Brasília – O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, considerou nessa sexta-feira “desarrazoado” o pedido da promotora da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, Márcia Milhomens Corrêa, para quebrar o sigilo telefônico do Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. A medida requerida pela promotora inclui coordenadas geográficas que podem alcançar o Palácio do Planalto e até mesmo o Supremo Tribunal Federal (STF). Por isso, Janot deu parecer contrário ao pedido, que agora será encaminhado ao ministro Joaquim Barbosa, presidente da Suprema Corte, que decidirá se acata a pretensão da representante do Ministério Público Estadual. “Há um excesso sem justificativas plausíveis e uma pretensão totalmente desarrazoada”, disse, referindo-se ao pedido. E concluiu: “O pleito não merece acolhimento, desbordando de todos os procedimentos normais nesse tipo de apuração”.
Ao apresentar o pedido, a promotora Márcia Milhomens informou que o objetivo era investigar o suposto uso de celular pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu dentro do presídio, onde está detido desde novembro, depois de ter sido condenado por envolvimento no escândalo do mensalão a sete anos e 11 meses de prisão em regime semiaberto. Segundo ela, o que se pretendia era que operadoras de telefonia móvel se limitassem a informar sobre eventuais chamadas da penitenciária da Papuda para a Praça dos Três Poderes, onde estão situados o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional. “Trata-se de medida menos gravosa e indispensável à apuração das denúncias trazidas ao Ministério Público”, argumentou a promotora. A investigação foi instaurada depois que a imprensa publicou reportagens sobre suposta conversa telefônica entre o petista e o secretário da Indústria, Comércio e Mineração da Bahia, James Correia, em janeiro
Descompasso
No parecer, Janot não poupa críticas à colega do Ministério Público Estadual, apesar de admitir que a lei veda o uso de celular por detentos. "A adoção de medidas invasivas (no caso, a quebra do sigilo telefônico) tem que ser pautada pelo princípio da proporcionalidade. Os meios podem ser idôneos para atingir o fim, entretanto, desproporcionais em relação ao chamado custo/benefício”, destacou o procurador-geral da República. Janot lembrou também que a suspeita é de que José Dirceu falou ao telefone em 6 de janeiro, e a promotoria pretendia quebrar o sigilo telefônico por um período de 15 dias. Em sua interpretação, há um “total descompasso da injustificada pretensão de pedir quebras de sigilos telefônicos dentro desses quadrantes (que incluiriam a Praça dos Três Poderes)”.
A investigação do possível uso de celular virou uma grande dor de cabeça não só para o petista José Dirceu como para a promotora Márcia Milhomens. O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) instaurou um procedimento para investigar a conduta da promotora, a partir de um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU), que apresentou uma reclamação formal ao colegiado. A AGU sustentou que Márcia pediu uma quebra ampla de sigilo telefônico, atingindo um número indeterminado de pessoas, sem dar explicações ou justificativas para a medida, o que a tornou ilegal (leia ao lado). Por sua vez, José Dirceu, condenado a cumprir pena em regime semiaberto, teve a análise de seu pedido de trabalho externo suspensa até que seja concluída a apuração do possível uso do celular.
Favorável
O pedido da defesa do ex-ministro para o trabalho externo já recebeu parecer favorável do procurador-geral, Rodrigo Janot. “No que concerne ao requerimento de trabalho externo do sentenciado, não há nada a opor, porque, do que se tem conhecimento, os requisitos legais foram preenchidos”, afirmou o procurador, no dia 14. Segundo ele, o ex-ministro negou o uso irregular de telefone e o procedimento administrativo na Papuda foi arquivado por falta de provas. José Dirceu tenta trabalhar desde que foi preso. Uma primeira solicitação foi para assumir a gerência do Hotel Saint Peter, com salário de R$ 20 mil mensais. As suspeitas sobre a oferta levaram o petista a desistir do pedido. Depois, em janeiro, ele fez nova tentativa, desta vez, para trabalhar na biblioteca de um escritório de advocacia, com salário de pouco mais de R$ 2 mil mensais. O pedido ainda não foi analisado.