A morosidade em votações na Câmara dos Deputados e no Senado pode arrastar para 2015 decisões sobre projetos importantes. A menos de dois meses da Copa do Mundo, que deve parar as atividades legislativas, parlamentares correm contra o tempo para votar o máximo de matérias possível até maio. No entanto, divergências internas e pressões políticas empacam as proposições. Pior é que, logo após o torneio, grande parte dos deputados e senadores se voltará para as campanhas eleitorais, período em que os plenários permanecem em ponto morto.
Um dos temas que dificilmente vingará nas próximas semanas é o que diz respeito às empregadas domésticas. Faz mais de um ano a aprovação da emenda que ampliou os direitos dessas trabalhadoras, mas elas podem ter de esperar mais tempo pela regulamentação da lei. Desde a promulgação, as empregadas aguardam pela votação de pontos não contemplados na Proposta de Emenda Constitucional (PEC). No momento, estão em vigor apenas a jornada diária de oito horas, o pagamento de horas extras e o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho. Um projeto de lei complementar, na fila para apreciação no plenário da Câmara, regulariza o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a indenização em caso de demissão, o adicional noturno e o seguro-desemprego.
Relatora da PEC na Casa, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) afirmou estar “muito esperançosa” com uma votação após a Páscoa, já que o projeto está em regime de urgência. “Não votamos ainda porque é necessário ter quórum qualificado. É muito risco não ter garantia dos 257 votos. Pode ter alguém que queira obstruir”, garantiu. Já Adelice Conceição Luz, de 38 anos, na profissão há 13, perdeu a esperança que a deputada ainda cultiva. “Colocaram muita expectativa na gente. Eles vão empurrar com a barriga o quanto puderem. Se sair, vai ser um milagre”, desabafou a doméstica, que prevê mais alguns anos de segregação dos demais trabalhadores, sem muitas garantias.
A protelação dos parlamentares também preocupa os prefeitos das cidades mineradoras, que lutam pela apreciação do Marco Regulatório da Mineração, emperrado pelo Palácio do Planalto, descontente com as mudanças feitas pela comissão especial no projeto original. “Se não votar agora, vamos perder mais dois anos porque serão novos deputados, que não conhecem o projeto”, reclama o prefeito de Mariana e presidente da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig), Celso Cota (PSDB), que tenta um encontro com a presidente Dilma Rousseff há três meses.
Sem retorno, as cidades se empenharam em angariar apoio da bancada de Minas no Congresso Nacional, como os senadores Aécio Neves (PSDB) e Clésio Andrade (PMDB). “Também estamos tentando uma agenda com o vice-presidente da República, Michel Temer”, afirmou Cota. O relator da proposta, deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), diz estar pronto para votar em plenário a nova lei, que aumenta a Contribuição Financeira pela Exploração Mineral (CFEM). “O governo está adiando para depois das eleições, para que Minas Gerais não receba R$ 2 bilhões de royalties”, diz Quintão.
Lentidão
Outra matéria que não deve andar em ritmo acelerado no Congresso é o Marco Civil da Internet. Depois de três anos em análise na Câmara, ela chegou ao Senado há duas semanas, sem data para ir a plenário. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), informou que o projeto deve ser votado imediatamente. Mas a matéria, que define direitos e deveres de usuários e provedores, deve passar antes pelo crivo das comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática e Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle. Senadores reagiram à pressão do Planalto para a votação da proposta, como Vital do Rêgo (PMDB-PB), que considera o prazo “injusto”. O vice-líder do PSDB na Casa, Álvaro Dias (PR), confirmou que não houve debate suficiente, e que votará contra uma apreciação por agora. “A Câmara teve tempo, discutiu, analisou, alterou. Nós temos que aprofundar a discussão sobre esse assunto, que é importante do ponto de vista da liberdade de expressão. Se o governo deseja votar rapidamente, em regime de urgência, fica sob suspeição.”
Por outro lado, o adiamento da votação é apontado por especialistas como um prejuízo à sociedade civil, que permanecerá mais um ano sem uma legislação que garanta direitos ao cidadão usuário dos meios digitais. “Na ausência da demarcação desses direitos, ficamos sujeitos à interpretação de cada juiz. A efetividade no combate a incidentes aumenta quando os provedores estão obrigados a preservar os registros eletrônico. Isso impacta muito a chance de identificação da autoria e punição de infratores”, defende o advogado especialista em direito digital Alexandre Atheniense.