Brasília – O manifesto assinado por 20 deputados da bancada federal do PR, que pedia o “Volta, Lula” e rifava a presidente Dilma Roussef da disputa presidencial, lido na Câmara dos Deputados há pouco mais de uma semana, foi pensado e articulado pelo ex-presidente da sigla Valdemar Costa Neto. Até algumas expressões do texto passaram pelo crivo do ex-deputado federal, que cumpre pena em regime semiaberto no Centro de Progressão Penitenciária (CPP), em Brasília, após ter sido condenado a sete anos e 10 meses de prisão no processo do mensalão. Envolvido em denúncias de que teria regalias no CPP, Valdemar pode estar contando os dias para ter o benefício do trabalho externo cancelado e voltar à Papuda.
Alguns parlamentares do PR, ouvidos reservadamente pelo Correio, confirmaram a informação. Na visão de um dos deputados, Valdemar está insatisfeito com o Planalto porque queria emplacar, no Ministério dos Transportes, o senador Antônio Carlos Rodrigues (PR-SP) ou o deputado Edson Giroto (PR-MS) em substituição ao comandante da pasta, César Borges. “O comando do PR é dele. Qualquer iniciativa do partido passa pelo Valdemar. Ele chamou o Bernardo (deputado Bernardo Santana, líder do PR na Câmara) e deu essa ordem do manifesto. Pensou que, estimulado por alguém, o gesto poderia facilitar a mudança do ministro. Acho que não funcionou”, comentou um dos parlamentares.
No documento, lido pelo deputado Bernardo Santana, a legenda afirmava que apenas Lula tinha a experiência necessária para comandar o Brasil nos próximos quatro anos. “Certos de que o Brasil precisa inaugurar um novo ciclo virtuoso de crescimento pela via da conciliação nacional, entendemos que o momento de crise, dentro e fora do país, reivindica a força de uma liderança política com a experiência e o brilho de Luiz Inácio Lula da Silva no comando da nação brasileira, novamente”. Ao fim do ato, o líder do PR chegou a colocar a foto do ex-presidente Lula na parede do gabinete da liderança na Câmara.
No fim do ano passado, o Estado de Minas mostrou que, na época, mesmo preso no Complexo da Papuda, o ex-deputado Valdemar Costa Neto continuava dando as ordens no PR. No início de dezembro, a reportagem publicada indicava que Valdemar teve uma reunião na cadeia com o secretário-geral da legenda e seu homem de confiança, o senador Antônio Carlos Rodrigues (PR-SP). De dentro da prisão, o parlamentar traçava metas para eleger uma bancada de 40 deputados nas próximas eleições, conjecturava alianças nos estados e fazia sondagem de potenciais candidatos com possibilidade de votações expressivas.
Na época, ao ser questionado, o senador Antônio Carlos Rodrigues, que ocupou a vaga deixada por Marta Suplicy (PT-SP) quando a petista assumiu o Ministério da Cultura, confirmou, na primeira conversa por telefone, que ele ainda tem ascendência no partido. “Sem dúvida alguma. Não é por ele se encontrar nessa situação que iremos desprezá-lo”, justificou. Depois, no segundo contato com a reportagem, mudou o tom. O parlamentar, escolhido estrategicamente por Valdemar para conduzir as decisões da sigla, fez questão de salientar que ele já repassou o comando do partido. “O Valdemar se afastou do partido. Ele está estudando, fazendo um curso na prisão. Fiz uma visita particular. Ele é meu amigo”, ressaltou.
INQUÉRITO No início de abril, o jornal Folha de SP mostrou que Valdemar, empregado como gerente administrativo de um restaurante industrial, recebeu lideranças de seu partido em duas oportunidades cada no local de trabalho. Na pauta dos encontros, entre outros assuntos, o posicionamento do PR diante do “blocão”, grupo de deputados aliados que se rebelava contra o governo.
Provocado pelo Ministério Público do Distrito Federal, o juiz Vinicius Santos Silva, da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, determinou a abertura de um inquérito disciplinar para apurar se o Valdemar descumpriu as condições que lhe foram impostas para obter o benefício do trabalho externo. A investigação ainda não foi concluída. Se ficar provado que o ex-deputado cometeu irregularidades, ele pode retornar à Papuda para cumprir pena em regime fechado.