Tércio Amaral, Suetoni Souto Maior e Júlia Schiaffarino
Recife e Brasília – Um ato público na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, celebrou ontem o Comício da Central, episódio em que, no mesmo local, há 50 anos, 200 mil pessoas ouviram o então presidente João Goulart anunciar as reformas de base. O conjunto de medidas incluía estatização de refinarias e desapropriação de terras, entre outras pautas que acabaram por catalisar a chegada da ditadura militar no Brasil. Convocado principalmente por centrais sindicais e partidos políticos, o evento de ontem contou com a presença do filho de Jango João Vicente Goulart e do vereador Waldir Pires, consultor-geral da República em 1964.
“Hoje, estamos com os mesmos problemas que poderíamos ter resolvido há 50 anos”, disse João Vicente Goulart, filho de Jango, reclamando que 95% do lucro das empresas de telecomunicações vão para suas matrizes, fora do Brasil. “A reforma agrária proposta por Jango em 64 está empacada hoje, estamos confundindo reforma agrária com reforma fundiária” completou.
Denise Goulart, também filha do ex-presidente, ressaltou a importância de se resgatar a memória para esclarecer o momento histórico do pré-golpe de 1964: “Lembrar fatos como esse não representa só um resgate, mas esclarecer um momento histórico que foi brutalmente interrompido. E que o golpe de 64 nunca mais volte a acontecer, vamos lembrar sempre desses fatos”.
“Era uma convocação popular, foi o maior comício público que já se fez no Brasil, e ali ele fez afirmações básicas, as reformas de base, esse discurso dele é primoroso”, disse Waldir Pires. Ele afirmou que a democracia brasileira é muito recente, e que é preciso ter calma para implementar inteiramente as reformas de base: “Ainda é muito cedo, temos que ajudar a construir a democracia, em nenhum momento abandoná-la. Ela só tem 200 anos, e a humanidade tem 6 mil anos de história escrita”.
REPARAÇÃO No Recife, o ex-juiz espanhol Baltasar Garzón Real, responsável pela ordem de prisão contra o ex-ditador chileno Augusto Pinochet, na década de 1990, foi o principal palestrante do dia no Congresso Internacional “50 anos do Golpe – e a nova agenda da Justiça de transição no Brasil”. Garzón disse que as comissões da verdade instaladas no país não devem substituir a ação da Justiça. “As comissões são, digamos, um mecanismo de justiça restaurativa que deve ser completado com alguma ação da Justiça que proponha a reparação inteira da vítima.”
O ex-presidente morreu no exílio, na Argentina, em 1976. Seu corpo foi exumado no fim do ano para que peritos verifiquem se ele morreu envenenado ou de um ataque cardíaco, se acordo com a versão oficial. (Com agências)