Brasília – Durante 72 horas, entre a tarde de sexta-feira e o início da manhã de ontem, a Força Aérea Brasileira (FAB) e a empresa sueca Saab conseguiram manter em sigilo a assinatura de um acordo que levou pelo menos 12 meses para ser fechado: a compra
dos 36 caças Gripen NG. Ao longo deste intervalo, um debate eleitoral estava em curso no país, mas o tema militar passou longe da guerra política. Apenas às 11h de Brasília — 14h, em Estocolmo — de ontem, a companhia europeia finalmente anunciou os termos do contrato, negociado por integrantes de três ministérios do governo brasileiro, e o valor acertado: US$ 5,4 bilhões ( cerca de R$ 13,7 bilhões), um aumento de R$ 1 bilhão do preço inicialmente divulgado, de US$ 4,5 bilhões.O negócio envolve a aquisição dos caças com a transferência de tecnologia. A previsão é de que em 2019 o país já receba as primeiras aeronaves e as últimas, em 2024. A FAB tinha até 18 de dezembro para firmar o acordo com a Saab. Mas a assinatura do contrato aconteceu na sexta-feira passada, na antevéspera do segundo turno de votações.
O dia da consumação do acordo foi o mesmo do último debate, da Rede Globo, entre os candidatos à Presidência da República. A explicação para assinar o contrato na sexta-feira seria por causa de uma simbologia interna, já que a semana passada é conhecida como a do aviador. Mas, nos bastidores, havia o temor de que um novo governo pudesse implicar na suspensão dos termos do acordo.
A discussão sobre a substituição dos caças no Brasil vem desde 1995 sendo intensificada em 2001.A Força Aérea disse, em nota, que, embora assinado na sexta-feira, o extrato do contrato só foi publicado ontem no Diário Oficial da União. Já a justificativa para o aumento no valor do acordo, segundo a FAB, é a de que a atualização de alguns sistemas tecnológicos e a participação de empresas brasileiras no processo impactou no preço. Isso porque, de acordo com a Força Aérea, a oferta da Saab aconteceu em 2009, apesar do anúncio da escolha da empresa ter sido divulgada no ano passado.
“A atualização de preço se justifica pelos impactos relacionados à oferta de 2009, que foram exaustivamente negociados, visando à maior participação das indústrias brasileiras. As condições econômicas presentes àquela época diferem das atuais”, informou, em nota. Isso também teria impactado o prazo de entrega dos caças.
O Gripen NG ( de new generation) existe apenas como protótipo na Suécia. O Brasil vai adquirir duas versões dele, uma com um lugar e outra com dois. A de dois lugares será produzida pela primeira vez pela Saab junto com engenheiros brasileiros durante o processo de transferência de tecnologia. Os primeiros 21 aviões devem ser fabricados em território europeu e os 15 restantes, no Brasil. Com o processo, a Embraer vai adquirir o conhecimento para produção de caças. Hoje, a empresa produz apenas aviões.
Os 36 aeronaves substituirão os F-5 modernizados que o Brasil detém. Eles também ficariam no lugar dos Mirages, que foram aposentados no ano passado. Por causa da falta de aeronaves, o governo negocia a cessão de 10 a 15 Gripens de modelos antigos para serem usados enquanto os novos não ficam prontos.
PARCERIA A montagem dos Gripens acontecerá na fábrica da Embraer, em São José dos Campos (SP). O processo de transferência de tecnologia envolve pelo menos sete empresas. Uma delas, que está construindo uma indústria em São Bernardo do Campo em parceria com a Saab, ficará responsável pela produção de uma parte das peças que compõem a estrutura do caça, como as asas e a fuselagem. A outra parcela de peças virá da Suécia, assim como outros equipamentos, de outras nações. O motor, por exemplo, será da Boeing, dos EUA.
Segundo um militar da reserva que participou de algumas negociações técnicas, o sensor que detecta a presença de outros aviões, até os chamados invisíveis, pelo calor em uma distância de até 1,2 mil quilômetros deve vir da Itália. Uma das intenções do governo com a transferência de tecnologia é passar a exportar o Gripen NG.
De acordo com a FAB, há nas cláusulas de contrato a previsão de pagamento de royalties à empresa sueca e também negociações de “marketing agreement”, com definições de mercado. O Brasil, por exemplo, ficaria pelo menos com a América do Sul. O chefe da Divisão de Aeronáutica da Saab, Lennart Sindahl, comemorou o acordo com o país. “Estamos construindo um contrato de longo duração com o Brasil, que vai nos colocar em novos mercados potenciais.”