Jornal Estado de Minas

Uma fatia para cada partido

Afilhados de políticos aliados ao Planalto comandam empresas públicas e autarquias

Estrutura que se repete historicamente e dá margem a abusos como os que ocorrem na Petrobras

Paulo de Tarso Lyra

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Brasília – A declaração do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, em sessão da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito da Petrobras na quarta-feira, de que “em todas as estatais, e não apenas na Petrobras, existe loteamento de cargos públicos entre partidos políticos” não é mero exagero retórico. Os principais postos nas empresas públicas, autarquias e órgãos da administração pública federal estão divididos fraternalmente entre os aliados mais próximos do Palácio do Planalto, aponta levantamento feito pelo Estado de Minas. Indicados pelo PT e pelo PMDB – sócios na coalizão governista – têm a preferência.

Na principal holding do setor elétrico, a Eletrobras, a diretoria está dividida entre afilhados do senador José Sarney (PMDB-AP), que desistiu de concorrer a um novo mandato, mas não perderá influência na máquina estatal, um indicado pela presidente Dilma Rousseff e um apoiado pelo ex-ministro do Turismo e da Secretaria de Relações Institucionais do governo Lula, Walfrido dos Mares Guia. O empresário mineiro, que já foi aliado dos tucanos, migrou para a aliança petista em 2003 e, em 2006, 2010 e 2014, coordenou as campanhas vitoriosas de Lula e Dilma Rousseff em Minas Gerais. Ganhou o direito de indicar o presidente da estatal.

A Eletronorte está fora da alçada de influência de Sarney, mas não do PMDB. A presidência e a diretoria financeira são ocupadas por indicados pelo senador Jader Barbalho (PA) – coincidentemente, mais um que decidiu encerrar os mandatos políticos ao término desta legislatura. Nos demais cargos estão um afilhado da ex-governadora do Pará Ana Júlia Carepa, cuja administração estadual não deixou saudades entre os paraenses, e o diretor Adhemar Palocci, irmão do ex-ministro da Casa Civil de Dilma e titular da Fazenda de Lula Antonio Palocci.

Na outra ponta do mapa, a Eletrosul também foi esquadrinhada por petistas, peemedebistas e um indicado pela presidente Dilma Rousseff. A Itaipu binacional tornou-se alvo de cobiça nessa troca do primeiro para o segundo mandato de Dilma.
O nome mais cotado para se tornar presidente da usina é o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que depois de 10 anos na Esplanada dos Ministérios demonstra desejo de voltar à sua terra natal, o Paraná. Com menos chances aparece o ainda secretário do Tesouro, Arno Augustin.

- Foto: Xadrez ágil
A dança das cadeiras no xadrez das estatais é ágil e cruel. Antes todo-poderoso na Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), o PSB perdeu toda a diretoria para o PT ainda em 2013, quando o então governador de Pernambuco Eduardo Campos – morto em um acidente aéreo em agosto – resolveu abandonar o governo Dilma Rousseff, de quem era aliado, para se tornar candidato do PSB à Presidência da República.


Se o petista Paulo Bernardo está cotadíssimo para Itaipu, ele não pode reclamar, segundo fontes governistas, de desamparo em relação aos Correios, estatal ligada ao ministério ocupado por Paulo Bernardo e que foi acusada, durante a corrida presidencial deste ano, de distribuir de maneira irregular propaganda eleitoral da presidente Dilma e ignorar os “santinhos” feitos pelo PSDB de Aécio Neves, sobretudo em Minas Gerais.

Ele tem total ingerência na diretoria da empresa, que está na gênese, na época em que era ocupada por petebistas e peemedebistas, do escândalo do mensalão, que estourou em 2005 e levou para a cadeia a cúpula do PT que conduziu a primeira eleição de Lula à Presidência da República.


Subordinados ao Ministério dos Transportes, a estatal Valec – responsável pelas ferrovias brasileiras – e o Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit) têm suas estruturas divididas entre petistas e indicados pelo PR. Em 2011, quando a presidente Dilma Rousseff decidiu afastar dos Transportes o ministro Alfredo Nascimento, ela também promoveu uma faxina no Dnit e na Valec. Três anos depois, o loteamento voltou.

A Valec é presidida pelo PT e tem indicados ligados ao PR de Alfredo Nascimento e de Valdemar Costa Neto, condenado por envolvimento no escândalo do mensalão. A mesma estrutura se repete – só que de maneira inversa – no Dnit. O presidente da autarquia foi indicado pelo PR. Os representantes republicanos esperavam, após fechar apoio à reeleição de Dilma ainda no primeiro turno, que recebessem o órgão “de maneira fechada”. Mas as demais vagas estão nas mãos de petistas.

Rainha da Inglaterra

A figura de “rainha da Inglaterra”– expressão popular que significa que existe uma pessoa sentada na principal cadeira de uma estrutura hierárquica, mas com pouco poder de mando – que se vê no Dnit repete-se na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O presidente da autarquia é indicado pela bancada do PTB da Câmara, que se manteve fiel a Dilma mesmo depois de a cúpula da legenda declarar apoio formal à candidatura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) ao Planalto. Mas os demais postos de comando e operacionais estão nas mãos do PMDB e do PT.

Até o Pros, criado em 2013, tem seu quinhão de influência federal. E não é pequeno.

A legenda, que até a conclusão da reforma ministerial comanda o Ministério da Integração Nacional, detém o controle da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e da Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco). Sinal de prestígio dos irmãos Ciro e Cid Gomes. Este último é cotado para ser ministro da Educação no segundo mandato de Dilma, mas continua insistindo que prefere ser consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Washington.

Prática induz desvios
Brasília – O líder do PSDB na Câmara, Antônio Imbassahy (BA) – que testemunhou o desabafo de Paulo Roberto Costa na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) Mista da Petrobras –, afirmou que a prática de distribuir cargos públicos entre as legendas que apoiam os governos deveria ser extinta. “Não é correto o que acontece hoje. Um deputado ou senador fica mais interessado em indicar afilhados do que em exercer o papel de legislador para o qual foi eleito”, criticou Imbassahy.

Apesar de reconhecer que esse é um mal que acomete todos os governos de todos os partidos, Imbassahy afirma que a exacerbação do modelo atual é um retrato da “relação espúria do Executivo com sua base aliada”. O tucano não vê problemas no fato de partidos políticos darem sustentação a governos eleitos. “O que não se pode repetir são esses problemas vistos na administração federal ao longo dos últimos anos”, completou.

Relator da CPI do Mensalão em 2005, o deputado Osmar Serraglio (PR) afirma que o modelo do Petrolão da Petrobras é o mesmo que ele ajudou a desbaratar nos Correios – a conjunção de empresas públicas, contratos e licitação fraudadas e partidos políticos. “Se formos ver, o mensalão foi descoberto em 2005 e a compra da refinaria de Pasadena, no Texas, foi em 2006, exatamente um ano depois”, lembrou o peemedebista. Serraglio disse que esperava, sinceramente, que o governo petista tivesse aprendido após o escândalo do mensalão. “De fato, eles aprenderam.
Mas não usaram o aprendizado para corrigir rotas, mas sim para aperfeiçoar o esquema de corrupção”, completou. (PTL)

 

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