Brasília – O ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró disse nessa quinta-feira, em depoimento de cerca de três horas à Polícia Federal, que “mantinha certa relação de amizade” com o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano. De acordo com delatores da Operação Lava-Jato, Baiano era o operador do PMDB no esquema de pagamento de propina por empreiteiras a políticos para obterem contratos com a Petrobras. Cerveró negou ter recebido qualquer vantagem para viabilizar negócios na petrolífera.
Réu em um dos processos da Lava-Jato, o ex-diretor foi preso na madrugada de quarta-feira, sob acusação de que tentava ocultar patrimônio obtido ilegalmente. Ele está na mesma cela de Baiano, em Curitiba. De acordo com o advogado Beno Brandão, que acompanhou o depoimento de Cerveró, ele não se negou a responder a nenhuma pergunta e pediu, espontaneamente, para explicar uma aquisição de sondas feita sem licitação pela Petrobras, que passava pela criação de subsidiárias no exterior destinadas a comprar e alugar navios-sondas para a própria Petrobras.
À frente da Diretoria Internacional até 2008, ele afirmou que todas as aquisições de equipamentos, construção de refinarias e de gasoduto passavam pela aprovação de toda a diretoria executiva, formada por seis diretores e pelo presidente da estatal, que à época era Sérgio Gabrielli, apadrinhado político do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sobre Baiano, Cerveró disse que o conheceu em 2000, quando ocupava o cargo de gerente executivo de Energia da petrolífera. Na época, segundo ele, o lobista representava empresas espanholas no ramo de energia térmica. Ele diz que só se lembra do nome de uma delas: Union Fenosa. Ainda de acordo com Cerveró, naquele período, foi fechado um contrato com essa empresa. Ele diz não se lembrar do valor, mas comentou que “não foi significativo”.
Cerveró disse ainda que Baiano continuou a frequentar a Petrobras, inclusive outras diretorias. Citou, como exemplos, a de Abastecimento e a de Gás e Energia. A primeira era comandada por Paulo Roberto Costa, um dos delatores da Lava-Jato, entre 2004 e 2012; a segunda, por Ildo Sauer entre 2003 e 2007, e pela hoje presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, entre 2007 e 2012.
Réus Baiano é apontado por delatores como o braço do PMDB no esquema de corrupção na petrolífera apurado pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Polícia Federal. De acordo com os investigadores, Cerveró era um dos contatos dele na Petrobras. Os dois são réus em ação que os acusa pelo crime de corrupção contra o sistema financeiro nacional e de lavagem de capital entre 2006 e 2012. Procurado pela reportagem, o PMDB não se manifestou sobre o assunto.
De acordo com o MPF, Baiano e Cerveró receberam US$ 40 milhões de propina entre 2006 e 2007 para intermediar a contratação de navios-sonda destinados à perfuração de águas profundas na África e no México. No depoimento à PF ontem, Cerveró negou ter recebido qualquer propina de Baiano e também que valores tivessem sido oferecidos.
Desde que a Justiça expediu mandado de prisão contra Baiano, peemedebistas, como o vice-presidente da República, Michel Temer, repetem declarações públicas de que o lobista “não tem qualquer ligação com o partido”. Já a indicação de Cerveró para o cargo de diretor na Petrobras não é assumida por qualquer partido. Embora tenha defendido publicamente a permanência dele no cargo em 2008, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) diz que Cerveró é nome do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Em março, Renan rebateu: “O Delcídio deve estar muito preocupado. Não se trata de saber se o Delcídio indicou o Cerveró ou não. O Delcídio tem que ficar despreocupado porque certamente não indicou o Cerveró para roubar a Petrobras”.
Ontem, o PSDB voltou a defender uma nova CPI para investigar a Petrobras no Congresso. O deputado Sílvio Torres (PSDB-SP) disse que “ainda há muita coisa a ser investigada, tanto na Petrobras quanto em outros órgãos do governo que já foram alvo de suspeitas”. O líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA), defendeu a demissão da atual diretoria da petrolífera. “Querem sugar a empresa até o caroço.”
Antecipação de herança aos filhos
Brasília – Acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de tentar blindar seu patrimônio, o ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró disse ontem que “pensou em movimentar” cerca de R$ 500 mil do seu plano de previdência privada para “gastos pessoais”, já que uma filha ainda depende financeiramente dele. O ex-dirigente alega que desistiu do resgate depois de saber do alto valor que pagaria em impostos. No depoimento, afirmou que as fontes de renda são uma aposentadoria de R$ 10 mil e um aluguel. Sobre os imóveis adquiridos quando era diretor da Petrobras, ele justificou que foi com o salário, que somava cerca de R$ 100 mil mensais até março, quando foi demitido.
Ao pedir a prisão preventiva de Cerveró, o MPF citou a tentativa de resgatar a previdência privada e a transferência de três imóveis para parentes. À Polícia Federal, Cerveró informou que as doações foram uma “antecipação da herança” aos filhos.
Sobre o aumento do patrimônio com a compra de imóveis entre 2002 e 2011, Cerveró alegou que recebeu apartamento de herança do pai e comprou dois com seu salário. O ex-dirigente afirmou que não tem rendimentos de aplicações financeiras.