Brasília – “Presidente, estou aqui descumprindo uma ordem médica, mas precisava vir para apresentar as demandas do setor.” Foram estas as palavras ditas pela senadora Kátia Abreu (TO), recém-operada e, à época, ainda filiada ao PSD, na primeira audiência das duas no Palácio do Planalto.
Por coincidência, foi justamente durante a corrida eleitoral de 2010, quando Dilma retirou um tumor de 2,5 cm da axila direita e passou quatro meses fazendo quimioterapia no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, que ocorreu o primeiro contato entre ambas. Kátia, filiada ao DEM, relatora do projeto que derrubou a CPMF no Senado e que, até hoje, é apontado como a maior derrota do governo Lula, escreveu uma longa carta desejando “força” para Dilma. “Ela disse para a presidente ter coragem e fé para enfrentar a doença. E acrescentou que a saúde dela era muito importante para assegurar a presença feminina na política”, lembra uma amiga pessoal da senadora de Tocantins.
Até então, o contato entre ambas era zero. Aliados até afirmam que a carta não tinha interesses políticos, apenas uma demonstração de solidariedade humana. Kátia fez campanha para José Serra em 2010 e não poderia, abertamente, apoiar a candidata do PT. Mas, ao término do segundo turno das eleições presidenciais de quatro anos atrás, ela debruçou-se sobre o mapa eleitoral feito pelos analistas políticos da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e afirmou: “A presidente terá de nos procurar para buscar o apoio nos locais onde ela não tem”.
Na verdade, Kátia, de longe, observava os passos da presidente desde a metade do primeiro mandato de Lula.
Apesar de o apoio do agronegócio ser tradicionalmente ao PSDB, Kátia desabafou a pessoas próximas que, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o setor jamais foi recebido em audiência no Palácio do Planalto. Lula sinalizou um distensionamento com os produtores rurais e o diálogo ficou melhor com os ministros Roberto Rodrigues e Reinhold Stephanes. Mas ainda era pouco. A vitória de Dilma de 2010, por exemplo, poderia ser uma porta aberta para os ruralistas no governo.
A presidente, contudo, escolheu Antonio Palocci para a Casa Civil. O caminho estava bloqueado novamente. Kátia, então, buscou estradas alternativas para chegar à presidente. E optou pelo vice-presidente Michel Temer, com quem tem relação estreita – ele é o responsável pela filiação dela ao PMDB. Temer foi também o responsável por aproximar as duas que, nas palavras de um amigo do PSD, descobririam pouco depois que se completavam no estilo de trabalhar e pensar o país.
Do trabalho de aproximação até a primeira audiência, em 2012, o caminho foi natural. Hoje, Kátia é uma das poucas pessoas com canal direto com a presidente. Se há ministros – a maior parte deles, na verdade – que reclamam não ter qualquer intimidade com a principal mandatária do país, Kátia pode orgulhar-se de conversar com a presidente por SMS.
Beleza Segundo interlocutores em comum, Kátia adora dar dicas de beleza à presidente. Vaidosa, ela “se monta”, nas palavras de uma aliada, não para aparecer em fotos nos jornais ou para audiências políticas. Ela se produz toda porque é uma figura pop entre seu eleitorado. Durante a campanha, ela desembarcou em Tocantins para um evento e foi cercada por produtores rurais. “A senhora sabe qual o nome da última vaca que vai para o matadouro? Esperança. Senadora, a senhora é nossa esperança em Brasília”, afirmou o fazendeiro.
Ela olhou bem nos olhos do interlocutor, deu um tapa nas costas dele, e disse: “Não sei se agradeço, se xingo você ou se dou um mugido”, gargalhou. De outra feita, um produtor rural, querendo ser simpático, disse que tinha se encharcado de perfume e colocado a melhor camisa só para vê-la. Kátia não pensou duas vezes: puxou pelo braço a esposa do fazendeiro. “Vem cá, que vou falar com você e não com ele.
Se Kátia é pop, algo que Dilma jamais será, as duas combinam na obsessão pelo trabalho. “Ela é um trator e a maioria das pessoas diverge completamente do que ela pensa e fala. Mas, a exemplo da presidente, Kátia não tem medo de comprar brigas ou ser antipática ao defender seus pontos de vista”, afirmou uma pessoa que já viveu o desespero de ter que contrapor-se às argumentações da senadora peemedebista.
Ela também é, assim como a presidente, estudiosa. Nos encontros com Dilma, leva mapas e dados para mostrar os problemas do setor e apresentar alternativas e soluções. “Kátia sabe e gosta de fazer política, mas foge ao perfil tradicional da política. Ela não conversa com a presidente sobre cargos, mas sobre o Brasil real que precisa de infraestrutura”, disse uma pessoa próxima. Por isso, já houve conversas entre ambas, a sós, fora da agenda, por mais de uma hora. Uma coisa rara na escassa paciência de Dilma em trocar ideias com algum interlocutor..