O levantamento da CNV foi feito durante dois anos e sete meses e revela que a maior parte dessas 72 “novas” vítimas são de mortos e desaparecidos que não integravam as organizações de esquerda e pertenciam a setores considerados marginalizados da sociedade como presidiários condenados por crimes comuns, camponeses, operários, índios e outras minorias étnicas, religiosas e de gênero.
É o caso do camponês Paschoal Souza Lima, morto em 30 de março de 1964, em Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. De acordo com o relatório da CNV, Paschoal foi morto por fazendeiros, quando estava na casa de um líder dos trabalhadores, metralhada por uma milícia. A família não apresentou o caso à CEMDP, que, por sua vez, não o incluiu em sua lista, apesar de Paschoal já ter se tornado até nome de rua em Belo Horizonte e avenida em Governador Valadares.
“Nos dias subsequentes, os conflitos se acirram e as milícias fazendeiras passam a realizar uma intensa ‘caça aos comunistas’. Nesse contexto, morreram também o farmacêutico Otávio Soares e seu filho, Augusto Soares.
João Carvalho de Barros, gaúcho de São Borja, era veterinário, pai de sete filhos e trabalhava na capital mineira em um matadouro, além de ser pastor em um templo protestante, em que fazia trabalhos sociais. No calor do golpe, em 2 de abril de 1964, a casa dele foi invadida por 30 homens e ele foi assassinado. Uma filha, de 17 anos, também foi baleada e ficou com sequelas irreversíveis. O relatório da CNV traz as diferentes versões para a morte de João publicadas nos jornais nos dias seguintes, mas destaca a fala de um dirigente do PTB à época, que aponta crime político.
Aides Dias de Carvalho, de Aimorés, no Vale do Rio Doce, uma das vítimas do Massacre de Ipatinga (leia ao lado), também não teve o nome apresentado no relatório da CEMDP, mas consta no documento da CNV. Mesmo a família de Aides não tendo apresentado requerimento para a inclusão dele na lista de mortos e desaparecidos, a CNV entendeu que a decisão que valeu para outros casos do massacre vale também para Aides.
GREVE Já no final da ditadura, em 1979, Guido Leão, metalúrgico da Fiat, em Betim, foi atropelado por uma viatura policial. O relatório afirma que ele fugia da cavalaria da Polícia Militar de Minas Gerais, que, armada de sabres, reprimia manifestação dos trabalhadores em greve em frente a fábrica e foi atropelado na BR-381. “Nos meses anteriores, os trabalhadores vinham sendo duramente reprimidos em suas manifestações pelos agentes policiais do Estado. À época da morte de Guido, pelo menos outros dois trabalhadores já haviam sido mortos em situação semelhante: Oracílio Martins e Benedito Gonçalves (citados em relatórios anteriores)”, afirma o relatório da CNV..