A disputa pelo governo de Minas supera gastos com educação, saúde, transporte e outros serviços básicos prestados à população.
As conclusões são de levantamento feito pelo Estado de Minas com base na previsão de gastos de campanha registradas no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) e no orçamento anual de 2014 declarado pelas prefeituras ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). Os dados revelam distância entre as cifras das eleições e o cotidiano das cidades. Um grupo de 191 municípios mineiros – que representa mais de um quinto deles – conta com receita anual inferior a R$15,1 milhões. O valor equivale a um décimo do que os candidatos pretendem investir na campanha eleitoral.
O caixa dos candidatos ao Palácio Tiradentes se compara ao da maior cidade do Sul de Minas, Poços de Caldas, com 161 mil habitantes e economia voltada para turismo e indústria. Somente 11 municípios despendem por trimestre valor superior aos R$ 151,8 milhões que os candidatos preveem gastar no mesmo período.
Os gastos de campanha também se comparam aos recursos que a Prefeitura de BH investiu em saúde e educação no ano passado. Na prestação de contas ao TCE, o município informou ter gasto R$ 125 milhões em recursos próprios com as duas pastas. “Isso demonstra o quanto o sistema político está errado. Numa campanha com esse volume de dinheiro, a democracia está perdendo espaço para se tornar uma disputa elitista”, critica o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Antonio Andrada (PSDB), prefeito de Barbacena.
Se entre candidatos sobra dinheiro, a história é outra quando as prefeituras são o assunto. “Os municípios estão à míngua”, afirma Andrada. A maior fatia da receita municipal vem do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), transferido pelo governo federal. A arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) representa a principal parcela do FPM. “Num momento de retração econômica, a receita dos municípios diminui. As prefeituras nem sequer conseguem fazer a projeção orçamentária”, diz.
POBRE E RICO
A 240 quilômetros da capital, Pimenta, município da Região Centro-Oeste do estado, tem o mesmo nome de um dos principais candidatos ao governo, Pimenta da Veiga (PSDB). Mas a semelhança para por aí. O político é o que dispõe de mais recursos entre os concorrentes para gastar nas eleições e declarou investimento máximo de R$ 60 milhões nos três meses de campanha.
Enquanto isso, o município de 8,5 mil habitantes só conta com um terço desse valor para gastar durante todo o ano, com orçamento anual de R$ 21,5 milhões. O prefeito de Pimenta, Ailton Sapinho (PR), diz que se contentaria com a metade dos recursos da campanha do tucano. “Com esse dinheiro pagaria dívidas herdadas de R$ 8 milhões e ainda reformaria a Santa Casa.
No Vale do Rio Doce, Mendes Pimentel, a 400 quilômetros de BH, tem o mesmo sobrenome do candidato Fernando Pimentel (PT), que prevê gastar R$ 42 milhões na campanha. Na família Pimentel, o político é certamente o primo rico, já que o município tem menos da metade desse dinheiro para investir durante o ano. De acordo com o TCE, o orçamento de Mendes Pimentel para 2014 é de R$ 15 milhões, o equivalente a 35% do custo da campanha do petista.
Segundo a coordenação da campanha de Fernando Pimentel, a previsão de gastos teve como base cotação de preços dos principais serviços contratados nas eleições de 2010. Na época, o candidato Hélio Costa (PMDB), apoiado pelo PT, gastou R$ 28 milhões. As principais despesas foram com a produção dos programas de rádio e TV e logística. A campanha do candidato Pimenta da Veiga não informou como pretende gastar os R$ 60 milhões previstos.
Jogo marcado pelo dinheiro
Dinheiro na campanha, vitória nas eleições. A regra esteve presente nos últimos pleitos dos três maiores colégios eleitorais do Brasil: São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Em 2006 e 2010, os candidatos a governador vencedores nesses estados foram aqueles que mais gastaram nas campanhas. Enquanto o poder econômico dita os resultados, a legislação fica em segundo plano. A Lei 9.504/97, que estabelece normas para as eleições, já determina que norma específica definida em cada pleito estabeleça o máximo de recursos que os concorrentes poderão investir.
“Esse limite deveria ser definido pelo Congresso Nacional a cada eleição.
