Flávia Ayer
No início oficial da cruzada da prefeitura para convencer vereadores a aprovar mudanças que alteram, de forma radical, as regras para construir e ocupar a capital, o prefeito Marcio Lacerda pôs sua equipe técnica à disposição da Câmara Municipal para esclarecer todas as dúvidas sobre as alterações na Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo e no Plano Diretor. A oposição, no entanto, já mostra receio quanto ao aumento do preço dos imóveis e considera as mudanças “drásticas”. De carona nas modificações no ordenamento da cidade, Lacerda aproveitou para anunciar atuação mais incisiva da Guarda Municipal contra novas invasões urbanas. A intenção é que a corporação, que ganhou poder de polícia no ano passado, libere os terrenos invadidos nas primeiras horas de ocupação.
A reunião contou com a presença de 25 vereadores, que, ainda meio perdidos, tomaram conhecimento das principais mudanças pretendidas pela prefeitura. São mais de 600 alterações, mas a principal autoriza donos de lotes a construir edificação com apenas área equivalente à metragem do terreno. Se o lote tem mil metros quadrados, o autorizado é de mil metros quadrados. Para aumentar esse limite, seria preciso pagar adicional à prefeitura, que investiria o dinheiro arrecadado em infraestrutura na região.
“Reforçamos com vereadores a importância do Plano Diretor para as próximas gerações. As mudanças vão ao nível de todos os bairros para promover ocupação ordenada. É uma forma de corrigir os erros do passado”, afirma o prefeito, citando como exemplo negativo a ocupação do Bairro Buritis, na Região Oeste da capital.
Segundo Lacerda, o projeto de lei com as mudanças, se aprovado, vai gerar recursos para a habitação de baixa renda. Outra ideia é incentivar a formação de novos centros da cidade, com moradias mais próximas ao comércio. Uma das mudanças também restringe estacionamento em prédios a 2,5 metros quadrados por apartamento, igual a uma vaga livre. O objetivo é desestimular o uso do carro.
Com tantos detalhes, a equipe técnica da Secretaria Municipal Adjunta de Planejamento Urbano ficará à disposição dos parlamentares. “Haverá atendimento para tirar as dúvidas”, reforça o secretário da pasta, Leonardo Castro. Ao serem apresentados à proposta, mesmo vereadores da base de governo reforçaram que o assunto é “muito técnico”. O texto deve chegar à Câmara em duas a três semanas.
As alterações estão em gestação na prefeitura desde 2011 e, no ano passado, foram discutidas durante a Conferência Municipal de Política Urbana, de fevereiro a agosto. No evento, delegados dos setores técnico, popular e empresarial definiram as mudanças na legislação a partir de um estudo prévio elaborado por técnicos da prefeitura. A conferência foi alvo de críticas e teve até intervenção da Justiça. Insatisfeitos, delegados do setor da construção civil abandonaram as discussões. Na Câmara, os embates tendem a continuar.
Embora o líder de governo, Preto (DEM), estime que a tramitação do texto na Câmara demore quatro meses, a oposição já sinaliza que a discussão da matéria deverá se estender por mais tempo. “Houve uma crise na conferência de política urbana e agora na Câmara temos que escutar esse público”, afirma o vereador Adriano Ventura (PT). O parlamentar reforça ser necessário estudar melhor o impacto das mudanças. “Vai ficar mais caro construir e a tendência é de supervalorização dos imóveis”, afirma. O colega de bancada, Pedro Patrus (PT), disse já ter sido procurado por movimentos sociais, arquitetos e urbanistas para discutir as alterações. “É uma mudança drástica. Não estou falando que é positiva ou negativa, mas muda muita coisa. Não podemos ter pressa”, reforça.
GUARDA MUNICIPAL Durante o encontro, Lacerda reforçou as estratégias para que a cidade “fique livre de invasões organizadas”. Uma delas é uma atuação mais direta da Guarda Municipal contra novas ocupações. A corporação será incumbida de evitar que moradores se estabeleçam nos terrenos ainda nas primeiras horas das invasões. “A legislação ampliou a área de atuação das guardas municipais. Em se tratando de área municipal, isso (intervenção) será feito”, afirmou Lacerda.
No ano passado, a presidente Dilma Rousseff sancionou o Estatuto Geral das Guardas Municipais, que autorizou porte de arma e deu poder de polícia à corporação. De acordo com o integrante das Brigadas Populares Rafael Bittencourt, não há surpresa em relação à atitude de Lacerda. “A postura da prefeitura sempre foi de criminalizar uma luta justa e legítima que é o direito à moradia”, afirma Bittencourt, sem confiança no impacto positivo das mudanças da Lei de Uso e Ocupação do Solo na política habitacional. Uma das propostas que irão para a Câmara estimula edificações com moradias para famílias de baixa renda no Hipercentro.