interrogar, novamente, o acusado, proferir sentença, depois das razões do Ministério Público e da defesa. Registre-se que o Supremo Tribunal, corte mais do que centenária, tem sólida tradição garantista. Quem a integrou, quem a conhece, tem razões de sobra para orgulhar-se da Corte Suprema brasileira. .