Brasília – Daqui a três semanas, a presidente Dilma Rousseff (PT) inaugura a próxima gestão sem ter conseguido se livrar de um dos maiores escândalos de corrupção da história do Brasil. A lama que ainda mina da Petrobras atravanca o tão propagado “governo novo, ideias novas”. A presidente, que pretendia aproveitar o início do mandato para tentar emplacar as reformas prometidas e colocar novamente o Brasil no trilho do crescimento, recebe das próprias mãos uma herança maldita. Leva para o novo mandato o derretimento contínuo da maior empresa brasileira, as implicações criminais de companheiros de partido e o desgaste político decorrente das denúncias sem fim de desvios bilionários.
Para piorar, o Supremo Tribunal Federal (STF) vai autorizar, no começo do ano, a abertura de inquéritos contra pelo menos 70 de políticos, grande maioria da base aliada, envolvidos no esquema criminoso entranhado na petroleira. Os nomes de ministros, senadores, ex-governadores e deputados foram delatados pelo doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, considerados os líderes da organização criminosa.
O professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Calmon prevê um início de governo complicado. Ele avalia que a presidente perde “a janela de oportunidade” que se abre no início de todas as gestões. “Normalmente, há um espaço para os reeleitos, uma janela de oportunidade no início do governo, para novas iniciativas num período de mais boa vontade e disposição. É uma janela que se abre para mudanças importantes, para se fazer ajustes.”
Calmon alerta que o esquema criminoso descoberto na estatal fecha essa oportunidade.
Governistas ouvidos em reserva pela reportagem afirmaram de maneira unânime que o início da nova gestão será apenas para “enxugar gelo”. Um senador petista declarou que não há como a presidente tocar as reformas com um escândalo dessa dimensão em seu quintal. Para ele, não existe clima político para isso. Há o temor de que a carga de denúncias contra o tesoureiro do PT, João Vaccari, possa aumentar e jogar o Planalto no centro do escândalo. Vaccari foi acusado pelos delatores de ser “o homem do PT” responsável pela arrecadação dos recursos desviados na petrolífera para irrigar os cofres do partido e, consequentemente, campanhas políticas. Ele esteve à frente da contabilidade da campanha vitoriosa da petista.
ASSINATURAS Para piorar o quadro, a oposição já se mobiliza para reeditar a CPMI da Petrobras, em fevereiro, logo após a posse dos deputados e senadores da nova legislatura. O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, anunciou, durante a semana, que as assinaturas já começaram a ser coletadas. “Com uma ação tão criminosa como essa, o Congresso não pode privar-se de estar ali, com os instrumentos e prerrogativas que tem, e avançar nessas investigações. Até porque, pelo que parece, isso vai envolver também parlamentares”, disse, sem citar nomes. A aposta dos oposicionistas é que a deflagração da nova fase da Operação Lava-Jato, com a prisão de executivos das principais empreiteiras do país, acusadas de pagar propina a partidos políticos, renderá uma onda de delações premiadas, aumentando a tensão no Congresso e enfraquecendo em seu início o segundo mandato do governo Dilma Rousseff. Para tentar contornar os problemas, a postura adotada será a de defender a punição “doa a quem doer”.
Informações de bastidor apontam que, no momento em que os nomes dos políticos forem revelados publicamente, a intenção palaciana é se mover para que a punição, pelo menos na instância partidária ou administrativa, seja ágil. Da parte do Planalto, a orientação é expulsar o parlamentar da legenda e apoiar a cassação, a exemplo do que foi feito com André Vargas, cassado em plenário semana passada, após denúncias de envolvimento com Youssef. O Planalto acredita que a maneira como o PT tratou o caso Vargas é um símbolo e um sinal de alerta para os demais envolvidos.
Para o cientista político Antônio Augusto Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o começo de governo já seria complicado de qualquer forma.
O desgaste em decorrência da desvalorização de mercado da Petrobras é gigantesco, inclusive arranha a imagem da presidente fora do Brasil. A empresa fechou, na sexta-feira passada, com valor de mercado, considerando o preço das ações na bolsa, de R$ 132 bilhões. Houve queda de 5,77% no preço das ações ordinárias e de 6,56% nas preferenciais. O valor de mercado, consequentemente a participação do governo, caiu 87% em relação ao pico de valorização, registrado em 8 de março de 2011. (Colaborou Paulo Silva Pinto).