Brasília – Líder nas pesquisas de intenção de voto, que ainda a apontam como favorita a vencer as eleições de outubro em primeiro turno, a presidente Dilma Rousseff passa por um processo lento e gradual de fritura que coloca em dúvida, na cabeça dos incendiários, se ela terá fôlego para reeleger-se para mais quatro anos. Os ataques não vêm da oposição, como era de se esperar. Mas de petistas, peemedebistas, outros integrantes da base aliada, empresários e representantes dos movimentos sociais.
Unidos, eles imploram que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva abra mão da aposentadoria e se apresente como o candidato do PT ao Palácio do Planalto. Até o momento, Lula tem rechaçado todas essas iniciativas. Incomodada, a presidente teve de responder sobre o tema durante sua viagem a Bruxelas, onde participou de reunião da cúpula da União Europeia. “Acho que vocês podem tentar, de todas as formas, criar qualquer conflito ou qualquer barulho, ou ruído, entre mim e o presidente Lula, que vocês não vão conseguir. A imprensa é livre e tem direito de expressão, mas eu e o presidente Lula não temos conflito, não temos divergências passíveis, a não ser as normais”, assegurou Dilma.
O ruído é muito maior entre Dilma e os aliados do que entre ela e o ex-presidente. Não há uma semana em que não tenha pelo menos um político ou empresário batendo às portas do Instituto Lula para reclamar. “Eu estive lá na semana passada para me queixar com ele”, alertou um cacique do PMDB. Ele acredita que as insatisfações que estão sendo cultivadas por Dilma ameaçam a governabilidade e a própria reeleição.
Para esse peemedebista, a presidente precisa se esforçar para vencer a disputa em primeiro turno, porque, se a eleição for para um segundo round, a pressão das mídias sociais, da imprensa tradicional, os descaminhos econômicos e a sintonia cada vez maior entre os oposicionistas, senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), poderão selar a derrota do PT. Questionado o que mudaria, dentro do cenário atual, se Lula, e não Dilma, fosse o candidato, esse interlocutor afirmou: “Com Lula, vamos de coração. Com Dilma? Bem, com ela, viramos o rosto de lado e vamos”, comparou.
Um petista que se sente desamparado pela presidente afirma que os sinais confusos emitidos pelo Planalto reforçam o desejo de mudança de comando na campanha eleitoral. “Lula nomeou-a como a mãe do PAC. Ele queria que ela se dedicasse às obras de infraestrutura e educação, mas Dilma acabou apostando na faxina e no combate à pobreza. Não fez nem uma coisa nem outra”, completou o parlamentar.
PIBINHO
Empresários e banqueiros também cogitam a hipótese de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ser o candidato petista ao Planalto neste ano no lugar da presidente Dilma Rousseff. Em viagem a Nova York há duas semanas, Lula manteve vários encontros com investidores, nos quais foi instado a assumir a candidatura do PT. Com todos que lhe apresentaram o tema, ele desconversou. A iniciativa de defender a volta do ex-presidente ainda é de uma minoria. Grande parte dos empresários considera a hipótese de troca de candidatura desejável, mas improvável, exceto em uma situação de crise econômica e política aguda nos próximos meses.
O mau humor do mercado com o governo Dilma se deve à avaliação de que as mudanças na política econômica em relação ao governo anterior foram negativas. Em vez de incrementar a expansão do Produto Interno Bruto (PIB), como desejava a presidente, o crescimento encolheu e está na menor média em 20 anos – apenas 1,8% por ano desde 2011. Mesmo com esse ritmo fraco, a inflação se mantém próxima do teto da meta, de 6,5%, e o rombo das contas externas é o maior da história.
Empresários e banqueiros que têm liderado o movimento “volta, Lula!”, lista que inclui o presidente da Cosan, empresa de infraestrutura e energia, Rubens Ometto, não contam com mudança radical na política econômica caso o plano da eleição do ex-presidente se concretize. Mas esperam, ao menos, recuperar o diálogo com o Planalto. O discurso de Lula não impediu, porém, de ouvir de um empresário próximo o risco de insistir no atual projeto de governo. Em meio a um restrito grupo, esse industrial disparou para o ex-presidente: “Seu maior erro até hoje foi eleger Dilma. Mas será um erro ainda maior reelegê-la”.
O Planalto garante que a presidente está mudando o seu perfil, conversando mais com os empresários e abrindo espaço na agenda para os partidos políticos. Interlocutores reconhecem que, ao contrário de Lula, Dilma tem menos paciência para “salamaleques” com parlamentares. Mas que vai intensificar esse perfil. “Por ser um ano eleitoral, é claro que ela terá de atender as demandas que chegarem a ela”, disse um auxiliar da presidente.
CORRIDA
222 dias
Tempo que falta até o primeiro turno das eleições, marcado para 5 de outubro