Para grande parte da população, os cavaletes usados na propaganda dos candidatos às eleições de domingo (5) só servem para poluir a cidade e obstruir as calçadas. Não é o que pensam os cerca de 20 usuários de crack que vivem no cruzamento das Avenidas Atlântica e Teotônio Vilela, na Cidade Dutra, zona sul da capital paulista.
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Combate ao crack une cinco ministériosVereador quer CPI para investigar internação compulsória de menores usuários de crack no RioPF apura troca de votos por pedras de crack em TeresinaDupla é presa com 5 mil pedras de crack em BH. Um suspeito fugiu pulando em córregoCavaletes com propaganda eleitoral estão com com os dias contadosNo entorno de sua nova morada podiam ser vistos preservativos e absorventes usados, garrafas e embalagens de comida vazias.
Morador de rua e usuário de crack desde a adolescência, Jean Carlos de Oliveira, de 46 anos, não lembra direito desde quando passou a viver debaixo do cavalete de propaganda política. "Foi desde quando colocaram as placas", disse, enquanto preparava o cachimbo. No pequeno triângulo formado entre as duas abas da placa (dos também irmãos Enio e Nilto Tatto, candidatos a deputado federal e estadual pelo PT) e o chão, Jean acumula seus poucos pertences - duas mudas de roupa, um par de sandálias e um lençol que ele faz de "parede". "O rapa passou aqui uma vez, mas foi só essa vez. Ninguém reclama não. É até bom que a gente protege as placas, né?", afirmou Oliveira, que pediu para não ser fotografado. "Não quero prejudicar os candidatos porque eles ajudaram muito o pessoal daqui." Ele diz que tem profissão, já foi pedreiro, marceneiro e eletricista, mas hoje só trabalha "com o rodinho", limpando vidros de carros no semáforo. Do outro lado da rua, outras nove pessoas vivem em barracas de camping, formando uma minicracolândia.
Perto de onde estavam os novos moradores dos cavaletes, duas garotas contratadas pelos irmãos Tatto agitavam bandeiras do PT. Elas ganham R$ 600 por mês e disseram que até agora não foram incomodadas pelos vizinhos. As duas meninas são monitoradas por um coordenador de campanha, Fábio Menezes, que faz as vezes de segurança. "A gente tem de ficar de olho para proteger as meninas, mas até agora não teve nenhum problema", disse Menezes. Segundo ele, o único inconveniente da presença dos usuários de crack é a impossibilidade de recolher os cavaletes à noite, uma exigência da legislação eleitoral. "Depois que eles passaram a usar as placas não tem mais como tentar recuperar", admitiu.
Desde o início oficial da campanha eleitoral, em junho, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo apreendeu 187 toneladas de propaganda eleitoral irregular. A maior parte é composta por cavaletes (37,5 mil) deixados em pontos proibidos como praças, parques ou locais que atrapalhem o fluxo de pessoas.