A cobrança surreal ocorre justamente quando o Ministério Público e a Polícia Federal apuram um dos maiores escândalos de desvio de dinheiro do país, em volumes ainda indefinidos, já que se estendem a pelo menos 12 anos. Entre os empreiteiros presos na sétima etapa da Operação Lava-Jato, está o vice-presidente da Mendes Júnior, Sérgio Cunha Mendes. Em depoimentos à Justiça, ele confessou ter pago propina ao doleiro Alberto Youssef, considerado o operador do esquema pelos investigadores, e ainda ao ex-diretor de Abastecimento e Refino da Petrobras Paulo Roberto Costa. Para isso, as obras contratadas com a estatal eram superfaturadas. De acordo com o processo, sete empreiteiras formaram um “clube VIP” para direcionamento de licitações públicas, com pagamento de propinas a partidos.
A Mendes Júnior Engenharia informou, por meio de nota, que apenas pleiteia a compensação porque construiu parte da usina com recursos próprios. “O direito ao ressarcimento deste desembolso foi reconhecido pela Justiça em 16/12/1992, em decisão transitada em julgado. A empresa desconhece os valores que vêm sendo publicados na imprensa”, informa a nota.
DESCONHECIDO Para se ter ideia do valor cobrado, o total é suficiente para fazer mais de 660 vezes todas as obras do Programas de Aceleração do Crescimento (PAC) Mobilidade nas 23 maiores cidades do país, no qual serão investidos R$ 30 bilhões pelo governo para a expansão e construção de metrôs, BRTs e veículos leves sobre trilhos (VLTs). Mas a maré não parece mesmo estar a favor da empreiteira. Apesar da interrupção do julgamento na quinta-feira, o relator do recurso, ministro Sérgio Kukina, apresentou o seu voto e defendeu que o recurso da empreiteira fosse desconhecido, confirmando a decisão do Tribunal Regional da 5ª Região (TRF-5), que julgou improcedente o pedido da Mendes Júnior, ao considerar que a empreiteira não demonstrou que os valores alegados foram aplicados na construção da usina.
“Não houve apresentação de documentos aptos a comprovar a específica destinação dos recursos captados no mercado financeiro para a construção da usina hidrelétrica de Itaparica. Diante de tais contornos, resulta que, para se desconstituir tal enredo, seria necessário, no ponto, o reexame de matéria fática, o que se revela incabível na estreita via do recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ”, afirmou o ministro Kukina. Uma afirmação que confirma a sentença do TRF-5 que destacou que a União demonstrou que os atrasos foram quitados ainda na década de 1980, inclusive com a aplicação de juros e multas previstos no contrato. Além do ministro Benedito Gonçalves, ainda faltam votar os ministros Napoleão Maia Filho e Regina Helena Costa, além da desembargadora convocada Marga Tessler.
EMPRÉSTIMO A cobrança teve início com a contratação da Mendes Júnior, em 1981, para a construção da hidrelétrica no Nordeste. A obra foi concluída em 1986 e, durante esse período, a Chesf pagou com atraso algumas faturas. Em razão disso, a empreiteira alegou que foi obrigada a buscar recursos no mercado financeiro para evitar que as obras fossem paralisadas. No entanto, a Advocacia Geral da União (AGU) demonstrou, em documento de mais de 80 páginas, que não tinham comprovação de empréstimos e débitos que atingissem o valor de R$ 1 trilhão. O desembargadores do TRF-5 acataram as alegações da CGU, em sentença em fevereiro, e ainda fizeram questão de destacar que o valor seria suficiente para construir outras 18 hidrelétricas do mesmo porte. No entanto, a Mendes Júnior recorreu ao STJ, que agora analisa a questão.
Saiba mais
Briga nos EUA
Essa não a primeira vez que a Construtora Mendes Júnior cobra indenização sob a alegação de ter sofrido prejuízos no cumprimento de contratos.