Enquanto a regra não é posta em prática, altas cifras são aplicadas em campanhas. Nas últimas eleições para governador em Minas, Antonio Anastasia garantiu a reeleição com gasto de R$ 38 millhões, valor 35% maior em relação ao seu principal adversário, Hélio Costa (PMDB), que investiu R$ 28 milhões na campanha. Em São Paulo, o atual governador Geraldo Alckimin (PSDB) desembolsou R$ 34 milhões. O gasto do concorrente Aloizio Mercadante (PT) não chegou a 60% desse valor, num total de R$ 20 milhões.
Mas a maior diferença nas finanças ocorreu entre as campanhas do governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB) e seu principal oponente, Fernando Gabeira (PV). Cabral gastou R$ 20 milhões, mais de cinco vezes o valor do adversário, que despendeu R$ 3,6 milhões. “Gasto de campanha e televisão são indicadores de uma tendência de vitória”, afirma o consultor em marketing político Guga Fleury.
O professor Bruno Wanderley Reis, do Departamento de Ciências Políticas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que o dinheiro tem um peso maior no caso da eleição de deputados. “Nas eleições majoritárias já há uma avaliação de quem vai ganhar e isso pode influenciar um potencial financiador a doar para esse ou aquele candidato a governador ou presidente”, ressalta. “Não sabemos em que medida o gasto causa a vitória ou se a perspectiva de vitória causa a arrecadação”, completa.
Numa tentativa de equilibrar a disputa entre os concorrentes, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mudou este ano a regra para uso do patrimônio próprio dos candidatos nas campanhas. Até então, eles podiam gastar todos seus bens na campanha. A partir de agora, o candidato pode aplicar, no máximo, 50% do patrimônio próprio na candidatura. “Se esse valor extrapolar o teto estabelecido pelo partido, vale o valor menor. É uma maneira de criar maior isonomia no financiamento de campanha”, explica Rocha.
Previsão de gastos cresce 65%
A previsão dos gastos de campanha dos candidatos ao governo de Minas aumentou 65% em relação às eleições de 2010, quando a disputa pelo Palácio Tiradentes teve nove candidatos, um a menos do que este ano. Naquela ocasião, candidatos declararam que gastariam R$ 91,7 milhões, enquanto este ano os valores já alcançam os R$ 151,8 milhões. Orçada em R$ 60 milhões, a campanha eleitoral do candidato tucano Pimenta da Veiga lidera o ranking, seguida do seu principal concorrente, Fernando Pimentel (PT), que prevê gastar R$ 42 milhões. A maior parte dos recursos deve ser direcionada a programas de rádio e televisão.
De acordo com o consultor em marketing político Guga Fleury, a produção midiática é o que mais encarece a corrida eleitoral. “Numa campanha em Minas, o gasto com televisão chega a R$ 10 milhões. A internet representa 5% do custo”, diz. Num estado com 853 municípios, a logística também pesa no bolso dos candidatos, segundo o especialista. “É necessário montar bases regionais e há um custo para fornecer materiais para todas elas, assim como na logística de uma fábrica”, ressalta.
Nas últimas eleições, os candidatos apresentaram prestação de contas com despesas 25% menores do que a estimativa inicial, comprovando gastos de R$ 68,2 milhões. “Candidatos morrem de medo de ser multados”, afirma Fleury. A Justiça obriga partidos a estabelecer um valor máximo de gastos de campanha. De acordo com a legislação eleitoral, quem extrapola esse número está sujeito a multa no valor de cinco a 10 vezes a quantia em excesso.
Enquanto isso...
… STF analisa doações
Está em suspenso no Supremo Tribunal Federal (STF) julgamento sobre a proibição de doações de empresas a campanhas eleitorais. Até maio, por 6 votos a 1, a maioria dos ministros votou por acabar com a prática, considerada inconstitucional pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ainda faltam os votos de quatro magistrados. A suspensão ocorreu porque o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo. Não há data para a continuação do julgamento. A orientação dos ministros contraria a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 352/13, em tramitação na Câmara dos Deputados. A PEC propõe um teto de despesa para a campanha eleitoral, mas admite que cada partido escolha o modo de financiamento entre privado, misto ou exclusivamente público. A PEC também está em suspenso e foi retirada em maio da pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Atualmente, pessoas físicas podem doar até 10% de seu rendimento bruto no ano anterior para campanha eleitoral. Para as empresas, o limite é de 2% do faturamento bruto do ano anterior..