De um lado, a minirreforma eleitoral – Lei 12.891, sancionada em dezembro de 2013 – abre brecha para que as doações ocultas trianguladas por partidos políticos aos candidatos continuem não só em espécie como também por meio do repasse de “bens, materiais e serviços”. Ainda é incógnita se a lei será aplicada nestas eleições. Segundo o presidente TSE, Dias Toffolli, a Corte Eleitoral vai se manifestar antes das convenções partidárias, que acontecerão a partir de 10 de junho.
De outro lado, a Resolução 23.406, publicada pelo TSE no Diário de Justiça Eletrônico, em março deste ano, depois da aprovação da minirreforma, caminha em sentido contrário ao Congresso Nacional. Essa resolução disciplina a arrecadação, os gastos de recursos por partidos políticos, candidatos e comitês financeiros, além da prestação de contas nas eleições deste ano. Ela estabelece procedimentos que cercam as doações ocultas.
“Um dos controles foi exigir que o candidato, ao receber as transferências financeiras do partido, emita o recibo eleitoral, nele informando o doador originário que transferiu os valores ao partido”, explica Júlio César Diniz Rocha, coordenador de Controle de Contas Eleitorais e Partidária do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais e integrante do Grupo Nacional das Contas Eleitorais do TSE. Após a emissão do recibo, o candidato passa a ter de registrar em sua prestação de contas não só o recebimento do partido, mas também o CNPJ ou CPF daquele que contribuiu com a legenda. Só que a minirreforma eleitoral retirou a obrigação da emissão do recibo eleitoral para as doações financeiras.
A minirreforma eleitoral retrocede também em relação às medidas de transparência adotadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, nas eleições de 2012, com base na Lei de Acesso à Informação, determinou que fosse publicada a relação de doadores e de financiadores já nas prestações de contas parciais dos candidatos realizadas em agosto e em setembro. Apesar do tom de novidade, a lei que veio do Congresso Nacional retomou à velha letra: financiadores e fornecedores de campanha só serão conhecidos pelo eleitorado na prestação final das contas, após o pleito. “Até as eleições de 2010, existia vedação pela Lei 9.504 para a publicação das fontes de financiamento e dos fornecedores das contas parciais dos candidatos apresentadas em 6 de agosto e em 6 de setembro”, explica Júlio César Diniz Rocha, lembrando que a Resolução 23.406 do TSE, diferentemente, permite a publicação, adotando a mesma lógica das eleições municipais de 2012.
Se mais ou menos transparência nestas eleições, maior ou menor controle da fiscalização das contas de campanhas, tudo dependerá da Corte Eleitoral. E enquanto não há definição se a minirreforma eleitoral, que altera a Lei 9.504/97, vigorará ou não neste pleito, segue a incerteza. Só uma coisa é certa: se a nova lei for aplicada para estas eleições, o TSE precisará modificar a sua resolução. Pelo menos no que se refere às doações ocultas e às prestações parciais, elas apontam em direções opostas.
Tempo na TV também é incerto
Há mais incertezas nas regras das eleições de 2014. Ainda não se sabe como será a distribuição do tempo de propaganda do horário eleitoral gratuito e das inserções diárias. Atrasado em relação ao calendário eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ainda não publicou a resolução com as instruções específicas – o que deveria ter sido feito até 5 de março. A Resolução 23.404 do TSE, que dispõe sobre a propaganda eleitoral, apenas menciona a distribuição do tempo de antena mantendo a regra que vigorou até as eleições de 2012. Ela também desconsidera a Lei 12.875. Sancionada em 30 de outubro de 2013, a nova lei propõe outra fórmula para o cálculo da distribuição do tempo da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão, que se inicia em 19 de agosto e se estenderá até 2 de outubro.
O novo cálculo apresentado pela legislação para a distribuir o horário eleitoral gratuito representa um revés para as legendas nanicas, que têm pequena ou nenhuma representação na Câmara dos Deputados. “Um terço do tempo que era distribuído de forma igualitária entre os candidatos, independentemente do tamanho de sua bancada federal, agora se reduz para um nono”, explica Diogo Mendonça Cruvinel, professor de Direito Eleitoral e chefe do Setor de Propaganda Eleitoral do TRE-MG.
Em outras palavras, se a Lei 12.875 estivesse em vigor nas eleições de 2010, por exemplo, quando concorreram nove candidatos à Presidência da República, o tempo de antena do horário eleitoral das terças, quintas e sábados distribuído aos candidatos Rui Costa Pimenta (PCO), Zé Maria (PSTU), José Maria Eymael (PSDC), Levy Fidelix (PRTB) e Ivan Pinheiro (PCB) cairia de 1 minuto e 50 segundos para cada um para 37 segundos às terças, quintas e sábados.
Também as legendas com baixa representação na Câmara dos Deputados, como foi o caso nas eleições presidenciais de 2010 do então PV de Marina Silva (hoje no PSB) e do PSOL de Plínio de Arruda Sampaio, seriam atingidas. Em vez dos 2 minutos e 46 segundos por dia que obteve, Marina Silva teria 37 segundos pela distribuição igualitária entre os nove candidatos mais 56 segundos pelo tamanho da bancada na Câmara dos Deputados, somando 1 minuto e 33 segundos por dia.
“As alterações na legislação propostas pelo Congresso aconteceram menos de um ano antes da eleição. E há dúvida se ferem o princípio da anualidade estabelecido na Constituição Federal”, explica Diogo Cruvinel. Há, nesse sentido, consulta formulada ao TSE, que questiona a aplicação da minirreforma eleitoral nas eleições deste ano, ainda a ser apreciada. Há muitos precedentes de mudanças no próprio ano eleitoral. “A Lei 11.300, também chamada de minirreforma eleitoral, foi aprovada em 2006. O TSE entendeu, à época, que ela não alterava o processo eleitoral, apenas os seus procedimentos. Foi aplicada naquelas eleições gerais”, considera o especialista. O mesmo poderá ocorrer este ano, não só em relação à minirreforma eleitoral, como também no que se refere às demais leis sancionadas depois de 5 de outubro de 2013..