Brasília – O aluguel de imóveis para agências reguladoras, conselhos e anexos de ministérios em Brasília custou caro ao contribuinte em 2014: foram cerca de R$ 321,38 milhões, segundo levantamento realizado pela reportagem e pela organização não governamental Contas Abertas, com base em dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi). Os contratos, muitas vezes feitos com dispensa de licitação, são geridos pelo próprio órgão, sem um controle centralizado. A Secretaria de Patrimônio da União (SPU) admitiu, em nota, não fazer ideia do quanto foi gasto com os aluguéis no ano passado.
Justiça, Educação e Transportes foram as pastas que mais gastaram com aluguéis em Brasília no ano passado. Mesmo dispondo do Bloco T e de dois anexos na Esplanada, o ministério chefiado por José Eduardo Cardozo (Justiça) e órgãos ligados à pasta gastaram mais de R$ 35,2 milhões em 2014 apenas com aluguéis. A Fundação Nacional do Índio (Funai), por exemplo, precisou de cerca de R$ 14,7 milhões para manter a sede no Setor Bancário Sul, enquanto o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) pagou R$ 9,9 milhões em um suntuoso prédio na 515 Norte.
Coube à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), subordinada ao Ministério dos Transportes, o maior aluguel de Brasília, com R$ 26,9 milhões gastos com a sede do órgão, no Setor de Clubes Sul. Ao todo, a pasta chefiada pelo PR despendeu R$ 34,7 milhões em aluguéis em Brasília. Já o Ministério da Educação usou outros R$ 32,2 milhões, parte deles para órgãos como a sede do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep): R$ 13,9 milhões.
Entre as empresas, a principal beneficiada com os pagamentos do Executivo foi a Inovar Construções e Empreendimentos, com R$ 54,4 milhões recebidos no ano passado. A companhia alugou imóveis para a Secretaria de Portos, R$ 1,7 milhão; para a sede do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), R$ 10,3 milhões; e para o anexo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, na 102/103 Norte, ao custo de R$ 7,4 milhões, entre outros. Em seguida, vem a Multi Construtora, com R$ 26,7 milhões, e as empresas do grupo Disbrave, com R$ 16,3 milhões.
‘DESPESAS ENGESSADAS’ Especialista em administração pública, o economista José Mathias-Pereira diz que os gastos com aluguéis são “muito difíceis” de ser diminuídos, mesmo num momento de arrocho fiscal, como o preparado pela nova equipe econômica. “No nosso jargão, os aluguéis fazem parte das chamadas ‘despesas engessadas’, aquelas que não podem ser reduzidas com facilidade. Aluguel é uma despesa de custeio, assim como a folha de pagamento. Em geral, o que o gestor dispõe para cortar são os gastos com investimento”, diz o professor do programa de pós-graduação em contabilidade da Universidade de Brasília (UnB).
Para Mathias-Pereira, a “expansão” da Esplanada é fruto do modelo político vigente no Brasil. “O que se observa é que, à medida que se ampliam o número de ministérios, secretarias, diretorias e cargos, há também uma necessidade maior de espaço físico para acomodar essas pessoas. Vale lembrar que nós atingimos recentemente a marca de 39 ministérios.”
SALAS ABANDONADAS Além do fenômeno da gastança descontrolada em dezenas de imóveis, 26 propriedades da União estão esvaziadas em Brasília, inclusive na Esplanada dos Ministérios. Desde a saída do Comando do Exército do Bloco O, em maio de 2013, seis andares do edifício estão completamente abandonados. Nos pavimentos há janelas quebradas, cofres abertos, mesas e cadeiras amontoadas. O interior do local em nada se parece com os outros 19 blocos que compõem o circuito do poder, desenhado por Lúcio Costa na década de 1950.
Com a energia desligada, é impossível subir os seis primeiros andares pelo elevador. Em um dos pisos abandonados, o hall de entrada está fechado com móveis empilhados.
NOVATO O mais novato dos ministérios, do da Micro e Pequena Empresa, ocupa dois andares em um edifício comercial no Setor de Rádio e TV Sul desde maio do ano passado. Segundo o corretor do prédio, Hamilton Neto, cada piso é locado por R$ 545.748,23, mensais. O aluguel teria custado cerca de R$ 8 milhões aos cofres públicos em 2014. A SMPE não informou o valor, alegando que é de responsabilidade da Presidência da República passar a informação.
Investimentos
Embora o espaço físico adequado seja indispensável para o bom funcionamento da administração, os R$ 321,38 milhões gastos com os aluguéis em 2014 superam o investimento de várias atividades importantes do governo. A quantia é superior, por exemplo, aos R$ 178 milhões orçados em 2014 para ações da União de prevenção à Aids nos estados; representa quase quatro vezes mais do que os R$ 86,3 milhões aplicados em 2014 no programa de política espacial do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI); e fica pouco abaixo dos R$ 395 milhões aplicados no Programa de Política Nuclear..