A Petrobras terá que se desdobrar para manter investimentos previstos para 2015 sem desrespeitar regras da Agência Nacional de Petróleo (ANP) ou provocar prejuízos para fornecedores nacionais.
Em fevereiro, a Petrobras fará a primeira grande licitação depois do início das investigações da Polícia Federal que levou à prisão ex-diretores da estatal e executivos de empreiteiras acusados de corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Será licitada a compra de módulos de compressão para seis unidades flutuantes de produção, armazenamento e transferência (FPSO, na sigla em inglês). Conhecidas como navios-plataformas, as FPSOs estavam sendo produzidas, até o fim do ano passado, pela Iesa Óleo e Gás, empresa que também está na lista das investigadas e proibidas de fechar contratos com a Petrobras. O acordo com a Iesa foi firmado em 2012 e previa um investimento de R$ 1,3 bilhão, mas foi cancelado em dezembro de 2014.
A Petrobras não informou a que empresas enviou convites para o certame de fevereiro nem se há brasileiras na lista, mas, nos bastidores do setor, as informações são de que apenas grupos estrangeiros foram chamados para a licitação. Entre eles estariam companhias da China e de Singapura, como a Keppel Fels, que já tem um estaleiro em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, e de outros países, como a Cobra, da Espanha, e a Modec, do Japão. O motivo de preocupação na indústria brasileira é que não só as empresas estrangeiras ficarão responsáveis pela construção dos navios-plataforma como também privilegiariam fornecedores de fora.
Por meio de nota, a Petrobras confirma a reabertura do processo licitatório na área do bloco BMS-11 da Bacia de Santos para a compra de módulos de compressão para os FPSOs e ressalta a necessidade de acelerar o processo. “Considerando a criticidade de prontificação dos módulos de compressão para os projetos dos FPSOs, é requerido que as propostas sejam apresentadas ainda em fevereiro próximo”, diz a nota. O texto diz ainda que a estatal e seus parceiros “estão buscando a liberação judicial dos bens de sua propriedade, ora no canteiro da Iesa em Charqueadas”.
Críticas
O convite a empresas estrangeiras rendeu duras críticas de representantes da indústria nacional ouvidos pelo Petronotícias – site jornalístico especializado no setor –, que alegam que a decisão pode representar perdas de postos de trabalho no país. A estatal poderá também bater de frente com a política implantada no governo Lula de priorizar o conteúdo local. O Contrato de Concessões para Exploração, Desenvolvimento e Produção de Petróleo e Gás Natural 4861, firmado Agência Nacional de Petróleo (ANP) naquele ano, determina que as empresas devem garantir que fornecedores brasileiros “não sejam excluídos” do processos de produção e tenham “condições amplas e equânimes de concorrência”.
Segundo a norma contratual da ANP, os bens e serviços que apresentarem conteúdos locais inferiores a 10% serão considerados “integralmente importados”. Porém, a agência informa que o percentual mínimo exigido para o uso de materiais nacionais depende do tipo de contrato firmado entre a Petrobras e as empresas, podendo ser bem superior aos 10%. Segundo relatórios da ANP, nos quatro contratos analisados em 2015, as empresas não atingiram o percentual mínimo exigido do uso conteúdo local e foram aplicadas multas.
Para a produção dos navios-plataforma que vão operar no “polígono do pré-sal” – área que abrange as bacias de Campos e Santos –, o cronograma inicial previa a entrada em operação entre 2016 e 2018, sendo dois (P-66 e P67) no primeiro ano e três (P-68, P-69 e P-70) no segundo ano. A última plataforma começaria a funcionar em 2018. Com o cancelamento do contrato com a Iesa Óleo e Gás, os cronogramas serão alterados e a produção do pré-sal deve passar por atrasos.
As plataformas FPSO são navios especialmente projetados para estocar e transferir óleo e gás em águas profundas, onde estão localizadas as reservas do pré-sal. Elas fazem parte de uma frota projetada pela Petrobras que segue parâmetros de simplificação de projetos e padronização de equipamentos. Ao atingirem a capacidade máxima de operação, estima-se que as plataformas produzam cerca de 900 mil barris de óleo diariamente. As FPSOs são grandes apostas da Petrobras para as extrações na bacia do pré-sal.
Impacto imediato
Grandes empresas nacionais de engenharia estão fechando as portas por causa de dificuldades financeiras e atrasos no pagamento de contratos firmados com a Petrobras. As companhias Tomé Engenharia e Alumini, antiga Alusa, entraram com pedido de recuperação judicial e podem encerrar suas atividades nos próximos meses, alegando dificuldades na relação com a estatal. A Petrobras rebate os argumentos das empresas e diz que os contratos com elas não foram aprovados pela diretoria de engenharia.
ENTENDA O CASO
Em 2012, a Petrobras e a Iesa Óleo e Gás firmaram um contrato de R$ 1,3 bilhão para a fabricação de módulos para seis unidades de navios-plataforma de produção, armazenamento e transferência de petróleo (P-66 a P-71). Os navios serão usados para a extração na bacia do pré-sal. A produção começou no estaleiro de Charqueados, no Rio Grande do Sul.
A Iesa é uma das investigadas na Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, com indícios de irregularidades em negociações com funcionários da Petrobras. Em novembro, o diretor da empresa, Otto Garrido Sparenberg, foi preso sob a acusação de participar em esquema de lavagem de dinheiro. A PF também cumpriu mandados de busca e apreensão na casa do presidente da Iesa, Valdir Carrero.
A Petrobras rescindiu o contrato com a Iesa. Com isso, a empresa, que já enfrentava dificuldades financeiras, comunicou a demissão de 1 mil funcionários que trabalhavam no estaleiro de Charqueados. A Iesa apresentou plano de recuperação judicial e prometeu estabelecer a uma forma de pagamentos de seus credores.
Em 29 de dezembro, a diretoria da Petrobras decidiu proibir novos contratos com 23 empresas envolvidas na Lava-Jato. Na lista estão as maiores construtoras do país.. A proibição não tem prazo de validade.
No começo deste ano, a Petrobras reabriu o processo de licitação para a construção das plataformas que precisam ser usadas nos navios P-66 a P-71. A estatal não confirma a lista de empresas convidadas a participar do processo, mas, nos bastidores, as informações apontam que foram feitos convites apenas para grupos estrangeiros, principalmente empreiteiras da China e de Singapura. O resultado está programado para o início de fevereiro.
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