Jornal Estado de Minas

Morosidade da Justiça beneficia prefeitos condenados no país

Levantamento do EM mostra que em pouco mais de um ano, 55 ex-prefeitos foram sentenciados à prisão por irregularidades nos mandatos, mas acabam beneficiados pela lentidão do Judiciário

Alessandra Alves Alice Maciel Luiz Ribeiro
Ex-prefeitos de todo o Brasil estão sendo condenados à prisão por toda sorte de irregularidades, principalmente fraude em licitação.
Algumas penas chegam a 34 anos de prisão. O rigor nas condenações, porém, não garante o encarceramento dos ex-chefes de Executivo. Pelo contrário. Muitas das penas são convertidas em prestação de serviços, pagamento de cestas básicas, recolhimento apenas nos fins de semana ou em infindáveis recursos judiciais que se arrastam por anos, garantindo impunidade para quem desvia recursos no lugar de zelar pela melhoria da vida do cidadão. Levantamento feito pelo Estado de Minas aponta que de janeiro de 2013 até agora, 55 ex-prefeitos de 17 estados foram condenados à prisão por desvios ocorridos, na maioria das vezes, há mais de uma década. Desse total, apenas três estão atrás das grades. O levantamento não incluiu condenados por crimes comuns nem prisões preventivas.


Os números retratam as estatísticas do sistema penitenciário brasileiro. Apenas 0,1% dos presos no país cumprem pena por corrupção, de acordo com o último levantamento do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), divulgado em dezembro de 2012. Para agravar a situação, alguns ex-prefeitos condenados ao semiaberto – quando passam o dia no trabalho e dormem na prisão – acabam escapando da condenação por falta de vagas nesse tipo de regime. Caso de Alagoas, onde não há local para o cumprimento de penas dessa natureza, que representam grande parte das sentenças envolvendo agentes políticos.

O principal motivo de poucos estarem detidos, no entanto, é a lentidão do Judiciário e seu extenso cardápio de recursos à disposição dos advogados. Além disso, são raros os casos de juízes que decretam a prisão de políticos antes da sentença final, quando não há mais possibilidade de recorrer. Enquanto isso, eles colecionam processos com uma ou nenhuma decisão definitiva. É o caso do ex-prefeito de Sucupira José Carlos de Carvalho (PMDB). O município de 1,7 mil habitantes, no interior de Tocantins, não só leva o nome da pequena cidade retratada por Dias Gomes na telenovela O bem-amado, como também teve um prefeito que não fica muito atrás de Odorico Paraguaçu – personagem principal da trama que foi ao ar em 1973 – quando o assunto é corrupção. Carvalho acumula 13 processos. Em um deles foi condenado pela Justiça Federal a seis anos de prisão por desviar dinheiro para a compra da merenda escolar. Ele não está preso porque recorreu da decisão. O desvio teria ocorrido em 2000, quando estava no comando de Sucupira, mas só no ano passado houve a primeira condenação.

Mesmo caso do ex-prefeito de Pedro Alexandre, na Bahia, a 355 quilômetros de Salvador, Petrônio Pereira Gomes (PSDB), que só teve sua primeira condenação em janeiro por crimes que cometeu entre 1997 a 2004.
Ele foi preso logo após a publicação da sentença em primeira instância, em cumprimento de um mandado de prisão expedido pelo juiz Antônio Henrique da Silva, condenado-o a cinco anos e seis meses de detenção pelo crime de extorsão contra o prefeito que o sucedeu no cargo. A prisão foi feita pelo delegado Maurílio de Araújo, titular da delegacia de Pedro Alexandre e policial há 12 anos. O delegado conta que foi a primeira vez em toda a sua carreira que prendeu um ex-prefeito. “Mas não durou muito. Ele conseguiu uma decisão da Justiça e ficou preso apenas um mês e 15 dias e agora recorre em liberdade”, explica. Ele conta ser muito difícil pena de prisão para crimes de corrupção, com condenação apenas em primeira instância. Segundo ele, porém, o juiz da comarca é “muito rigoroso”.

Há casos em que os ex-prefeitos já foram condenados à prisão em mais de um processo, mas por causa dos recursos permanecem em liberdade. Em Belém, na Paraíba, com 18 mil habitantes, o ex-prefeito Tarcísio Marcelo (PSB), irmão do presidente da Assembleia Legislativa do estado, Ricardo Marcelo (PSDB), já foi condenado duas vezes à prisão por desvios durante um dos seus três mandatos à frente do Executivo (1983-1988/1997-2004). Ano passado ele foi condenado a três anos de prisão por desvios de verbas do Programa Saúde da Família em 2001. Dois anos antes, foi sentenciado a um ano e três meses de detenção por fornecer informações falsas ao Tribunal de Contas da União (TCU), mas a pena foi substituída por prestação de serviços.
Nas redes sociais, ele sempre aparece jantando em restaurantes finos ou em sua casa de campo. Na disputa de 2012, ele tentou concorrer, mas teve a candidatura impugnada pela Lei da Ficha Limpa. .