Um depósito de exatos R$ 139.894.785,19 está colocando em lados opostos o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), advogados e credores de precatórios. Embora o Executivo tenha repassado ao Judiciário R$ 174 milhões para quitar parte de sua dívida por meio de acordos diretos – quando o credor aceita deduções do valor que tem a receber para que o dinheiro seja liberado de forma mais rápida –, oficialmente, até julho apenas R$ 34.105.214,81 haviam sido usados. Diante desse fato, a Comissão Especial de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Minas Gerais quer que a sobra seja usada para pagar débitos que aguardam o pagamento em uma fila cronológica que se prolonga há 11 anos. Já o TJMG alega que, por lei, não pode atender à solicitação.
Um ofício tratando do assunto foi encaminhado ao TJMG em 25 de setembro, mas a OAB não só não obteve resposta do órgão como ainda se deparou com a publicação no Diário do Judiciário, cinco dias depois, de um novo edital convocando credores para tentar fechar acordos. Ainda não foi divulgado o balanço sobre as operações, mas, nos bastidores, a informação é que novamente não houve interessados suficientes para zerar o saldo de mais de R$ 139 milhões. Enquanto isso, o dinheiro é destinado ao Fundo Judiciário e integra aplicações que rendem verbas para o TJMG.
O Estado de Minas teve acesso ao documento destinado à Central de Conciliação de Precatórios do TJMG, em que os advogados alegam que a Constituição Federal determina que os recursos depositados em contas especiais para fins de pagamento de precatórios não poderão retornar para estados, Distrito Federal e municípios devedores, devendo ser integralmente usados no exercício financeiro a que se referem. Portanto, toda a verba teria que ser destinada aos credores até o próximo dia 31.
“Não restam dúvidas de que, para que sejam cumpridas as determinações constitucionais, o valor remanescente do Edital de Acordos Diretos com o Estado de Minas Gerais, qual seja, R$ 139.894.785,19, deverá ser integralmente utilizado no presente exercício financeiro para pagamento de precatórios na ordem cronológica, uma vez que é inviável a utilização de tais recursos em outra modalidade de pagamento de precatórios”, diz trecho do ofício.
Os advogados e credores se valem ainda do artigo 97 da Constituição, onde está escrito que pelo menos 50% dos recursos destinados ao pagamento de precatórios devem ser utilizadom para os créditos em ordem cronológica de apresentação. “Fica claro, portanto, que se trata de percentual mínimo de aplicação dos recursos, podendo o Tribunal de Justiça, ao administrar tais valores, destinar percentual superior a este para pagamentos de precatórios na ordem cronológica”, afirma outro trecho do documento.
Modalidade O juiz da Central de Conciliação de Precatórios do TJ mineiro, Ramon Tácio de Oliveira, rebate a OAB. Segundo ele, ainda estão em andamento negociações com credores e não há como afirmar que não serão usados todos os recursos disponíveis no Judiciário. O magistrado alega ainda que a verba é carimbada, e portanto, não pode ser destinada para a quitação de precatórios pela ordem cronológica. De acordo com ele, o orçamento aprovado para o Executivo este ano prevê a destinação de R$ 310 milhões para as dívidas, sendo metade para cada modalidade de pagamento.
“Se não for assim, vai virar uma briga entre credores. Se eu usar o dinheiro da ordem cronológica para pagar os acordos, eles vão se sentir prejudicados. Da mesma forma, se usar o dinheiro dos acordos para pagar os outros precatórios, haverá reclamação”, diz Ramon Tácio. O magistrado pondera ainda que as verbas são repassadas mensalmente, e a última parcela – prevista em R$ 27 milhões – chegará aos cofres do Judiciário no dia 30. “Como eu vou gastar em um dia quase R$ 30 milhões para não ter sobra para 2015?”, questiona.
Os argumentos, no entanto, não convencem os credores. Advogados de alguns deles já admitem a possibilidade de recorrer ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do chamado “pedido de providência” para tentar forçar o TJ mineiro a pagar os precatórios com a sobra dos acordos. Já há parecer do Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), órgão vinculado ao CNJ, no sentido de que, não havendo acordos, os recursos devem ser destinados ao pagamento da lista cronológica de precatórios.